segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Elza


Olho pro meu corpo / Sinto a lava escorrer / Vejo o próprio fogo / Não a força para deter

Me derreto tonta / Toda pele vai arder / O meu peito em chamas / Solta a fera pra correr

Unhas cravadas / Em transe latejo / Roupas jogadas no chão / Pernas abertas / Te prendo num beijo / Sufoco a sofreguidão

Meu temporal me transforma em loba / Presa, você vai gemer / Feito um cordeiro entregue pra morte / Seu sussurrar a pedir

Pra fuder! Pra fuder! Pra fuder!


Esta é a letra da música Pra fuder de Kiko Dinucci, do último CD de Elza Soares "A mulher do fim do mundo", Natura Musical, 2015.

Elza não sossega.

Caminha para além do samba e bossa nova. Namora o modernismo paulistano e, não à toa, o disco inicia, a capela, com Coração do mar poema de Oswald de Andrade musicado por José Miguel Wisnik. E tome samba, afro-beat, rock, rap, punk-samba, eletrônico, distorções e dissonâncias. Tem sexo, morte, drogas, negritude e violência doméstica dentre outros temas.

Elza bota pra fuder.
 



A ficha do disco:
01. Coração do Mar (Poema de Oswald de Andrade musicado por José Miguel Wisnik)
02. Mulher do Fim do Mundo (Romulo Fróes / Alice Coutinho)
03. Maria da Vila Matilde (Douglas Germano)
04. Luz Vermelha (Kiko Dinucci / Clima)
05. Pra Fuder (Kiko Dinucci)
06. Benedita (Celso Sim / Pepê Mata Machado / Joana Barossi / Fernanda Diamant) Part. Celso Sim
07. Firmeza?! (Rodrigo Campos) Part. Rodrigo Campos
08. Dança (Cacá Machado / Romulo Fróes) Part. Romulo Fróes
09. O Canal (Rodrigo Campos)
10. Solto (Marcel Cabral / Clima)
11. Comigo (Romulo Fróes / Alberto Tassinari)
Ficha Técnica:
Produção Musical: Guilherme Kastrup
Fotos: Alexandre Eça
Um Projeto Natura Musical


Elza é de 1937 para algumas fontes. Para outras, 1930. Casou, obrigada pelo pai, aos 12 anos e ficou viúva aos 21. Com quatro filhos e uma filha.

Nos seus 78 (ou 85) anos Elza comeu o pão que o diabo amassou.

Em 2007 assisti a um show de Elza num galpão portuário em Vitória (ES). Galpão lotado e agitação total durante 2 horas de espetáculo. Quase o fim do mundo!
A Mulher do Fim do Mundo é uma corda esticada sobre um precipício por onde caminha tensa e decidida. Aos declarados 78 anos de idade, com a dor das costas operadas limitando seus passos e o desespero da recente perda de um filho ainda tomando o peito, Elza, mais do que cantar, precisa do grito. (1)

Eu sou, eu vou / até o fim / cantar.


(1) http://cultura.estadao.com.br/noticias/musica,elza-soares-lanca-seu-primeiro-album-de-ineditas-desafiada-por-um-novo-conceito,1772047 em 07/12/2015


 

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Super-ricos

Um episódio relatado por John Kenneth Galbraith. No início dos anos 60, Ted Kennedy, o caçula da família, enfrentava a sua primeira disputa eleitoral. Ted acordou cedo para fazer campanha na porta de uma fábrica. Um trabalhador mais velho se aproximou dele e disse: "Teddy, meu menino, eu ouvi dizer que você nunca trabalhou nem um dia sequer na vida". Era realmente o ponto mais vulnerável do candidato e ele se preparou para responder com cuidado. Mas o velho não esperou: "Deixe eu lhe dizer, rapaz. Você não perdeu absolutamente nada".

 Deu em Carta Capital, 01/09/2015
Conheça os super-ricos - e saiba como você financia a fortuna deles

Os impostos da classe média e dos pobres vão para o bolso dos ricos e 65,8% da renda total dos super-ricos são considerados isentos pela legislação.
André Forastieri - R7 (via Jornal GGN)
 
Os ricos do Brasil são muito mais ricos do que você imagina. São super-ricos. E ficam mais e mais ricos a cada dia que passa. Existem duas razões principais para isso. Os impostos da classe média e dos pobres vão para o bolso dos ricos. E os ricos pagam menos imposto que a classe média e os pobres.

Só agora a gente está entendendo quem são os super-ricos do Brasil. A análise tradicional, feita com as pesquisas do IBGE, não dão conta da realidade. Um novo estudo realizado pelos economistas Rodrigo Orair e Sérgio Gobetti, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), chega mais perto. Eles analisaram os dados das declarações de imposto de renda das pessoas físicas. As conclusões são chocantes.

Segundo o IBGE, a renda média do 1% mais rico do país foi de R$ 214 mil em 2012. Mas segundo o estudo do IPEA, a renda anual do 1% mais rico é aproximadamente R$ 575 mil. Explicação: o IBGE não capta toda a renda das pessoas mais ricas, que tem muitas rendas provenientes do capital (como aplicações financeiras, aluguéis, lucros e dividendos).

R$ 575 mil já é uma boa grana: mais de R$ 40 mil por mês. Mas esses 1% ainda não são a elite. Os super-ricos do Brasil ganham acima de 160 salários mínimos por mês. São 0,05% da população economicamente ativa.

Os super-ricos brasileiros possuem um patrimônio de R$ 1,2 trilhão. Isso é 22,7% de toda a riqueza declarada por todos os contribuintes do Brasil. Essas 71.440 pessoas têm renda anual média de R$ 4.17 milhões, uns R$ 350 mil por mês. Tiveram em 2013, ano analisado pela pesquisa, um rendimento conjunto de R$ 298 bilhões.

E em 2015? Não sabemos, mas é seguro dizer que estão bem mais ricos que em 2014. Quem tem muito capital investe e recebe rendimentos financeiros enormes. Os juros no Brasil são sempre muito altos, mas agora estão estratosféricos. Trabalhar não tem nada a ver com a fortuna crescente dessa turma. Neste nível de renda, trabalha quem quer, não porque precisa.

Qual o negócio mais lucrativo e seguro do Brasil? Emprestar dinheiro para o governo. Se você tem muita grana, não precisa de criatividade para enriquecer mais e mais. Basta comprar títulos públicos do governo, que paga juros altíssimos para financiar sua dívida. E de onde vem esse dinheiro para pagar os juros? Do Tesouro Nacional, dos impostos que todos os brasileiros pagam.

Mas alguns pagam mais que outros. O detalhe mais cruel sobre a desigualdade brasileira está aí. Os super-ricos brasileiros, esses que ganham mais de 160 salários mínimos por mês, pagam só 6,51% de sua renda de imposto de renda. Você leu certo. Um assalariado que ganhe R$ 5 mil por mês paga 27,5% de imposto de renda. A elite paga 6,51%, como demonstra o estudo do IPEA.

Como isso é possível? É que 65,8% da renda total desses super-ricos são rendimentos considerados isentos e não-tributáveis pela legislação brasileira. É o caso dos dividendos e lucros. Na prática, o imposto de renda aqui só é progressivo do pobre até a classe média, que é justamente a fatia da população que mais paga imposto de renda. É uma receita perfeita para aumentar cada vez mais a desigualdade social no Brasil. É garantia de injustiça, ignorância, violência. E até de atraso em outros campos. Se fala muito que o Brasil tem pouca inovação tecnológica, mas quem vai arriscar capital investindo em inovação, se você pode faturar com juros altos e não pagar quase nada de imposto?

Essa bizarria cruel é criação brasileira. Todos os países decentes, sejam ricos ou emergentes, tributam todos os rendimentos das pessoas físicas. Não interessa se a renda do salário, de aluguel ou de dividendos. É o justo. É o mais eficiente para o bom funcionamento dos países.

O estudo do IPEA não captura com precisão absoluta a pirâmidade social brasileira. Não dá conta de dinheiro escamoteado, de caixa 2 ou remessas enviadas ao exterior. Mas já dá uma noção do tamanho do escândalo. Agora, como é focado no Imposto de Renda, não leva em consideração outra grande injustiça do nosso sistema tributário, que são os impostos indiretos.

