domingo, 28 de novembro de 2021

Garimpo no rio Madeira

O rio Madeira voltou ao noticiário. Agora a invasão de garimpeiros a procura de ouro.
Centenas de balsas de garimpo ilegal desafiam fiscalização e tomam conta de trecho do rio Madeira, na Amazônia. Exibição em 24 nov 2021.

A ocupação começou há cerca de 15 dias em Autazes, a 113 quilômetros de Manaus. Os danos ao meio ambiente já começam a aparecer nas encostas, mas ainda não houve nenhuma ação dos órgãos de fiscalização.
Dezenas de balsas de garimpo ilegal atracam no Rio Madeira no AM 

O rio Madeira, coitado, tem história. Hoje, o garimpo. No passado: a ferrovia Madeira-Mamoré e o complexo hidrelétrico Santo Antônio – Jirau

HOJE

Invasão de garimpeiros no rio Madeira: o que se sabe e o que falta esclarecer
Grupo instalou centenas de dragas e balsas na região, há pelo menos 15 dias, para exploração ilegal de ouro. No local, foi formada uma espécie de 'vila flutuante' para a atividade.

Por g1 AM, 25/11/2021

Garimpeiros invadiram o Rio Madeira, no interior do Amazonas, com centenas de dragas e balsas para exploração ilegal de ouro. Há pelo menos 15 dias, eles se instalaram na região e formaram uma espécie de "vila flutuante" para a atividade.

 
Presença de garimpeiros assustou moradores de comunidade no rio Madeira, no Amazonas. — Foto: REUTERS/Bruno Kelly

Nesta reportagem, você entenderá o que se sabe e o que falta esclarecer sobre a situação:

1.        Por que os garimpeiros ocuparam o local agora?
2.        Em qual trecho do rio eles realizam o garimpo ilegal?
3.        A exploração de ouro é permitida na região?
4.        O que os órgãos de controle estão fazendo para impedir a invasão?
5.        Por que a presença das dragas irregulares não foi impedida até agora?
6.        Além da exploração ilegal, há outros crimes praticados na área?

Por que os garimpeiros ocuparam o local agora?
A presença de garimpeiros com balsas atuando na extração de ouro ao longo do rio Madeira não é novidade. Porém, a grande quantidade de dragas e balsas atuando no mesmo trecho chamou atenção, e a imagem impressiona.
 
Dragas atracam no Rio Madeira, próximo ao município de Autazes. — Foto: Silas Laurentino
Moradores da região relatam que garimpeiros começaram a compartilhar, nas últimas semanas, a informação de que haveria ouro naquele trecho específico, de forma informal. Eles começaram a chegar no local há cerca de 15 dias.

'Operando naturalmente à luz do dia sem ser incomodada por ninguém', diz ativista do Greenpeace sobre invasão de garimpo ilegal no Rio Madeira

FOTOS: Centenas de balsas e dragas bloqueiam trecho do Rio Madeira para garimpo ilegal

 
Dragas e balsas atracaram no meio do rio Madeira, no Amazonas, para exploração ilegal de ouro. — Foto: REUTERS/Bruno Kelly

Em qual trecho do rio eles montaram a "vila flutuante" para o garimpo ilegal?
A situação ocorre próximo à comunidade de Rosário, no município de Autazes, distante 113 quilômetros de Manaus. O trecho ocupado é usado para deslocamento de moradores de Nova Olinda do Norte, Borba e Novo Aripuanã para chegar a Manaus em lanchas. O trajeto é mais curto do que utilizando a BR-319, que é conhecida por estar muito deteriorada.

A exploração de ouro é permitida na região?

O Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) informou, em nota, que atividades de exploração mineral naquela região não estão licenciadas, portanto, se existindo de fato, são irregulares. O Ministério Público Federal (MPF) também ratificou que a extração de ouro na região do rio Madeira não é amparada por licença ambiental expedida pela autoridade ambiental competente ou por título de lavra emitido pela Agência Nacional de Mineração, o que torna essa atividade ilegal.


Mineiros ilegais se reuniram em uma corrida do ouro no Rio Madeira, em Autazes (AM); em áudio, garimpeiros falam em montar 'paredão' de balsas contra fiscalização Foto: Bruno Kelly/Reuters - 23/11/2021

Por que a presença das dragas irregulares não foi impedida até agora?
Essa é uma das questões que ainda não foram esclarecidas. O ativista do Greenpeace Danicley de Aguiar denunciou que a falta de fiscalização permitiu o avanço da atividade ilegal.

 "Nós estamos vendo aqui um conjunto de mais de 300 balsas colocadas numa ponta de rio, sem licença ambiental alguma, mas operando naturalmente à luz do dia sem ser incomodada por ninguém. São 300 balsas a menos de 30 minutos de voo da maior cidade da Amazônia e elas colocam aí em risco também toda a saúde pública da região", afirmou Aguiar.

 
Garimpeiros instalaram centenas de dragas e balsas nos últimos 15 dias no rio Madeira, no Amazonas. — Foto: REUTERS/Bruno Kelly

O que os órgãos de controle estão fazendo para impedir a invasão?
Até então, nenhuma ação concreta foi feita para retirar os garimpeiros do local. Questionados pelo g1, órgãos de controle informaram que estavam apurando a situação. O Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) informou, nesta quarta-feira (24), que está buscando informações, com intuito de planejar e realizar as devidas ações no âmbito de sua competência, integrado aos demais órgãos estaduais e federais. O órgão também afirmou que comunicaria o fato ao comando da Segurança Pública do Amazonas (SSP), além de pedir apoio federal para apurar a ocorrência.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) informou que teve ciência do caso e, nesta terça-feira (23), reuniu-se com o Ipaam para alinhar as informações, a fim de tomar as devidas providências e coordenar uma fiscalização de garimpo na região. A Polícia Federal informou que tomou conhecimento das atividades ilícitas que estão ocorrendo no Rio Madeira, e "juntamente com outras instituições, estabelecerá as melhores estratégias para o enfrentamento do problema e interrupção dos danos ambientais".

Além da exploração ilegal, há outros crimes praticados na área?

O Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas - IPAAM destacou que, além da mineração, pode haver outras possíveis ilegalidades que devem ser investigadas, tais como: mão de obra escrava, tráfico, contrabando e problemas com a capitania dos portos.
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Em tempo

Operação da PF queima embarcações ilegais de garimpo que tomam Rio Madeira e destrói 31 balsas
Ações federais tiveram inicio na madrugada deste sábado; ao menos 31 balsas já foram apreendidas e parte dos equipamentos estão sendo queimados pelos agentes

André Borges, O Estado de S.Paulo, 27 de novembro de 2021 

De Autazes (AM) - As ações federais de repreensão ao garimpo ilegal ao longo do Rio Madeira, no Estado do Amazonas, tiveram início na madrugada deste sábado, 27. Ao menos 31 balsas já foram apreendidas pela Operação Uiara, que reúne agentes da Polícia Federal, Ibama, Marinha e Aeronáutica. Parte dos equipamentos está sendo queimada pelos agentes. Durante as abordagens, uma pessoa foi presa e conduzida para a superintendência do Amazonas. Ela estava com uma quantidade de ouro.

 
Foram destruídas ainda 38 lanchas e 69 dragas usadas para sugar o leito do rio. Operação da PF queima embarcações ilegais de garimpo que tomam Rio Madeira Foto: Policia Federal

Garimpeiros começam a se dispersar antes de serem alvos de ação policial na Amazônia

Rio Madeira teve 'invasão' de balsas; grupo falava em montar um 'paredão' para resistir à chegada de agentes do Ibama e da PF

André Borges, O Estado de S.Paulo, 26 de novembro de 2021

A demora das autoridades federais em reagir ao movimento de balsas de garimpeiros no Rio Madeira, na Amazônia, resultou na dispersão de grande parte das centenas de embarcações clandestinas que ficaram paradas há cerca de uma semana na região de Autazes (AM). Como revelou o Estadão, o grupo se concentra na região onde teria sido encontrada uma grande quantidade de ouro.
Informações obtidas pelo Estadão apontam que a maior parte das balsas já deixou o local. Trocas de mensagens entre os garimpeiros sinalizam que parte deles já está subindo o Rio Madeira, sentido Humaitá, na fronteira do Amazonas com Rondônia. A região é conhecida pela aglomeração dessas embarcações. Muitos garimpeiros deixaram Autazes e já estão próximos do município de Nova Olinda do Norte (AM).

Em áudios, garimpeiros em rio na Amazônia falam em fazer tocaia e 'largar bala' contra polícia

Desde a terça-feira, 23, reportagem feita pelo Estadão já trazia detalhes sobre a aglomeração de centenas de balsas, todas elas atuando em situação irregular, na extração de ouro do Rio Madeira. Na quarta-feira, os garimpeiros já trocavam mensagens entre si, a respeito de reações caso houvesse algum tipo de ação repreensiva por parte dos órgãos policiais e de repreensão.
Em mensagens de áudio divulgadas pelo Estadão, os garimpeiros falaram na possibilidade de montar um “paredão” de balsas para reter a ação policial, chegaram a falar em tocaias na floresta e em “mandar bala” nos agentes.

O Ministério da Justiça mobilizou a Polícia Federal, além das Forças Armadas e agentes do Ibama para realizarem uma ação na região. Até o momento, porém, nada ocorreu efetivamente. Informados sobre a mobilização, os garimpeiros também avaliavam a alternativa de deixarem o local.
Como seus equipamentos são irregulares, eles sabem que não há outra opção em casos de abordagem policial: tudo tem que se apreendido ou destruído no próprio local.

As autoridades federais não deram detalhes sobre seus planos na região, mas o que se articulava vinha sendo chamado internamente, pelos membros do governo, de uma “operação de guerra”, com bloqueio de passagens pelo Rio Madeira e por estradas que chegam à região onde estavam as embarcações.
Agentes ouvidos pela reportagem acreditam que a situação pode, de certa forma, facilitar a abordagem policial, porque evita conflitos com grande aglomeração. Além disso, as balsas se movem lentamente.
Foto Onde fica
Balsas de garimpo ilegal estão avançando pelas águas do Rio Madeira (AM)
 
Fim do Em tempo
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O acesso às balsas é feito, na maior parte das abordagens, pelas equipes de helicópteros. A aeronave se aproxima da balsa, os agentes descem e tomam o controle da embarcação. Nos casos em que há pessoas no local, seus documentos são fotografados. As pessoas são liberadas, com seus pertences. A balsa, então, é destruída no local. Para atear o fogo, os agentes utilizam o próprio combustível armazenado nas balsas. Antes de atear o fogo, os agentes revistam a embarcação para checar se há mercúrio armazenado, produto extremamente nocivo ao meio ambiente e que é utilizado no processo de separação do ouro.

A apreensão ocorreu nas águas do Madeira que cortam o município de Nova Olinda do Norte. Aglomeradas há mais de uma semana na região de Autazes, município que fica a 230 quilômetros de barco de Manaus, em viagem pelos rios Amazonas e Madeira, mais de 300 balsas se dispersaram ontem, após informações de que haveria, de fato, uma operação federal de grande porte. O deslocamento dessas balsas, porém, é lento.

 
O acesso às balsas é feito pelas equipes de helicópteros Foto: Polícia Federal e Ibama

Na tentativa de escapar da fiscalização, é comum a situação em que o garimpeiro recolhe a balsa para uma margem, retira o maquinário que puder e abandona a balsa. Em outros casos, tenta esconder o equipamento em pequenos afluentes do rio.
A operação dos órgãos federais reúne agentes do Paraná, Brasília, Amazonas, Paraíba e Pará. A debandada dos garimpeiros pode dificultar o trabalho de capturar todas as balsas. Por outro lado, facilita o trabalho de abordagem policial. Havia grande tensão sobre a forma como os garimpeiros seriam abordados. 

Por meio de trocas de mensagens, os garimpeiros já comentavam sobre a mobilização de repreensão desde a quarta-feira, 24. Ainda assim, permaneceram por mais três dias atracados em fileiras. Na sexta-feira, porém, desmobilizaram e se espalharam pela calha principal do Rio Madeira. O nome Uiara, escolhido para a operação, tem origem na língua tupi significa “mãe da água”. Não há data definida para a mobilização acabar.

Alerta

A repreensão policial envolve equipes que entraram pelo rio, por meio de helicópteros e pelas estradas da região. Os garimpeiros, que se deslocaram para a região de Humaitá, na divisa de Amazonas e Rondônia, têm trocado alertas sobre a mobilização.
“Nova Olinda até Autazes, não tem lugar nem no chão nem na terra. Só eles que tá dando. Estão de helicóptero e o caralho... de voadeira. Tão até pelo fundo, eu acho”, afirma um garimpeiro, em mensagem obtida pela reportagem. Durante a semana, alguns garimpeiros chegaram a trocar mensagens sobre suposta mobilização para revidar às ações de fiscalização, mas recuaram diante da informação de que as autoridades estariam mobilizando um forte aparato policial.

