Sou o que sou graças ao cinema e à literatura. Desde os quatorze anos vivo nesta dialética entre ficção e realidade. E daí a cultura, a arte e a vida.
Uma amostra desta vida.
The sun at midnight, 2016 de Kristen Carthew
Serenity (Calmaria), 2019, Steven Knight
Ash is Purest White (Amor até as cinzas), 2018, Jia Zhangke
Shoplifters (Assunto de família), 2018, Hirokazu Kore-eda
Border (Fronteira), 2018, Ali Abbasi
A moment in the reeds, (Amor entre os juncos), 2018, Mikko Makela
The Shack (A Cabana), 2017, Stuart Hazeldine
Stan and Ollie, 2018, Jon S. Baird
Double Indemnity (Pacto de sangue), 1939, Billy Wilder
Capharnaum.2018, Nadine Labaki
Am zin (Jogo da vingança), 2002, Johnnie To
The Deadly Companions (O homem que eu devia odiar), 1961, Sam Peckinpah
The Osterman Weekend (O casal Osterman), 1983, Sam Peckinpah
The ABC murders, 2018, minissérie, Alex Gabassi
Azumi, 2003, Ryûhei Kitamura a partir de um mangá de Yû Koyama
Azumi 2: death or love, 2005, Director: Shûsuke Kaneko a partir de Yû Koyama (mangá)
Ying (Shadow), 2018, Yimou Zhang
Mi obra maestra (Minha obra-prima), 2018, Gastón Duprat
14/02/19
The sun at midnight, 2016 de Kristen Carthew
Em pauta o ambiente e as populações nativas e suas contradições com o urbano.
19/02/19
Serenity (Calmaria), 2019, Steven Knight
Bom filme com Matthew McConaughey ; bem quando num bom roteiro.
11/03/19
Ash is Purest White (Amor até as cinzas), 2018, Jia Zhangke
10/03/19
Shoplifters (Assunto de família), 2018, Hirokazu Kore-eda
À primeira vista, eles parecem uma família tradicional. A avó, o pai, a mãe, os filhos. Mas não demora muito para descobrirmos que o núcleo familiar de Shoplifters foi composto pelo acaso: uma ex-prostituta se juntou com seu cliente, recolheu uma criança abandonada, roubou outra da casa onde sofria violência. Eles escondem alguns segredos ainda mais graves na origem dos laços que os conectam. Mas no dia a dia, se amam, se cuidam, fazem as refeições juntos.
Ao longo de toda a sua carreira, o diretor japonês Hirokazu Kore-eda se especializou em histórias de família, privilegiando os laços afetivos àqueles de sangue. De certo modo, o novo filme cristaliza essa noção, optando pela falta de julgamentos morais e demonstrando grande ternura por cada personagem. Eles roubam lojas para viver e se orgulham da própria esperteza, mas para a narrativa, o que importa é o afeto que são capazes de demonstrar um pelo outro. Sabemos que eventualmente a realidade terá que invadir este núcleo eletivo, mas os melhores momentos do filme se encontram no idílio do grupo. É quando a câmera se torna mais livre, a fotografia encontra seus melhores ângulos, efetuando melhor trabalho com luz natural, e quando o ambiente sonoro se torna mais complexo.
13/03/2019
Border (Fronteira), 2018, Ali Abbasi
Todo grande festival de cinema tem entre seus competidores algum filme estranhíssimo, inclassificável, do tipo que desperta amores ou rejeições, mas dificilmente deixa o espectador indiferente. Talvez o sueco Gräns (Border, em inglês) seja o exemplar em questão no 71º festival de Cannes. Mistura de drama, comédia, suspense e fantasia; fábula sobre o preconceito racial, sobre a degradação do ser humano e sobre a pluralidade sexual e de gênero, ele possui tantos temas e vertentes que chega a ser incrível a sua capacidade em equilibrá-los com tamanha maestria.
Parte considerável da força deste projeto se encontra num rosto, o de Tina, mulher de rosto singular. Com a testa protuberante, os olhos profundos, a pele marcada por cicatrizes e a arcada da boca sempre aberta, ela se encontra no meio termo entre a deficiência, a deformidade e uma noção mais ampla de monstruosidade. No entanto, apesar da aparência prejudicar a sua vida afetiva, ela possui um talento muito útil ao trabalho. Afinal, esta policial de um aeroporto possui um senso de odor extremamente refinado, podendo cheirar não apenas álcool e droga nas malas, mas também culpa, raiva, ressentimento dos passageiros. Quando você faz algo errado, Tina percebe pelo cheiro.
Esta personagem de aptidões excepcionais é tratada com respeito invejável pelo diretor de origem iraniana Ali Abbasi, e também pela excelente atriz Eva Melander, devidamente contida na intenção de evitar o grotesco. O mesmo ocorre com Vore (Eero Milonoff), homem encontrado por ela no aeroporto, e dotado de uma deformidade estranhamente parecida com a sua. Muitos roteiristas se contentariam em sugerir um romance entre ambos e garantir o final feliz, mas Gräns foge a soluções fáceis. No estranho relacionamento entre os dois humanos-monstros, o filme encontra espaço para detalhar o folclore nórdico, expor redes de pedofilia e encontrar representações alternativas para alienígenas e lobisomens.
O projeto fascina pela originalidade radical, mesmo partindo de códigos tão conhecidos. Além disso, funciona como história de origem de uma super-heroína, no caso, esta mulher com capacidade sobre-humana de avaliação pelos cheiros. Cada detalhe é cuidadosamente abordado pela fotografia realista, pelos enquadramentos atentivos mas jamais óbvios, pela direção de arte precisa na decoração e nos figurinos. A fascinação de Tina e Vore por insetos, a conexão de ambos com a natureza de modo geral, são elementos muito bem trabalhados no decorrer da trama. Nenhum símbolo de estranhamento fica sem a devida utilização até o final.
Por sua mistura de gêneros e pela premissa quase cômica, Gräns pode ser um projeto difícil de apresentar ao público. Os fãs de terror verão um ritmo mais cadenciado do que a média do gênero, além de pouco sangue e violência, enquanto cinéfilos atentos aos dramas estrangeiros podem ficar chocados com as atitudes explícitas dos protagonistas. O diretor criou um filme para confundir, perturbar, como talvez sejam todos os grandes filmes. Resta saber se existe espaço para a entrega ao desconhecido no pragmático circuito distribuidor.
Bruno Carmelo,
13/03/19
A moment in the reeds, (Amor entre os juncos), 2018, Mikko Makela
Tendo se mudado para Paris para a universidade, Leevi retorna a sua terra natal, a Finlândia, para o verão, para ajudar seu pai a renovar a casa do lago da família para que ela possa ser vendida. Tareq, um solicitante de asilo recente da Síria, foi contratado para ajudar com o trabalho, e quando o pai de Leevi tem que retornar à cidade a negócios, os dois jovens estabelecem uma conexão e passam alguns dias se descobrindo durante o verão finlandês.
Filme da Finlândia que pode ser resumido numa palavra: sensibilidade.
18/03/19
The Shack (A Cabana), 2017, Stuart Hazeldine
Publicado pelo autor William P. Young em 2007, o livro A Cabana rapidamente se tornou um best-seller - já são ao menos 18 milhões de exemplares vendidos, até a conclusão deste texto. Não é difícil entender o porquê: sua história edificante e serena, apoiada em preceitos religiosos, serve como auto-ajuda em momentos de expiação, de dor e de culpa. Diante de tais características, e tamanho sucesso, chega a ser surpreendente que sua versão cinematográfica tenha levado uma década para enfim acontecer, até mesmo pela simplicidade de sua história e dos recursos necessários para que seja apresentada. Foi apenas com o recente boom de filmes cristãos em Hollywood, dos quais os expoentes maiores são os terríveis Deus Não Está Morto e O Céu é de Verdade, que a adaptação enfim foi autorizada.
18/03/19
Stan and Ollie, 2018, Jon S. Baird
O Gordo e o Magro já no fim de carreira. Bela homenagem.
20/03/19
Double Indemnity (Pacto de sangue), 1939, Billy Wilder
Um clássico do filme noir. Imperdível. Já vi várias vezes.
26/03/19
Capharnaum.2018, Nadine Labaki
Felizmente, o filme conta com protagonista excepcional. Zain Al Rafeea é uma criança de gestos fortes, grande desenvoltura diante das câmeras, capaz de interpretar planos ininterruptos com longos diálogos e conduzir momentos de explosão emocional com facilidade. Ele consegue falar tanto com sotaque libanês quando sírio. A diretora Nadine Labaki confia muito no ator, em quem aproxima a câmera durante a grande maioria das cenas. Como o mundo é visto pelos olhos da criança, precisamos confiar nas atitudes impulsivas de Zain. Al Rafeea não tem dificuldade em desempenhar esta tarefa. Os aspectos técnicos contribuem bastante ao resultado. A montagem, em especial, opta por planos curtos e muito bem entrelaçados, reforçando a dinâmica desta bagunça (significado da palavra “capharnaum”) e impedindo o melodrama intenso – ao menos durante boa parte da trama. Quando alguma notícia ruim chega ao pequeno Zain, a montagem corta imediatamente, busca os olhares das ruas, o barulho dos carros, de outras pessoas gritando, dos bebês chorando. O universo bruto é bem desenvolvido pelo ritmo ágil da câmera e pela fotografia bem desenhada, trabalhando os raios de sol enquanto a câmera na mão só treme exageradamente nos momentos de desespero (fuga, perseguição). Para inserir a pobreza de Zain num contexto mais amplo, drones se elevam às alturas, revelando que para todos os lados, o garoto encontrará as mesmas dificuldades.
Diante de uma obra tão bem orquestrada tecnicamente e narrativamente, apenas a visão de mundo incomoda. Capharnaum é um ótimo drama de personagens, oferecendo uma eficaz constatação da miséria, no melhor estilo cinema-verdade. No entanto, limita-se à observação crua dos problemas. Em momento algum o filme busca entender de onde vêm os conflitos, com que esferas institucionais se relacionam, de que maneira poderiam se desenvolver. Os ricos não existem neste mundo de miseráveis, composto por crianças famintas, bebês abandonados, refugiados escapando da polícia e pequenos comerciantes praticando tráfico de pessoas. O olhar poderia ser taxado de conformista. Ele busca a evidente sensibilização do público, mas caso este realmente se engaje com as trajetórias humanas em tela, o que fazer com este sentimento de revolta?
A narrativa condensa seus conflitos num último terço fortemente sentimental. As lágrimas evitadas até então correm soltas no rosto da maior parte dos personagens, a trilha sonora de pianos e violinos invade as cenas, as câmeras lentas reforçam a dor de uma mãe no meio da rua, a promessa de tragédia se concretiza. Dentro do cinema, muitas pessoas estavam em lágrimas – e como não estar? Capharnaum apela aos sentimentos, à empatia humana, a uma espécie de olhar exótico a uma realidade distante do público médio do cinema, a quem o filme estende a mão. No final, o espectador tem a catarse prometida, sai de “alma lavada”, como diria o conhecimento popular, e com a consciência tranquila por ter compartilhado durante duas horas o drama daquelas pessoas. Enquanto projeto político, no entanto, o discurso é retórico: ele apela a bons sentimentos, à evidência da alteridade. Depois, fecha-se em si mesmo, não aponta horizonte algum. Bruno Carmelo
Sobre o filme: irritantemente revoltante e belo.
