terça-feira, 27 de outubro de 2020

EaD e a qualidade no Ensino Superior

Concentração no ensino superior a distância é prejudicial para a qualidade, diz estudo

Por Antônio Gois, 26/10/2020

O Brasil tem apenas 21% de sua população de 25 a 34 anos com ensino superior, menos da metade do percentual de 44% registrado na média dos países da OCDE. Precisamos, portanto, ainda expandir muito o sistema. Mas os dados do Censo da Educação Superior de 2019, divulgados pelo MEC na sexta-feira passada, revelam que, desde 2015, o número de concluintes está estagnado próximo de 1,2 milhão de alunos. Além disso, as matrículas hoje só crescem por causa da expansão da educação a distância (EaD) no setor privado. Um estudo do pesquisador Carlos Eduardo Bielschowsky, publicado na Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, traz um alerta preocupante sobre esse cenário.

 

Numero de concluintes no ensino superior | MEC/Inep; Censo da Educação Superior

Bielschowsky identificou que dez grandes grupos eram responsáveis por 48% das matrículas no setor privado em 2018. Se forem consideradas apenas as matrículas na educação a distância, essa proporção aumenta para 82%. Antes de a EaD começar a crescer, uma concentração desse nível era muito mais difícil. A legislação dificultava a atuação de universidades fora de sua sede e os investimentos para manter um curso superior presencial funcionando em outro Estado eram muito maiores. A EaD diminui significativamente essas limitações, facilitando a expansão de grandes grupos privados, com maior capacidade de investimento.

 

TENDÊNCIAS DE PRECARIZAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO NO BRASIL | Carlos Eduardo Bielschowsky

O principal atrativo dos cursos a distância são seus custos menores. Um dado apresentado na coletiva do MEC trouxe um exemplo disso. Em 2019, a maior instituição de ensino superior, em número de matrículas em cursos EaD, foi a Universidade Pitágoras Unopar, com 363.584 alunos, seguido do Centro Universitário Leonardo da Vinci (281.712) e da Universidade Paulista (243.103). As duas primeiras instituições têm mais de 97% de suas matrículas em cursos a distância. No caso da Pitágoras Unopar, o Censo registra que ela possui 786 docentes, o que dá uma relação de 478 alunos por professor. No centro Leonardo da Vinci, (com 262 docentes), essa média é ainda maior: 1.079 matrículas por professor. A Unip tem uma distribuição de alunos a distância (234 mil) e presencial (214 mil) mais equilibrada, e um número maior de docentes (5.812) em relação às demais. Com isso, sua relação total de alunos por professor fica em 77. 

Tabela apresentada pelo MEC em coletiva de imprensa | MEC/Inep; Censo da Educação Superior

Se esses movimentos estivessem melhorando a qualidade do sistema, poderíamos ficar menos preocupados. Mas, de acordo com o estudo de Bielschowsky, não é isso o que está acontecendo. Ao analisar os resultados do Enade (exame aplicado a alunos do ensino superior), ele identificou que 49% dos alunos dos 10 maiores grandes grupos privados estavam matriculados em cursos com conceito insuficiente. No total das demais instituições privadas, essa proporção cai para 36%. Nas universidades públicas, é de 16%.   

 

TENDÊNCIAS DE PRECARIZAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR PRIVADO NO BRASIL | Carlos Eduardo Bielschowsky

A expansão na modalidade a distância concentrada em poucos grupos privados traz também outra preocupação: pelos dados analisados por Bielshowsky, 56% dos alunos dos grandes grupos estavam desligados ou com matrícula trancada após dois anos de curso. Na média das demais instituições privadas, esse percentual cai para 38%. Nas públicas, fica em 30%.

Um país de dimensões continentais como o Brasil não pode abrir mão da modalidade a distância para expandir seu sistema de ensino superior. Mas é preocupante que isso esteja acontecendo com ainda mais prejuízos à qualidade e eficiência do sistema. 


EM TEMPO

Na contramão da qualificação do ensino, o MEC encaminhou a PORTARIA Nº 434, DE 22 DE OUTUBRO DE 2020 com o fim de "... subsidiar a discussão, a elaboração e a apresentação de estratégias para a ampliação da oferta dos cursos de nível superior, na modalidade de educação a distância - EaD, nas universidades federais."

Obscurantismo? Não. É a privatização, de qualidade questionável, mais acelerada do Ensino Superior no Brasil.

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O debate selvagem: ensino presencial ou EaD 

O ensino a distância na Educação Básica e a Invasão dos bárbaros 

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