Filho da mãe
Odair, com seus 55 anos, tem uma bronca danada
da mãe. Ele fez terapia freudiana durante 15 anos. No final percebeu que seu
problema não era o pai. Era a mãe. Lembrou da sua tirania quando criança. Sim,
Marcela, a mãe, tratava Odair sob o chicote físico e mental. Um Henrique VIII
de saias.
Mas o filho da mãe do Odair não era flor que
se cheira. Com uma juventude, como o diabo gosta, fez com que Marcela moderasse
sua tirania. Recuou e passou a trata-lo como um pão de queijo. Filho, vamos dar um tempo na esbórnia. Será
que não dá para você ter um sentido na vida. Casar com uma boa moça e ter
filhas e filhos? O conselho da mãe valeu quase nada. Mas ele casou sim.
Quatro vezes. Com mulheres. Quatro casamentos e quatro divórcios. No fim
casou-se com um homem.
Filho, você já
soube de uma mãe se decepcionar por ter parido um filho? Não? Pois está aqui
uma do seu lado. Você me decepcionou demais. Tentei mudar o rumo das coisas,
mas foi em vão.
Marcela faleceu dois dia após esta última conversa com Odair.
Odair pensa até hoje: o que mais odeio em
minha mãe é que não consigo odiá-la.
Filha do pai
Um
prólogo para começar esta conversa.
Assisti,
recentemente, ao filme Firebrand, 2023
de Karim Aïnouz. No início pensei, que diabos este cearense tem a ver com
Henrique VIII. No fim entendi. O filme é escrito por três mulheres: Henrietta
Ashworth, Jessica Ashworth, Elizabeth Fremantle. Daí se depreende que HenriqueVIII (1491-1547), uma
das personagens do filme, não ia se dar bem. E é o que acontece.
Catarina Parr, a última esposa que sobreviveu ao
citado rei, é a protagonista do filme. Catarina foi simpática e esteve por
alguns momentos com Anne Askew (1521 – 1546) escritora, poeta e
pregadora anabatista (ala radical da
reforma protestante) inglesa que foi condenada como herege na Inglaterra durante o reinado
de Henrique VIII. Foi torturada com requintes de crueldade
e queimada viva em 1546. Por causa disto Catarina quase foi incinerada também.
Os minutos finais do filme diz bem a que veio. Catarina despeja todo seu ódio a
Henrique em seu leito de morte. E termina com a personagem Maria (uma das filhas
de Henrique), mais tarde Maria I, sorridente após a morte do pai.
Antes, para entender o contexto, vamos à chatice chamada genealogia dos monarcas britânicos.
Eduardo VI sucedeu
ao pai em 1547. Eduardo VI (1537 – 1553) foi o Rei da Inglaterra de 1547 até sua morte (6
anos). Filho do rei Henrique VIII com Joana Seymour, Eduardo foi o terceiro
monarca da Casa de Tudor e o primeiro rei inglês criado como protestante.
Isabel I ou Elizabeth I (1533 – 1603), também chamada de "A Rainha Virgem", foi rainha reinante da
Inglaterra e Irlanda de 1558 até sua morte (45 anos) e a quinta e última
monarca da Casa de Tudor. Como filha do rei Henrique VIII, Isabel nasceu dentro
da linha de sucessão; entretanto, a sua mãe Ana Bolena foi executada dois anos
e meio após seu nascimento, e o casamento dos seus pais foi anulado. Isabel
assim foi declarada ilegítima.
Destaques importantes.
(a) Os reinados pós Henrique VIII levaram o legado de Thomas Cromwell primeiro-ministro deste rei e responsável Reforma Inglesa. As brigas e guerras na época não tinham só como pano de fundo a religião. Existiam questões políticas relevantes porque as ligações que Inglaterra e França tinham com Roma e o Papa (o sacro imperador romano) eram também políticas e econômicas. Thomas Cromwell e a Reforma Inglesa rompeu com estes vínculos. A excelente série Wolf Hall de 2015 trata destes temas.
(b) Ironias do destino. Na sucessão de Henrique VIII, um carrasco de esposas, só deu mulheres. Com exceção de Eduardo VI (6 anos) tem Maria I (5 anos) e Elizabeth I (45 anos) filho e filhas do carrasco. Será 50 anos de vingança das mulheres?
Voltando à conversa.
Maria I aparece, na sucessão, entre Eduardo VI e Elizabeth I. Nas gestões das duas mulheres existiram moderados conflitos religiosos e convivências idem entre nações.
Maria I (1516 – 1558) foi rainha reinante da Inglaterra e Irlanda de 1553 até sua morte (5 anos), além de rainha consorte da Espanha a partir de 1556. Filha de Henrique VIII com sua primeira esposa, Catarina de Aragão. Em 1533, quando seu pai decidiu anular o casamento com sua mãe para se casar com Ana Bolena, ela foi declarada como filha ilegítima do rei e excluída da linha de sucessão, sendo substituída por sua meia-irmã, Isabel.
Daí se entende porque no filme ela está sorrindo após a morte do pai.
Maria poderia pensar assim sobre o pai: o que mais odeio nele é que não consigo odiá-lo
Neta da avó
Uma conversa marcante na vida de Sophia aconteceu com a avó.
Avó: Filha está na hora de você casar e parar com esta orgia que é tua vida. Vida boêmia tem tempo finito.
A neta: Por que casar, vó?
Avó: Porque é hora de decidir, mudar de vida.
A neta: E o amor?
Avó: Deixa te dar um conselho. Arranja um marido que te dê conforto e
talvez, com sorte seja um amigo. Então se insistir nesta necessidade de amor
você encontra isto fora do teu casamento
A neta: Mas aí se eu casasse, seria infiel.
Avó: Ai my God, muito comovente!
Na época Sophia achou a conversa com a avó uma cretinice. Que velha
safada!
Sophia terminou o curso de graduação. Logo depois casou-se com um psicólogo.
Colega de curso na universidade.
... e seguiu o conselho da avó nos mínimos detalhes. C'est la vie. You never can tell.
No diário da Sophia
está assim: o que mais odeio nela, a avó, é que não consigo odiá-la
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