sábado, 27 de junho de 2020

O debate selvagem: ensino presencial ou EaD

A discussão contemporânea: ensino presencial versus ensino a distância.

O Prof. Dermeval Saviani esteve numa live promovida pela Adufes Ssind em 29/05/2020 e discorreu sobre ensino presencial e ensino a distância (no interval de 28 a 50 minutos). Na sua brilhante explanação citou "Victor de l'Aveyron", o menino selvagem, de Jean Itard.

Do ponto de vista pedagógico Saviani explica a passagem do selvagem afeito às coisas materiais para, com a educação, às coisas imateriais. Mais tarde ele associa a dictomia entre o ensino a distância (coisas materiais) e o ensino presencial (coisas imateriais).

Não li o trabalho de Jean Itard, mas revi o filme "L'enfant sauvage", 1970, de François Truffaut. Sinopse do filme: Cantão de São Sernin, França, 1798. Três caçadores acham uma criança, com 11 ou 12 anos, que nunca teve contato com a civilização. Ele é apelidado de Selvagem de Aveyron, pois se alimenta de grãos e raízes, não anda como um bípede nem fala, lê ou escreve. O professor Jean Itard se interessa pelo menino, que é levado a Paris para determinar seu grau de inteligência e ver como se comporta. O estudioso começa a educá-lo. Todos pensam que irá fracassar, mas com amor e paciência aos poucos obtém resultados.

Segundo Yuri Correa Truffaut se espelha em Victor (o menino selvagem).  "Um jovem rejeitado que se torna rebelde quando obrigado a seguir padrões pré-estabelecidos? É fácil substituir Victor por François e Itard por André Bazin – pensador que o adotou na carreira e literalmente em certo momento. Truffaut interpretando a figura paterna é ainda mais curioso, uma vez que nessa posição assume as expectativas que tinha com a própria paternidade. Sem dúvidas, nível bastante pessoal."

A abordagem didático pedagógica do professor Itard é comportamentalista e consegue alguns resultados. Mas também o que fazer? Em 1798 ainda não existiam Paulo Freire, Vygotsky e Piaget. Em tempo: ainda hoje, 2020, no Brasil, existem muitos docentes adeptos e adeptas do comportamentalismo ou behaviorismo nos Ensino Básico e Superior.

L'enfant sauvage tem aspectos comuns com o filme seminal O milagre de Anne Sullivan (The Miracle Worker), 1962, de Arthur Penn. A incansável tarefa de Anne Sullivan (Anne Bancroft), uma professora, ao tentar fazer com que Helen Keller (Patty Duke), uma garota surdo - cega, se adapte e entenda (pelo menos em parte) as coisas que a cercam. Para isto entra em confronto com os pais da menina, que sempre sentiram pena da filha e a mimaram, sem nunca terem lhe ensinado algo nem lhe tratado como qualquer criança.

Para Dermeval Saviani um vídeo, um livro ou um documentário complementam a aprendizagem, mas sozinhos não são suficientes ao processo educacional de formação.

A transposição de coisas materiais para coisas imateriais é realizada através de vínculos presenciais. E os vínculos não são apenas entre educador e educando, como diria Paulo Freire, são vínculos também entre estudantes.

O que seria de Victor e Helen Keller sem estes vínculos?

Um comentário:

  1. Amigo, excelentes conexões, como falei eu lembrei do Kaspar Hauser. Educação só tem sentido se for para ampliar a alteridade. Evidente que a escola presencial pe racista, machista e homofóbica, mas é neste espaço que estas tensões e conflitos nos deslocam. O Michel Serres fala que nada aprende aquele que não se desloca. E preciso ser perturbado pelo outro para me deslocar e isso se vai num sorriso, numa cara feia, numa dobra de perna, num sai de sala irritado, num olho marejado de emoção. Com EAD como um docente pode captar essa vibração? A vibração dos humanos inquietados? Esse foi um dos maiores presentes no meu trabalho docente, quando eu prescrutava essa inquietação, quando eu via a vida pulsar.

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