quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Asfixia

 
Ito: não entendi muito bem à tua pergunta, mas serei o mais claro contigo. Tenho uma libido avantajada desde adolescente. Sexo pra mim é um vício.

Teresinha: como sou na cama? Uma puta. Pergunte para meu marido. E não sou como a Joe do filme Nymphomaniac. Às vezes tenho orgasmos múltiplos.

Ito: Ela tem razão, mas penso que Teresinha tem sim um quê de Joe. Insatisfeita sempre. Mas eu gosto dela assim mesmo porque tenho por ela uma imensa paixão.

Teresinha: já sei o que você perguntou. Sou muito feliz, muito mesmo! Tenho um casamento ótimo. Tenho uma paixão desmedida pelo meu marido. Ele é um virtuose do sexo, bom no trabalho e pai amoroso. Temos dois filhos maravilhosos, uma casa e um carro do ano exclusivamente para meu uso.

Sérgio: você me pergunta se os conheço? De há muito tempo. São malucos adoráveis. A Teresinha é muito bonita. Sempre agitada e falante. Conversa sobre tudo. Ito é mais calmo. Adora vinho. Gostaria de ter um casamento como o deles. Um exemplo de casal feliz.

Myrtis: Teresinha? Conheço-a muito bem. Exemplar mãe de família, profissional bem-sucedida, culta e sadia. Frequentadora contumaz de academia de ginástica. E digo mais, foi a primeira mulher que me ensinou tudinho sobre f-e-l-a-ç-ã-o.

Estes depoimentos foram dados quando Teresinha e Ito tinham quatro anos de casados. Estavam nas mil flores do paraíso. Nesta época ela tinha devorado avidamente a trilogia Cinquenta tons: de cinza, mais escuro, de liberdade. E ele se tornou um especialista em sexo pela internet. O que esperar de um viciado?

Os três anos seguintes foram de mais calmaria. A reafirmação da felicidade e do amor por amor estiveram presentes até sentirem-se uma certa asfixia.

Vivemos uma mistura de romantismo agudo e consumismo sexual exacerbado, uma era em que amamos a ideia do amor acima de tudo. Cobra-se que a mulher seja uma amante ensandecida e exemplar mãe de família e o homem deve ser igualmente um vulcão na cama e pai exemplar. É óbvio que isso conduz a um esgotamento, porque o amor é submetido ao regime da performance. (Pascal Brukner)

Mas posso caminhar outra trilha? Seven year itch.

Pode ser como a coceira dos sete anos. Depois de sete anos de relacionamento alguns parceiros ou parceiras, devido à asfixia (ou tédio) passam a ter saudades da solteirice.

Seven year itch é o título de um filme dirigido por Billy Wilder (1955). No Brasil como título O pecado mora ao lado. Neste filme o pecado que mora ao lado chama-se Marilyn Monroe.

O pecado pertinho do Ito chama-se Myrtis. Sem muito pensar os dois passaram da amizade para uma paixão insurgente.

Teresinha soube, mas não se descabelou. Ela já pensava na infidelidade estimulante e naquele momento considerava sua relação com Ito semelhante a dois peixes dourados presos num aquário. Resolveu também capturar alguns pecados próximos. Sérgio que o diga.

E a família Teresinha – Ito? Continua. Os filhos, o carro do ano e o sexo na internet.

Evitaram a tumba matrimonial.


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Sobre Pascal Brukner:

O primado da angústia: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrissima/190212-o-primado-da-angustia.shtml  13/10/2014

Lua de fel (Bitter Moon), 1992, filme dirigido por Roman Polanski



 




 

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