Os super-ricos pagam o mesmo imposto sobre produtos que você, eu ou a vovó que recebe Bolsa Família. Pagam o mesmo imposto pelo arroz, o café, o remédio, o fogão. Isso significa que proporcionalmente o pobre paga muito mais imposto a classe média. E infinitamente mais que a elite.

Os super-ricos não são os vilões dessa história. As regras estão aí para beneficiá-los. Não é ilegal. Certamente há na elite gente que topa abrir mão de suas vantagens, em benefício de quem mais precisa... Mas, como era de se esperar, existem super-ricos que atuam diretamente para que esse estado de coisas continue exatamente assim: juros altíssimos e taxação mínima. Basta isso para os donos do capital ficarem mais e mais ricos a cada ano que passa, sem trabalho, sem esforço, sem contribuir para o país.

Os super-ricos têm muito poder. Influenciam muito no debate político e econômico. Abundam na imprensa argumentos a favor de que as coisas se mantenham como são. E são super-ricos os financiadores das campanhas da maioria dos políticos, claro.

A recessão radicaliza a injustiça. Penaliza o trabalhador e o empreendedor, o importador e o exportador, o estudante e o aposentado. Esta recessão não veio do espaço sideral. Foram tomadas decisões erradas no passado? Claro, muitas, desde 1500. Mas não dá para mudar o passado. O futuro felizmente está ao nosso alcance.

Esse ano e os próximos serão muito difíceis. O cenário internacional é hostil. O cobertor está curto. É imoral e improdutivo continuar enriquecendo 0,5% com o dinheiro dos impostos dos 99,5%. Enfrentar os privilégios dos super-ricos é a pauta política e econômica fundamental de 2015 e dos próximos anos. O resto é resto.

http://cartamaior.com.br/?%2FEditoria%2FEconomia%2FConheca-os-super-ricos-e-saiba-como-voce-financia-a-fortuna-deles-%2F7%2F34390

 

sábado, 8 de agosto de 2015

Deixe os mortos enterrarem seus mortos

Juca Kfouri, 07/08/2015

POR VLADIMIR SAFATLE, hoje na “FOLHA”
A Nova República acabou. Qualquer análise honesta da situação brasileira atual deveria partir dessa constatação. O modelo de redemocratização brasileiro, que perdurou 30 anos, baseava-se em um certo equilíbrio produzido pelo imobilismo.
Desde o momento em que FHC se sentou com ACM e o PFL para estabelecer a “governabilidade”, a sorte da Nova República estava selada. Frentes heteróclitas de partidos deveriam ser montadas acomodando antigos trânsfugas da ditadura e políticos vindos da oposição em um grande pacto movido por barganhas fisiológicas, loteamento de cargos e violência social brutal.
O resultado foi um sistema de freios que transformou os dois maiores grupos oposicionistas à ditadura (o PT e o núcleo mais consistente do PMDB, a saber, o que deu no PSDB) em gestores da inércia. Com uma “governabilidade” como essa, as promessas de mudanças só poderiam gerar resultados bem menores do que as expectativas produzidas.
Mas a Nova República tinha também um certo princípio de contenção por visibilidade. No auge da era FHC, José Arthur Giannotti cunhou a expressão “zona cinzenta de amoralidade” para falar do que ele entendia ser um espaço necessário de indeterminação das regras no interior da dita democracia com sua “gestão de recursos escassos”.
Essa zona de amoralidade, mesmo tacitamente aceita, deveria saber respeitar uma certa “linha de tolerância”, pressuposta na opinião pública. Havia coisas que não poderiam aparecer, sob pena de insuflar a indignação nacional.
Giannotti acreditava falar da essência da democracia, mas estava, na verdade, a fornecer involuntariamente o modo de funcionamento das misérias da Nova República: um acordo fundado sobre uma zona cinzenta de amoralidade resultante de disfunções estruturais e democratização limitada.
Mesmo isso, no entanto, é coisa do passado. O primeiro sintoma do fim da Nova República é a pura e simples gangsterização da política e a brutalização das relações sociais. Não há mais “linha de tolerância” a respeitar, pois não é mais necessário um “pacto pelo imobilismo”.
Pacto pressupõe negociação entre atores que têm força e querem coisas distintas. Mas todos os principais atores políticos da Nova República já estão neutralizados em seu risco de mudança. Os que não querem a mesma coisa não têm mais como transformar seu desejo em ação.
Assim, como não há mais linha de tolerância a respeitar, o outrora impensável pode ser mostrado, desde que sirva para desestabilizar o governo de plantão.
Por exemplo, foi como um sindicato de gângsteres que o Congresso Nacional e seu presidente agiram na semana passada ao convocar, para uma CPI de fantasia, a advogada de defesa de denunciantes da Operação Lava Jato, a fim de intimidá-la.
De toda forma, só uma política gangsterizada pode aceitar que o presidente da Câmara seja um indiciado a usar seu cargo para, pura e simplesmente, intimidar a Justiça, como se estivesse na Chicago dos anos 1930.
Dilma acreditava ainda estar na Nova República ao rifar seu governo para economistas liberais. Seu cálculo era: “Se eu garantir que não haverá nenhuma mudança drástica de rota, serei preservada no governo”. Esse raciocínio, no entanto, não serve mais.
Como é, atualmente, indiferente saber quem está no governo, pois todos sabem que nenhuma mudança drástica de rota virá, a rifa de Dilma não garantirá sua sobrevida.
Em um contexto de crise dessa natureza (e, antes de ser econômica, a crise brasileira é política, é a marca do fim de uma era política) a única solução realmente possível é caminhar ao que poderíamos chamar de “grau zero da representação”.
Não há, hoje, mais atores políticos no Brasil. Os principais foram testados e falharam, e é desonestidade intelectual acreditar que uma simples troca de presidente mudará algo. Por isso, o poder instituinte precisa se apresentar diretamente, com o mínimo de representação possível. Ao apresentar-se enquanto tal, o poder instituinte pode impulsionar um processo de constituição de novos atores e novas formas.
O parlamentarismo tem a possibilidade de convocação de eleições em situações de crise. O presidencialismo brasileiro precisaria de tal flexibilidade para, no caso, convocar eleições gerais, tendo em vista, entre outros objetivos, a dissolução deste Congresso e a convocação de uma assembleia constituinte capaz de refundar a institucionalidade política nacional.
Assembleia para a qual poderiam se apresentar candidatos independentes, fora de partidos políticos, com controle estrito do poder econômico. A saída da crise não se dará por meio de conchavos de bastidores, mas pela radicalização da democracia. Como já se disse antes, há horas que você precisa deixar os mortos enterrarem seus mortos e seguir outro caminho.
http://blogdojuca.uol.com.br/2015/08/deixe-os-mortos-enterrarem-seus-mortos/ 
 

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Boca do lixo

Corte temporal

Barbosa; Augusto e Juvenal; Bauer, Danilo e Bigode; Friaça, Zizinho, Ademir, Jair e Chico. Este foi o time da seleção brasileira de futebol vice-campeã em 1950. Na final realizada no Maracanã, em 16 de julho de 1950, perdemos para o Uruguai por 2x1. O Uruguai de Máspoli; Matías Gonzalez e Tejera; Gambetta, Obdulio Varela e Rodríguez Andrade; Ghiggia, Julio Perez, Miguez, Schiaffino e Morán. Ghiggia (falecido, aos 88 anos, em 17 de julho de 2015) marcou o gol de desempate aos 34 minutos de segundo tempo e sacramentou a derrota. Uma tragédia presenciada por 173.850 presentes ao Maracanã. Uma decepção nacional apenas superada pelo vergonhoso 7x1 para a Alemanha em 2014.

Boca do lixo

A Boca do Lixo foi um polo cinematográfico importante no centro da cidade de São Paulo. O cinema independente nacional teve seu auge nas décadas de 1960, 70 e 80. Nesta época a região das ruas Triunfo, Aurora e Vitória respirava cinema. No início, as chanchadas; no auge, pornochanchadas, faroestes e cinema marginal e na decadência, pornô-eróticos. Além da chanchada e pornochanchada são da época na Boca, dentre outros os filmes: O bandido da luz vermelha – 1968 de Rogério Sganzerla, A margem – 1967 de Ozualdo Candeias e Lilian M: relatório confidencial - 1975 de Carlos Reichenbach. Os filmes famosos do Zé do Caixão (José Mojica Marins) foram produzidos por lá.

Para o crítico e diretor de cinema Alfredo Sternheim  “a  Boca foi muito estigmatizada e eu, pessoalmente, levei muita pedrada ao longo dos anos. Para mim, no entanto, o saldo é positivo. A Boca mostrou que é possível fazer cinema no Brasil com diversidade de temas e autofinanciamento, sem leis de renúncia fiscal. Sabíamos economizar tudo e fazer os recursos renderem o máximo. Vale lembrar que saiu da Boca O pagador de promessas (1962) de Anselmo Duarte, único filme brasileiro a ganhar a Palma de Ouro em Cannes. Também são de lá outros filmes brasileiros importantes, como Independência ou morte (1972) de Carlos Coimbra e A moreninha (1970) de Glauco Mirko Laurelli”. [1]

Magnífica 70

A série da HBO exibida atualmente tem como pano de fundo a Boca do Lixo. A personagem central é um censor de filmes na época da ditadura militar. Vicente (Marcos Winter), o censor, de tanto ver filmes se torna um cinéfilo e se mete a dar palpite nos filmes em que lhe é designado. No primeiro episodio ele ameaça a proibição total do filme “A devassa da estudante” que tem como personagem central a atriz Dora (Simone Spoladore). Atraído pela atriz, Vicente propõe ao produtor Manolo (Adriano Garib) uma alternativa ao veto total do filme: rodar um novo final para o filme. Nela a personagem tem que se arrepender de seus pecados.  Fica mais ou menos assim:
Quando viva, pequei. Me deitei com homens e mulheres. Usei meu corpo para sobreviver. Tive orgulho disso. Errei, admito e aprendi. Todos erram um dia por descuido, inocência ou maldade. Assumo os meus erros e passarei a eternidade vivendo com eles. E ao fazer isto observo algo que me faz lembrar de ti.
Vicente dirigiu a cena final modificada e o filme foi liberado pela censura.

Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver
A parte final do 1º episódio de Magnífica 70 foi claramente baseada no que ocorreu com a liberação pela censura do filme Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver – 1967 de José Mojica Marins - https://www.youtube.com/watch?v=xKE3lfwMb1Y.
O chefe da censura em Brasília proibiu o filme. O produtor implorou pela liberação. O censor impôs uma condição: o Zé do Caixão deveria no final falar como se estivesse arrependido pelas maldades feitas durante a estória. O censor escreveu o que deveria ser dito:

Deus, Deus... Sim, Deus é a verdade...
Eu creio em tua força... Salvai-me!
A cruz, a cruz, padre...
A cruz, o símbolo do filho!

E assim ficou e até hoje o filme tem este final [2]. Desconheço uma versão do diretor.
E quem era este censor que adulterou o filme Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver? Augusto da Costa (1920-2004), o Augusto, zagueiro e capitão da seleção brasileira no final da Copa de 1950.

Coisas do Brasil, brasileiro.

Referências


2.    Maldito: a vida e o cinema de José Mojica Marins, o Zé do Caixão, André Barcinski, Ivan Finotti, Editora 34, 1998
 

 

sábado, 11 de abril de 2015

Casmurro


Autran Dourado um dia disse: "Todo ano releio três livros de Machado de Assis: Dom Casmurro, Quincas Borba, e Memórias póstumas de Brás Cubas, para limpar a língua que fica suja das leituras estrangeiras".

Com a inspiração em Autran e Machado passo a contar a estória de Belmiro. 

Um "doutor" renegado


Belmiro é carioca, aposentado e divorciado. Hoje vive só. Do casamento tem um filho. Foi casado com Carmem e é pai de Enrique. A estória deste casamento é o motivo desta conversa.
Sua formação universitária foi o direito. Depois da graduação e com pouco tempo no exercício da advocacia percebeu a opção errada pelo direito. Mudou após uma feroz discussão com a mãe. Coitada, lutou tanto para que o filho fosse um "doutor". Um ingrato! É isto que você é, seu merda! Disse dona Graça, a mãe, quando da decisão de Belmiro. Não teve jeito, fez concurso na Eletrobrás e ficou por lá durante 35 anos. Mas a dona Graça merece um espaço a parte.

Dona Graça


A mãe, dona Graça, tem um quê da Manuela do filme Tudo sobre minha mãe do Almodóvar. Um quê, pois Manuela tem mais ternura. Graça, apesar de dar a vida pelo filho, era mais autoritária. No filme o filho Esteban pergunta à mãe: seria capaz de se prostituir por mim? A resposta de Manuela: já fui capaz de fazer qualquer coisa por você. Para a mesma cena qual seria a resposta da Graça para Belmiro? Ô moleque deixa de ser besta! Era assim a mãe do Belmiro. Tinha momentos de ternura, mas tinha o chicote em períodos interinos.

Carmem


Eu, você e ninguém mais. É o que espero meu bem. Estes foram os dizeres escritos num cartão enviado por Carmem. Eram jovens apaixonados. Promessas de amor eterno; juramentos de juntos até a morte e um vislumbre cego do paraíso. Carmem era a combinação da inocência com sexo, da ingenuidade com alegria. Sem dúvida foi a mulher da vida do filho da Dona Graça.
A relação com Carmem, na época do namoro e noivado, teve uma sombra presente: a mãe. No início com o argumento de que atrapalhava os estudos e no fim um transparente ciúme do filho. Esta mulher é uma sirigaita, mais tarde você verá. Era Dona Graça com o chicote.

As algemas


Belmiro casou com Carmem numa tarde de verão. Na época o sentimento que contaminava era o de um algemado pela paixão. Um condenado que se sentia feliz como tal. Tiveram dois anos maravilhosos vivendo boas passagens. Ainda com aquela impressão de que tinha feito a opção certa na hora certa: a opção Carmem. O trabalho e a vida social deixavam o casal ocupados e bem alimentados de prazeres e inutilidades perenes. Até o aparecimento do Enrique, o filho e a personagem emblemática chamada Álvaro.

Álvaro


Colega de trabalho, bom vivant, bonito e boêmio. Assim era o Álvaro. Conversa de boteco: Belmiro por favor, não reclama da vida. Tens um bom emprego, é casado com uma bela mulher, não paga aluguel e mora na cidade maravilhosa. Você quer mais o quê?
Sei não, Álvaro, tenho uma ideia atravessada sobre Carmem. Um grilo. Ela se passa por uma esposa dispersa, sem foco no casamento. Independente demais pro meu gosto.
Ideia sem braço, Belmiro. Hoje as coisas mudaram. A mulher mudou e nós, homens, não. Mulher trabalha, tem salário. Mulher também vota nessa tralha que elegemos para deputado, senador, presidente, governador, prefeito, vereador. Mulher às vezes é mãe e pai.

Álvaro, bom vivant, bonito, boêmio e dissimulado, esperto. Depois de um tempo começou a desconfiança. Belmiro não gostava de como ele olhava para Carmem.

O ciúme


Carmem, no inicio me sentia algemado por você. Hoje me sinto corrompido.
Belmiro, és um implicante, um cabeçudo. Já te falei mil vezes: tira da cabeça que tenho alguma coisa com o Álvaro. É uma ideia sem pernas, ô cara!
Mas a ação de Carmem não correspondia à intensão. Não convencia o marido.
Tome cuidado com seus desejos. Você nunca estará seguro nas mãos de uma mulher, seja ela quem for. Lembrou deste diálogo de um filme. Considerou a hipótese de que não confiava mais em Carmem. Depois de um tempo a hipótese virou tempestade.

Previsão do tempo: tempestade

Meu filho, sabes minha opinião sobre Carmem, mas tenha calma, esvazia a cabeça; tens uma família e um casamento a serem mantidos.
Sei não mãe o que me atormenta é a desconfiança; odeio fingir. Agora te conto a última: o Enrique adora o Álvaro. Domingo passado nos encontramos num restaurante e os dois conversaram o tempo todo.
Ai! Cacete, taí o Otelo falando. O Otelo ensimesmado e onisciente; e burro! Dúvidas traidoras de Shakespeare. A continuar assim o inferno está próximo e você vai para o buraco. Só faltava esta: dúvida sobre a paternidade. Poupe-me Belmiro!
A mãe tinha razão; Belmiro estava a meio caminho do inferno.