Em tempo

Operação contra balsas de garimpo no Rio Madeira destruiu 131 dragas. Equipamentos eram utilizados ilegalmente na busca por ouro no Amazonas; garimpeiros chegaram a fazer protestos contra ação

29 de novembro de 2021, André Borges

Destruição de balsas de garimpo, no Rio Madeira, tem objetivo de inviabilizar crime ambiental

NO PASSADO

 Madeira-Mamoré, uma insensatez.

A saga começou em 1879, comandada pelo coronel estadunidense George Church e terminou com apenas 7,5 km construídos de estrada. O tratado de Petrópolis, assinado a 17 de novembro de 1903, com a Bolívia abriu as portas para a reativação do projeto Madeira- Mamoré, que permitiria que a borracha (e outras riquezas da floresta) descesse o Rio Madeira de trem, transpondo suas dezenove cachoeiras, e seguisse pelo rio Amazonas em navios a vapor até o Atlântico e, dali para a Europa e os Estados Unidos. O governo Afonso Pena, em 1907, assinou uma concessão para que outro estadunidense, Percival Farquhar, construísse a ferrovia em quatro anos. Farquahar era um negociador astuto e controlava ferrovias e outros negócios em diversos países. Com a borracha em seu apogeu, ele jogou duro com o governo e garantiu uma concessão de 69 anos que incluía a ferrovia e grandes seringais ao longo do rio Madeira (2).

A minissérie Mad Maria, da rede Globo (2005), baseada no livro homônimo de Márcio de Souza, descreve Percival como um crápula, além dos atributos acima. Tem sentido, já que a história do Brasil é recheada de falcatruas impostas pelos ditos (ou mal-ditos) países dominadores.

Os trabalhadores da construção da estrada formavam uma verdadeira babel: tinha brasileiros, alemães, estadunidenses (os gerentes e engenheiros), espanhóis, gregos, indianos etc. Dos EUA vieram os confederados, perdedores da guerra da secessão naquele país. Resultado da insensata aventura: para construir a estrada (com 336 km), em quatro anos, ligando Porto Velho a Guarajá-Mirim, mais de 30 mil trabalhadores foram hospitalizados e destes, 10 mil morreram infectados por malária, beribéri etc.
Com o fim do ciclo da borracha Madeira Mamoré ficou inútil poucos anos após sua inauguração em 1912. E hoje, em 2011, o que acontece por lá?

Cito dois exemplos: o complexo hidrelétrico do rio Madeira, Santo Antônio – Jirau, e a estrada sobre o território indígena Parque Nacional Isiboro Sécure (Tipnis) na Bolívia.


 
O complexo hidrelétrico Santo Antônio – Jirau

"No Brasil, para conceber e construir projetos como os do Rio Madeira ou Belo Monte, não é preciso ter conhecimento técnico apenas, tem que saber enganar bem, fornecer dados inconsistentes. Saber manipular informações, números, valores, desconstruir laudos de especialistas internacionais, estatísticas, convencer autoridades e, principalmente, bancar muitas campanhas eleitorais. Se fosse possível conceder um prêmio de manipulação ele seria dividido entre os idealizadores do projeto Madeira e o governo Lula". (Telma Monteiro)

"O documentário Entre a Cheia e o Vazio é um recorte de uma batalha de sentidos em torno dos efeitos de larga escala produzidos pelas Usinas Hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira, o afluente mais caudaloso do Amazonas. Batalha que se intensificou com a chamada "cheia histórica" de 2014, ampliada pela retenção de água nos dois reservatórios, e que prossegue nesse exato momento em que estudos preliminares indicam que os elevados níveis de assoreamento do rio podem resultar, em 2015, numa cheia de proporções similares, ainda que com menor volume de precipitações. As consequências do duplo barramento (e que pretende ser triplo com o aproveitamento da Cachoeira de Ribeirão - Guajará Mirim) de um rio com tamanha descarga sólida, em períodos muito concentrados de tempo, só estão sendo avaliadas a posteriori e muito limitadamente. Além de expropriarem o rio e seus usos sociais, procuram expropriar a capacidade de percepção e inteligibilidade do território recriado". (Luis Fernando Novoa Garzon)

Réquiem

 O que acontece em 2021 com o rio Madeira tem um alcançe geográfico e ecológico gigantesco. O garimpo ocorre a 890 km, rio abaixo, do complexo hidrelétrico Santo Antônio – Jirau.

Cayahuari Yacu, the jungle Indians call this country, the land where God did not finish creation. They believe only after man has disappeared will He return to finish His work. (do filme Fitzcarraldo)




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