quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Desvinculação amorosa

Alba Lívia é filha de Alma. Alma é esposa de Tobias. Juntos tiveram quatro filhos bem criados e educados. Não diria que Alma seja uma matriarca, mas o matriarcado sempre rondou pela sua família. A mãe de pulso forte, a mulher que não tem muitas dúvidas e sabe aonde quer chegar.

Alba hoje tem uma vida estável. Claro, circunscrita às fronteiras freudianas do que seja estável. Trabalha muito, mas penso que já nasceu agitada. Não diria com o diabo no corpo. Diria o corpo a serviço da cabecinha endiabrada. Alfredo que o diga.

Alfredo é o namorado de Alba. Gosta muito dela e a compreende. Ele pensa assim: se eu não entender a cabeça desta mulher e não aceitar 90% do que ela pensa não consigo ficar com ela. É um caso de amor destrambelhado. Um condenado.

A relação Alba-Alfredo estava em crise. Já não estavam se entendo. Será que era a desvinculação amorosa? Este palavrão é o que intelectuais respondem por separação. O sonho acabou. A casa caiu, mas Alfredo não desistiu.

Pediu socorro para Alma. Quem sabe a mãe ajudaria. Foi lá na casa de Alma e foi recebido por Tobias. Na sala o pai esta tomando uma cachaça.

- Vem cá, Alfredo, toma umazinha comigo. Esta é da boa.

E emendou

- Alma está tomando banho. Por isso que estou com este copo. Se me pega assim ela vai chutar o balde. Mas toma aí.

Quando Alma deu sinal de aparecer na sala Tobias correu para esconder a cachaça que tomava.

- Olá Alfredo, que surpresa! disse Alma.

- Sabe o que é Dona Alma, vim pedir ajuda, respondeu Alfredo.

- Minha relação com Alba não está nada agradável. Ultimamente ela anda muito agitada e mal humorada. Não sei se é o trabalho dela ou se tem a ver com nossa relação.

Conversaram mais um tempo até combinarem uma conversa a três na casa de Alba. No dia combinado Alfredo buscou Alma. Já no carro ela disse assim:

- Sabe Alfredo, quando mais nova eu resolveria este caso de outra forma. Alba sempre foi deste jeito: de uma teimosia difusa e calada. Às vezes eu resolvia com o chicote mesmo. Gosto muito dela, mas tem hora que me tira do sério.

Na casa de Alba a conversa se deu assim:

Alma: minha filha, o Alfredo me disse do que vocês dois estão passando. A versão dele. Agora gostaria de ouvir a tua.

Alba: gosto muito dele, mamãe. No início foi muito bom, mas com o tempo descobri diferenças entre nós.
 
Alfredo:diferenças, Alba? Você já refletiu no que se tornou nossa relação? Nem nos fins de semana está disponível. É só trabalho, trabalho e trabalho.

Alba: olha aqui, Alfredo, posso até concordar com você sobre isto, mas não vem dar uma de santo não.

Alfredo: como assim?

Alba (nervosa): cê tá pensando que não percebo quando toca o teu celular. Você se afasta de mim para conversar. E mais, já vi as chamadas recebidas. Diga-me quem são: Clara, Ana Elisa e Elizângela? No teu trabalho não conheço ninguém com estes nomes. De anjo você não tem nada, ô cafajeste!

E tempo esquentou. Alma no meio do tiroteio pensou: briga de casal e eu aqui fazendo o que, meu Deus?

Alma: meninos será que não dá para discutirem com menos baixaria? Alba tenha paciência com o Alfredo. Você sabe como são os homens.
 
Alba: sei como são os homens, mamãe, mas não sou besta não. E ademais tenho mais o que fazer na vida.

Alma saiu da reunião pessimista. Não foi a primeira separação da filha. Com um pouco de desapontamento deixou o caso para Deus resolver. Não tinha mais o poder de alterar o destino da filha.

Alba e Alfredo ficaram juntos por mais um mês. Um dia ela o traiu com outro rapaz que conhecia já de algum tempo. Arrependeu-se. A partir daí resolveu pela separação. Alfredo continua sem entender nada do que significa o sexo em sua vida.

Alba desvinculou aos poucos: foi retirando sua energia libidinal da relação que vivia com Alfredo e, com o passar do tempo, desistiu do objeto, declarando-o morto e oferecendo ao ego o incentivo de continuar vivendo (Ingrid Luiza F. Viégas).


Edson Pereira Cardoso, outubro de 2011

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