O futebol insiste, resiste e, nos pés e na alma do Real Madrid, re-existe
Milly Lacombe, UOL, 04/05/2022
Futebol não cabe em planilha, não aceita cálculo, não se curva a protocolos. O jogo existe nas beiradas e, como uma flor que nasce por entre o cimento, volta mesmo quando tentam moldá-lo, encaixá-lo, domesticá-lo, soterrá-lo. Em três minutos, já depois dos 45 do segundo tempo, o Real virou um jogo perdido. Estava eliminado, e seguiria eliminado se apenas empatasse. Com a virada, levou o jogo para a prorrogação e liquidou a parada ao vencer o City por 3 a 1. Vai para a final contra o Liverpool em Paris.
O Real fez o impossível porque, no futebol, o horizonte do impossível é sempre jogado mais pra longe. Hoje, o time de Ancelotti deu um pontapé na linha do horizonte das coisas impossíveis e mandou ela lá onde os olhos já não podem mais enxergar. Torcida não ganha jogo, mas coloca ritmo, canta e dança que acredita, pulsa como um coração que sabe que tudo pode acontecer - e manda todo esse delírio para o campo.
Torcida não ganha jogo mas coloca em campo forças misteriosas que, por mais que tentemos, não temos como explicar. Torcida não ganha jogo, mas encanta, terreiriza, convida o sagrado a se apresentar.
Insanidade, loucura, desatino, transe, catarse, alucinação. É em busca disso que voltamos todas as semanas para dentro de um estádio ou para a frente de um monitor. Em Madri, no Morumbi, em Itaquera, na rua Javari, num campo de várzea, com 100 mil pessoas torcendo nas arquibancadas, com ninguém do lado de fora do campo, não importa. O sentimento é sempre o mesmo: estamos vivos.
O futebol, a despeito de tantos maltratos, diz, na voz, no corpo e na alma de milhões de madrilenhos, que não vai morrer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário