quinta-feira, 7 de abril de 2022

Lalo de Almeida

Fotógrafo Lalo de Almeida, da Folha, vence prêmio mundial do World Press Photo

Trabalho documenta ocupação da Amazônia e seu impacto na floresta e nos habitantes da região 

Jasson Oliveira do Nascimento, morador da Reserva Extrativista Arapixi, no Amazonas, corta a vegetação para abrir caminho para a canoa em igarapé que leva ao Projeto de Assentamento Extrativista Antimary, onde se coletam castanhas; foto está entre as premiadas pelo Word Press Photo Lalo de Almeida/Folhapress 

Fábio Pescarini, FSP, 07/04/2022

O fotojornalista da Folha Lalo de Almeida, 52, estava no mês passado em uma aldeia indígena próxima a Altamira (PA) quando pediu que ligassem um gerador para que o sinal de internet funcionasse. Ali soube que havia vencido a categoria regional de longa duração do World Press Photo, a mais prestigiosa premiação de fotojornalismo do mundo, por seu trabalho na Amazônia.

Aquele, a seu ver, foi um dos principais passos de sua carreira. O seguinte veio nesta quinta-feira (7) com o anúncio de que conquistou o "Oscar" da fotografia. O projeto Distopia Amazônica, que documenta a ocupação amazônica e o seu impacto na floresta e nos habitantes da região, foi o ganhador da categoria longa duração na fase mundial. Ao receber a notícia por telefone, Lalo conta ter chorado. "É um prêmio que reconhece um período muito longo de trabalho. É como se reconhecesse a própria carreira, o que eu fiz nos últimos dez anos."

O trabalho, iniciado em 2012 e concluído no ano passado, consiste numa sequência de 30 fotografias. Vinte e cinco delas foram feitas exclusivamente para a Folha e boa parte delas foi publicada na série Amazônia sob Bolsonaro.

As reportagens da série começaram a ser publicadas em 2020 e contam os desafios para manter a floresta em pé, abordando temas como desmatamento, garimpo ilegal e comunidades quilombolas. A maior parte do trabalho foi feita em parceria com os jornalistas Fabiano Maisonnave e Marcelo Leite e contou com o financiamento de Rainforest Foundation Norway e Climate Home News.

Na avaliação de Lalo, o prêmio ajudará a levar os problemas da Amazônia ao conhecimento de um público global. Ele considera que a Amazônia vive, na gestão de Jair Bolsonaro (PL), o ápice do seu processo de destruição. Porém, afirma que não dá para responsabilizar apenas o atual governo.

Lalo lembra que o projeto de construção da usina de Belo Monte, que deu origem ao trabalho premiado, foi planejado no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e executado no de sua sucessora, Dilma Rousseff (PT). "O governo atual pisou no acelerador [da degradação]."

Meninas Piranhã observam motoristas que passam pela rodovia Transamazônica na esperança de receber doações de lanches e refrigerantes ao lado de seu acampamento às margens do rio Maici. Lalo de Almeida 21 set. 2016/Folhapress

Gado atravessa áreas recem-queimadas dentro da Floresta Nacional de Altamira, na região da rodovia BR - 163, em Novo Progresso, município com uma das maiores taxas de desmatamento do Brasil. Lalo de Almeida 25 set. 2014/Folhapress

Homens trabalham em mineração de ouro em Peixoto de Azevedo, norte de Mato Grosso, que é uma das maiores áreas produtoras de ouro do Brasil; parte das atividades extrativistas é ilegal e mesmo as legalizadas não cumprem a legislação ambiental por não haver fiscalização por parte das autoridades brasileiras. Lalo de Almeida 12 set. 2019/Folhapress

Vista aérea da construção da principal usina de força de Belo Monte no rio Xingu. Lalo de Almeida 3 set. 2013/Folhapress

Índios Mundurukus na fila para embarcar num avião no aeroporto de Altamira após protestar contra a construção da barragem de Belo Monte no rio Xingu; mesmo após contrapressão de indígenas, ambientalistas e organizações não governamentais, o projeto Belo Monte foi construído e concluído em 2019. Lalo de Almeida, 4 jun. 2013/Folhapress

Área desmatada em município localizado às margens da rodovia Transamazônica no sul do estado da Amazonas; a região está da linha de frente da expanção agrícola na amazônia, ocupando a sétima posição de municípios mais desmatados em 2019. Lalo de Almeida 24 ago. 2020/Folhapress

O profissional diz que o trabalho premiado mostra que a Amazônia padece de um problema estrutural, do tamanho de suas dimensões —não apenas conjuntural. "A função principal é mostrar a complexidade da situação amazônica. Não dá para falar da questão ambiental sem falar da social. A floresta não é um deserto verde."​ Segundo Lalo, o projeto Distopia Amazônica não tem data para acabar. "Vou continuar fotografando a Amazônia enquanto eu tiver energia."

E, se precisou caçar sinal de internet para saber o resultado da premiação regional da Word Press Photo, nesta quinta (7/4/22) ele vai torcer para que uma de suas duas filhas esteja comunicável lá na Amazônia. Pesquisadora do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV, Nina Almeida, 25, trabalha em um projeto que avalia os impactos no asfaltamento da BR 319, rodovia Manaus-Porto Velho. "Ela está lá no mundão, me dá até agonia."

A cerimônia de premiação do World Press Photo está marcada para ocorrer entre os dias 11 e 14 de maio, em Amsterdã, na Holanda. Na sequência, os trabalhos vencedores nas quatro categorias —longa duração, grande foto, história e formato aberto— deverão ser expostos em vários países.

Lalo tem colecionado premiações. No ano passado, ele venceu a categoria meio ambiente do World Press Photo com um trabalho sobre o Pantanal. A série, que ao longo de meses de 2020 retratou a destruição provocada pelo fogo, foi feita em parceria com Maisonnave. Nela destacou-se o retrato de um bugio ajoelhado e carbonizado no meio de uma mata devastada.

Pelo mesmo trabalho, ele foi reconhecido, em janeiro do ano passado, como o fotógrafo ibero-americano do ano pelo concurso Poy Latam (Pictures of the Year International), uma das mais importantes premiações de fotografia documental da América Latina.

Ainda no ano passado, Lalo ganhou a bolsa W. Eugene Smith Memorial por seu trabalho na Amazônia. A honraria e o valor de US$ 10 mil (cerca de R$ 47,2 mil) são concedidos anualmente a profissionais cuja produção siga a tradição fotojornalística do americano W. Eugene Smith (1918-1978) em seus 45 anos de carreira.

Ele foi o segundo brasileiro a receber o prêmio. O primeiro foi Sebastião Salgado, em 1982.


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