segunda-feira, 14 de julho de 2014

O cinema versus IA


Prólogo


Antes de qualquer coisa uma explicação. O que é IA (Inteligência Artificial)?

Algumas definições na literatura sobre:

"IA é a parte da ciência da computação que se preocupa em desenvolver sistemas computacionais inteligentes, isto é, sistemas que exibem características, as quais nós associamos com a inteligência no comportamento humano - por exemplo, compreensão da linguagem, aprendizado, raciocínio, resolução de problemas, etc." Barr & Feigenbaum (1981)

"Inteligência Artificial é o estudo das computações que tornam possível perceber, raciocinar e agir." Winston (1992)

"IA é a arte de criar máquinas que executam funções que requerem inteligência quando executadas por pessoas." Kurzweil (1990)

Estas definições estão em "Fundamentos da inteligência artificial", Paulo Santos, 2006 (fei.edu. br/~psantos/slidesIA/CAP1_intro.ppt) 10/07/2014


IA no cinema


Vamos restringir a conversa a dois filmes: 2001 uma odisseia no espaço de 1968 e Transcendence – a revolução de 2014.

Stanley Kubrick e Arthur C. Clark são os responsáveis pelo filme 2001 uma odisseia no espaço de 1968. Estão lá temas como exploração do espaço, inteligência artificial, naves e estações interplanetárias e a existência ou não de outros seres na via láctea. E, importante, a interferência das tecnologias na evolução dos seres humanos.
Kubrick tem uma obra cinematográfica com marcas no antibélico e no pessimismo em relação à humanidade e seu futuro. Os 20 minutos iniciais do filme mostram a evolução de uma comunidade de macacos desde seu início como herbívoros até os hábitos carnívoros e a descoberta das armas (ossos de animais abatidos) que utilizam em defesa de seus territórios. A cena clássica do filme consiste num macaco lançando no espaço um osso que se transforma numa nave interplanetária.

A nave é controlada por um computador de nome Hal (Heuristically programmed ALgorithmic computer). Os astronautas dialogam em viva voz com Hal o tempo todo. Num certo momento da estória tem início os conflitos da tripulação com a máquina. Hal é desligado após a morte de um astronauta devido a sua influência. A máquina nasce, vive e morre como os seres vivos.
HAL é o computador consciente, eficiente, brilhante, dedicado, solidário, paranoico e assassino. Para Kubrick, é a culminação e o emblema de toda a época da tecnologia humana e suas falhas são as de seus criadores (James Berger, Helen Keller: a história da minha vida, Jose Olympio, 2008).

O vilão do filme é Hal, se é que se pode falar em vilão nos filmes de Kubrick. Será profecia? Pelo sim pelo não o belo e clássico filme de Kubrick deixa a interrogação: o que será, no futuro, a relação homem - máquina?

Transcendence, a revolução de Wally Pfister, 2014 é um filme com um bom argumento, mas tem um desenvolvimento (roteiro) a desejar.

A estória: Will Caster (Johnny Depp) é um pesquisador de IA que trabalha na construção de uma máquina consciente onde informações sobre conteúdo e emoção humana se correlacionam. Will com a palavra numa conferência:
O intelecto combinado dos neurocientistas, engenheiros, matemáticos e hackers desse auditório estão muito longe da mais básica IA. Quando funcionar, a máquina em questão irá rapidamente superar os limites da biologia. E em pouco tempo, seu poder analítico será maior que a inteligência coletiva de cada pessoa nascida na história do mundo. Agora imaginem tal entidade com toda gama da emoção humana, até com a autoconsciência. A jornada para a construção de tal superinteligência requer que desvendemos os segredos mais fundamentais do universo. Qual é a natureza da consciência? A alma existe? Se sim, onde reside?
Alguém da plateia pergunta:

Professor? Então você quer criar um Deus? O seu próprio Deus?
A resposta de Will: É uma ótima pergunta. Não é isso o que o homem sempre tem feito?

No dia da conferência acontecem vários atentados e alguns centros de pesquisa em IA são destruídos. A autoria destes atentados é de responsabilidade de um grupo neo-ludita liderados por Bree Nevins (Kate Mara) ex-aluna de ciência da computação, em 2010, do instituto de pesquisa onde trabalha Will.

Em tempo: o ludismo foi um movimento (anarquista) contra a mecanização do trabalho proporcionada pelo advento da revolução industrial no inicio dos 1800. Não à substituição da mão de obra humana pelas máquinas. Os luditas são lembrados como "quebradores de máquinas". Para o historiador Eric J. Hobsbawn o ludismo "era uma mera técnica de sindicalismo de operários no período que precedeu a revolução industrial e a organização operária". O neo-ludita (neo-Luddite), hoje, seria um combatente contra a disseminação exacerbada das novas tecnologias, principalmente a telemática. Militância anti-tecnologia.

De volta ao filme. Will Caster sofre um atentado mortal. E quem é o autor dos tiros a queima-roupa? O perguntador na conferência (Professor? Então você quer criar um Deus?). Antes de morrer Will pede à dedicada esposa Evelyn Carter (Rebeca Hall), também pesquisadora em IA, que transfira o que ele tem no cérebro para um computador. Ela faz o transplante com sucesso. Ai o bicho pega. O Will Carter virtual torna-se o Deus e o Diabo na terra ianque. A partir daí o filme fica roliúde como o Diabo gosta. Para acabar com o Will virtual até a união dos neo-luditas com o FBI e exército estadunidenses acontece.


Resumo da ópera


O cinema e IA não se bicam. E o primeiro tem posições conservadoras em relação à segunda? Si, pero no mucho. A questão é: a quem serve as pesquisas em IA? A quem serve as novas tecnologias? Para fabricar os drones do Obama e lançar bombas que assassinam civis (inclusive crianças) no Afeganistão? Para fabricar mísseis inteligentes israelenses que assassinam civis (inclusive crianças) na faixa de Gaza? Se for só para isto, pontos para os neo-luditas.

Mas não é assim. A visão maniqueísta não serve neste caso. Roliúde procura sempre o vilão e o mocinho. Evelyn Carter antes de ser abduzida pelo marido virtual disse na conferência acima citada: A efetividade de desenvolver uma inteligência artificial levou a um avanço significativo no campo da neuroengenharia, assim como no estudo do cérebro humano. Embora alguns foquem no ainda distante sonho de um computador pensante, eu acredito que a jornada é mais importante que o destino final. Minha prioridade é usar as percepções acidentais de meus colegas para criar novos métodos de descoberta precoce do câncer, e desenvolvermos uma cura para Alzheimer. Resumindo, para salvar vidas. Um novo modo de pensamento é essencial, se humanidade quer sobreviver e avançar a níveis superiores. Albert Einstein disse isso há mais de 50 anos. E não poderia ser mais relevante do que é hoje. Máquinas inteligentes nos permitirão em breve conquistar os nossos desafios mais difíceis.

Tudo bem IA pode servir a que a mocinha Evelyn se propunha na época. Ela citou Einstein. Ele participou do projeto Manhattan da bomba atômica que dizimou mais de 200 mil japoneses.

Estou mais com o pessimismo de Kubrick.

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