Inferno

A desconfiança se concretizou num dia em que chegou em casa e quem encontrou? Álvaro, Carmem e Enrique.
Aí perdeu a paciência e o pau comeu. Ô! calma Belmiro, deixa eu explicar. Vim aqui para trazer um presente para o Enrique. O cínico do Álvaro não convenceu. Olha aqui, seu puto, a merda você e vá botar chifre em tua mãe, seu canalha. Desabafou e logo a seguir lhe deu um safanão daqueles. Álvaro desabou por trás do sofá com a boca sangrando. Você está louco varrido. Ele é teu amigo; e meu também! Era Carmem furiosa segurando o Enrique, que chorava. O "e meu também" irritou o ciumento mais ainda. Sua puta! Traíra isto sim, é o que você é. Eu devia te matar sua filha da puta. A resposta de Carmem: ah! você não faria isto, sabe porque? porque você é um bosta e me enoja. Que tristeza ter casado com um filhinho da mãe!
Depois do acontecido houve a separação e Belmiro passou a morar sozinho. Enrique, hoje, é jovem e engenheiro eletricista. Álvaro, que também é engenheiro eletricista, mora em Natal, Rio Grande do Norte. Carmem vive com o filho e pelos boatos tem um namorado rico.

A leitora poderá inquirir Belmiro: e o teste de DNA, porque não fez? Porque não quero saber. Enrique é meu filho, tá no registro.

"O amor na sociedade é a troca de duas fantasias e o contato de duas epidermes"  La regle du jeu (A regra do jogo), filme da Jean Renoir, 1939.




 

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

O nó górdio do século



Tempos modernos

A foto acima é de um aeroporto no Brasil (Confins, 01/03/2015). São os acessos para energia elétrica de carregamento, principalmente, de celulares tipos smarthphone e iphone que tem autonomia, em média, de 24 horas quando muito utilizados.


A grande questão do século XXI: a autonomia das baterias para celulares, carro elétrico e células de energia em geradores solares e eólicos.

Goodenough pode ajudar a resolver o problema.
 
 
 
 
Aos 92 anos, criador da bateria de íon-lítio trabalha em nova ideia

John B. Goodenough é pouco conhecido fora da academia, mas seu invento está em praticamente todos os eletrônicos portáteis já produzidos
 
O Globo 11/02/2015 13:30




John B. Goodenough não ganhou royalties pelo seu invento

e até hoje trabalha diariamente na Universidade do Texas - Reprodução/Universidade do Texas

RIO — Apesar de pouco conhecido fora do ambiente acadêmico, John Bannister Goodenough é um dos principais responsáveis pela revolução tecnológica vivida nos últimos 30 anos. Sem o seu trabalho, notebooks, smartphones e tablets seriam um delírio inalcançável. Inventor da bateria de íon-lítio, o físico americano ampliou as possibilidades da indústria de tecnologia e sua criação está em praticamente todos os equipamentos eletrônicos portáteis já vendidos no mundo. Hoje, aos 92 anos, trabalha em sua última grande ideia.

Todos os dias Goodenough vai ao seu pequeno escritório na Universidade do Texas, em Austin, para dar continuidade às suas pesquisas. 35 anos após sua grande invenção, os carros elétricos ainda não conseguem competir com os motores de combustão interna em termos de custo. A duração da varga dos smartphones é o ponto fraco do equipamento. É preciso dar um passo além, inventar uma super bateria.
 
— Eu quero resolver o problema antes de jogar as minhas fichas — disse, em entrevista ao site "Quartz". — Eu só tenho 92. Ainda tenho tempo para conseguir.

Em 1980, quando tinha 57 anos, Goodenough inventou o catodo de óxido de cobalto, considerado o coração das baterias de íon-lítio. Com outras contribuições, a tecnologia chegou ao mercado em 1991 pela Sony, que lançou as primeiras pilhas recarregáveis do mercado, direcionadas para as filmadoras de mão.

Apesar do feito, Goodenough não ganhou dinheiro com sua criação, tampouco o reconhecimento de um Prêmio Nobel.

Crescido em New Haven, no estado americano de Connecticut, Goodenough teve uma infância difícil, não por questões financeiras, mas no relacionamento com os pais. Aos 12 anos, foi enviado para um colégio interno e praticamente perdeu contato com a família. Sua mãe só lhe enviou uma carta quando ele já era adulto.

Quando criança, sofria de dislexia numa época em que o problema era pouco compreendido, mas Goodenough superou os contratempos e conseguiu uma bolsa de estudos em Yale, onde cursou matemática. Após se graduar, foi lutar na Segunda Guerra Mundial, e, aos 24 anos, quando servia como capitão do exército em um arquipélago na costa de Portugal, recebeu um inusitado convite: retornar aos EUA para continuar os estudos.

Em 1952, obteve seu doutorado em Física pela Universidade de Chicago e foi trabalhar em um laboratório no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês). Na metade da década de 1970, Goodenough se viu desafiado pela crise do petróleo e, em 1976, migrou para a Universidade Oxford para se dedicar às pesquisas com energia.

Na mesma época, o químico britânico Stan Whittingham anunciou a descoberta do uso dos íons de lítio nas baterias, que poderiam criar a bateria recarregável que conhecemos hoje, mas o invento tinha um problema: quando sobrecarregada, a pilha explodia. É nesse ponto que entra a contribuição de Goodenough.

No invento de Whittingham, o catodo era de sulfeto de titânio, e esse era o ponto que o físico americano pretendia mudar. Em 1980, quatro anos após sua chegada em Oxford, ele chegou ao catodo de óxido de cobalto, mais estável e com maior capacidade que qualquer outra tecnologia existente.

Em 1991, a Sony pegou o invento de Goodenough e lançou a primeira bateria de íon-lítio recarregável do mercado, sendo logo copiada por outras fabricante. Comparada às pilhas anteriores, de zinco carbono e níquel cádmio, os ganhos eram evidentes.

Apesar de sua contribuição central no desenvolvimento das baterias de íon-lítio, Goodenough não recebeu royalties pela sua criação. A Universidade Oxford se recusou a patentear o catodo de óxido de cobalto, porque não via vantagens em possuir propriedades intelectuais.

Quase todos os anos Goodenough é indicado ao Prêmio Nobel, mas nunca foi agraciado. Em 2009, recebeu o prêmio Enrico Fermi, e, em 2013, a Medalha Nacional de Ciências. Sua contribuição é tão importante que, em 2009, a Sociedade Real de Química do Reino Unido criou o prêmio John B. Goodenough.

Mas Goodenough não está atrás de honrarias para o fim de sua carreira, ele quer uma última grande invenção: a super bateria, que seja capaz de tornar os carros elétricos mais baratos que os de combustão interna e facilite o armazenamento de energia em usinas eólicas e solares.
http://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/aos-92-anos-criador-da-bateria-de-ion-litio-trabalha-em-nova-ideia-15307397 12/02/2015



 

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

O "alto" índice de criminalidade em Barretos

Índice de criminalidade em Barretos continua alto
De acordo com dados estatísticos divulgados pela Secretaria de Estado da Segurança Pública do Estado (SP), o índice de criminalidade em Barretos em comparação com 2013 continua alto. Os casos de homicídio na cidade tiveram uma queda de quase 50%, caindo de onze para seis, mas os casos de tentativa de homicídio subiram de 17 para 19 e os casos de lesão corporal dolosa aumentaram de 714 em 2013 para 775 este ano (2014). [Jornal de Barretos, 28/12/2014]
Mais detalhes no quadro abaixo:

Uma análise da notícia
O índice que mede a violência das cidades e países é o numero de homicídios para cada 100 mil habitantes. No Brasil este índice foi de 25,2 em 2012. Nas capitais mais violentas: Maceió - 79,76; Fortaleza - 72,81; João Pessoa - 66,92; Natal - 57,62; Salvador - 57,51; Vitória - 57,39; São Luís - 57,04; Belém - 48,23; Campina Grande - 46; Goiânia - 44,56; Cuiabá - 43,95; Manaus - 42,53; Recife - 36,82; Macapá - 36,59; Belo Horizonte - 34,73 e Aracaju- 33,36. [ http://oglobo.globo.com de 10/04/2014]

Barretos tem cerca de 120 mil habitantes. Numa continha rápida, em 2014, ocorreram 5 homicídios para cada 100 mil habitantes. Em países como França, Holanda, Itália e Austrália este índice é de 0,9 homicídios para cada 100 mil habitantes (dados de 2012).
Conclusão: quem escreveu a matéria para o Jornal de Barretos estava num destes países.