28/03/19
Am zin (Jogo da vingança), 2002, Johnnie To
Inspetor de polícia e excelente negociador de reféns, Ho Sheung-Sang, encontra-se envolvido num jogo de 72 horas por um criminoso sofrendo de câncer numa a vingança sobre o crime organizado de Hong Kong Syndicates.
Johnnie To é um dos melhores em filmes de ação. Show de bola.
29/03/19
The Deadly Companions (O homem que eu devia odiar), 1961, Sam Peckinpah
Um ex-oficial do Exército acidentalmente mata o filho de uma mulher e tenta compensar isso acompanhando a procissão fúnebre através do perigoso território indiano.
Sam Peckinpah é uma referência. Não existe cinema sem Sam.
29/03/19
The Osterman Weekend (O casal Osterman), 1983, Sam Peckinpah
Último filme de Sam Peckinpah. A invasão de privacidade e o controle “Big Brothers” vindo da TV. Profético.
30/03/19
The ABC murders, 2018, minissérie, Alex Gabassi
O icônico detetive criado por Agatha Christie, Hercule Poirot (John Malkovich), investiga um inimigo mais inteligente e desafiador do que ele jamais imaginou. Em uma Inglaterra da década de 1930 cada vez mais dividida, um assassino em série conhecido apenas como A.B.C. assola a população. Em cada cena do crime a única pista deixada é um guia de trens popular na Inglaterra de título "ABC".
John Malkovich na tela
01/04/19
Azumi, 2003, Ryûhei Kitamura a partir de um mangá de Yû Koyama
Azumi 2: death or love, 2005, Director: Shûsuke Kaneko a partir de Yû Koyama (mangá)
01/04/19
Ying (Shadow), 2018, Yimou Zhang
Em destaque a estética Yimou Zhang
05/04/2019
Mi obra maestra (Minha obra-prima), 2018, Gastón Duprat
Pense naquele dia em que você se deparou com uma exposição de arte contemporânea onde não conhecia ninguém, não entendia o propósito da obra, não via valor algum naqueles quadros ou esculturas e ficou horrorizado com o valor extravagante de cada peça. O abismo que separa o mundo elitista da arte e o público médio constitui o alvo de Minha Obra-Prima, comédia sobre pintores fracassados, mecenas ignorantes, agentes sem escrúpulos, consumidores ricos e fúteis. Ninguém escapa ao humor corrosivo que satiriza tanto a direita vaidosa quanto à esquerda utópica.
No centro da trama se encontram dois produtores cínicos de arte: por um lado, o pintor Renzo Nervi (Luis Brandoni), que afirma fazer “algo inútil que não interessa a ninguém”, e por outro lado, o negociante Arturo Silva (Guillermo Francella), capaz de rasgar elogios a obras de que não gosta, mas que podem lhe render lucros. Um deles se encontra fora do circuito, por ter suas pinturas rejeitadas pela maior parte das galerias, enquanto o outro representa a adesão perfeita ao mainstream. Eles têm em comum o fato de serem personagens interpretando personagens: o artista nutre sua persona exótica e arrogante, como convém ao imaginário do pintor genial, enquanto o agente de vendas ostenta os trejeitos do homem de negócios, necessários para movimentar os milhões de dólares necessários.
...
Esteticamente, Minha Obra-Prima revela uma confecção discreta, porém eficaz. O diretor transparece um cuidado evidente na hora de enquadrar obras de arte, ao passo que oferece uma movimentação de câmera mais livre nas cenas de briga. Exceto por estes momentos, rende-se à dinâmica dos atores principais e dos diálogos, em planos de conjunto simples. O discurso pode não produzir nenhum questionamento profundo sobre a produção de valores dentro do circuito artístico, mas serve para sublinhar as máscaras sociais até o limite do ridículo. Ao enxergar artistas como figuras cínicas, Duprat retira da criação sua aura romântica, aproximando-a do trabalho mesquinho e massificado de qualquer empresa com fins lucrativos. Somos convidados a nos identificar com pintores e mecenas não pelo que têm de melhor, mas pelo que carregam de pior.
Bruno C.
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