Mais de 450 mil alunos do ensino fundamental ficaram sem atividade remota na pandemia. Número representa quase 15% dos matriculados no 5º e no 9º anos; grupo tem alto risco de evasão
Isabela Palhares, 25/11/2021
Apenas nos anos finais do ensino fundamental, nas turmas de 5º e 9º anos, mais de 450 mil alunos das redes municipais do Brasil estão em alto risco de abandonar os estudos depois da pandemia.
Isso representa quase 15% do total de matriculados nestes dois anos somados. São estudantes que passaram mais de um ano sem acompanhar nenhuma atividade remota durante o fechamento das escolas no país.
O levantamento de crianças em risco de abandono escolar foi feito por técnicos de 29 Tribunais de Contas do país, em parceria com o Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional) e o CTE-IRB (Comitê Técnico da Educação do Instituto Rui Barbosa).
A pesquisa, divulgada nesta quinta (25), foi feita diretamente com as redes municipais e estaduais de ensino de todo o país, já que o Ministério da Educação não realizou nenhum diagnóstico sobre a evasão escolar durante a pandemia.
O processo de coleta dos dados indica que o número de alunos em risco pode ser ainda maior, já que a maioria das localidades teve dificuldade de apresentar um diagnóstico do acompanhamento das atividades escolares durante o fechamento de escolas.
Segundo o levantamento, a média de participação dos alunos do 5º ano do ensino fundamental nas escolas municipais foi de 92,5%, o que significa 144 mil crianças sem nenhum acompanhamento das atividades escolares. Já no 9º ano, 90,1% tiveram alguma participação, deixando 94 mil alunos de fora.
A pesquisa não permite dizer que esses alunos já abandonaram os estudos, mas que eles estão em alto risco de não retornar à escola depois de mais de um ano sem acompanhamento. A saída desses estudantes pode levar o país a um retrocesso de anos, já que o acesso educacional de crianças e adolescentes nessa etapa, dos 6 aos 14 anos, estava praticamente universalizado antes da pandemia — era de 99%.
"Corremos o risco de um enorme retrocesso caso esses alunos não voltem para a escola. Por isso, precisamos de uma ação coordenada em todo o país para melhorar as ferramentas de acompanhamento, identificar quem ainda está fora e fazer ações de busca ativa", diz Cezar Miola, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul e presidente do CTE-IRB.
O levantamento mostra ainda as desigualdades regionais do risco de abandono escolar. Enquanto na região Sul a média de participação dos alunos de 5º ano foi de 96,2%, no Nordeste, o índice foi de 88%. O mesmo ocorre com a média do 9º ano.
"A pandemia reforçou ainda mais as desigualdades que já existiam, ela atuou mais forte contra quem estava mais vulnerável e isso vale também para as redes de ensino. As redes com menos recursos tiveram mais dificuldade de adaptação tecnológica, de ter professores para a busca ativa", diz Ernesto Faria, diretor-fundador do Iede.
Enquanto na região Sul, 90% dos estudantes já puderam voltar a frequentar a escola, no Nordeste só 40% tiveram essa opção. A demora também tem prejudicado mais os estudantes negros e pobres.
Em setembro, 65% dos alunos do país tiveram suas escolas reabertas, ainda que parcialmente. Entre os estudantes brancos, o índice chegou a 72%, mas ficou em 61% para os negros.
Entre as três faixas de maior nível socioeconômico, a retomada das aulas presenciais alcançou 73% dos alunos. Mas era de apenas 41% para aqueles que estão nas três menores faixas de renda. "Quanto mais demoramos para identificar quem está fora da escola, mais difícil será trazê-los para dentro depois", diz Faria.
Segundo Miola, os tribunais de conta do país pretendem, a partir dessas informações, cobrar e colaborar com as redes de ensino para a elaboração de procedimentos para identificar alunos sem participação escolar e de ações que ajudem no retorno.
Enquanto estados e municípios enfrentam dificuldade para identificar os alunos em risco e desenvolver ações para que retomem as atividades escolares, o MEC tem se ausentado do assunto durante a pandemia.
Nesta quarta (24), a Comissão Externa da Câmara dos Deputados, que acompanha as ações do MEC, apresentou relatório apontando que, mais de 20 meses após o fechamento das escolas, o órgão do governo federal não realizou nenhum diagnóstico sobre as perdas de aprendizagem dos alunos e evasão escolar.
Procurado, o MEC não respondeu se pretende adotar alguma medida para evitar o aumento do abandono escolar no país.
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