domingo, 3 de abril de 2016

Réquiem

 "O que você fez seu filho de uma égua? E agora o que será de mim? O que faço da minha vida, seu merda?" Chorando e puta da vida. Era Virgínia, perdida e terrivelmente irritada. Não sabia o que fazer.

Na década de 1960, Felipe e Virgínia eram estudantes na USP. Ele na engenharia civil e ela na psicologia. Encontraram-se e experimentaram o veneno da paixão. Êxtase brutal, selvagem. Tesão nas alturas, libido aos cântaros.

Moravam no CRUSP (Conjunto residencial estudantil da USP) que na época reunia todas as tribos: militantes políticos, positivistas que acreditavam que a ciência resolveria os problemas do mundo, porra-loucas, certinhos e certinhas, idiotas e outros mais.

O guerrilheiro é um reformador social. Virgínia e Felipe diante da droga malhada em que estava o Brasil da época (aliás, continua hoje) seguiu Che Guevara e entraram para a ALN (Ação Libertadora Nacional) de Carlos Marighella. Carlos, uma grande personagem da história brasileira, puto com o PCB (Partido Comunista Brasileiro), resolveu agir e não interagir de forma vertical e passiva no interior das catacumbas do partido. Partiu para a resistência armada à ditadura e fundou a ALN.

Felipe foi convocado a atuar no Rio e Virgínia em São Paulo. Separação. No começo doloroso, mas com agitação da luta distanciaram-se. A tempestade afetiva deu lugar ao terremoto político da ação armada. Felipe esteve preso e torturado com sequelas nunca dizimadas. Os dois saíram do país em 1970. Ele exilado no Chile e ela em Paris. Conheceram pares no exilio. Casaram e tiveram filhos.

Com a anistia Virgínia e Felipe voltaram ao Brasil em 1979 e 1980 respectivamente.

Em 1989 reencontram-se durante a campanha eleitoral de Lula da Silva. Caso raro: voltou a tesão um pelo outro. Voltaram a morar juntos. Eles e os filhos mais novos dos dois.

Passados 10 anos de união ou re-união veio a tragédia.


Virgínia inconsolável saiu para fumar e voltou. Olhou para o rosto de Felipe. "E agora, cacete, você quer que eu faça o que depois desta traição? Traição sim, mané, porque agora estou sozinha, sem ninguém"

Dez minutos depois de olhar fixamente o rosto daquele homem se retirou do velório chorando muito. Virgínia nunca perdoou Felipe pelo suicídio.

Um comentário: