A Volta do Pistoleiro, Amore, piombo e furore, 1978, Monte Hellman&Tony Brandt
A fera do Forte Bravo, Escape from Fort Bravo 1953, John Sturges
Oharu, a vida de uma cortesã, Saikaku ichidai onna, 1952, Kenji Mizoguchi
2001: Uma Odisséia no Espaço, 2001: A Space Odyssey, 1968, Stanley Kubrick
Solaris, Solyaris, 1972, Andrei Tarkovsky
Marte ataca! Mars Attacks!, 1996, Tim Burton (Max)
Pecadores, Sinners, 2025, Ryan Coogler (Max)
Território hostil, Hostile Territory, 2022, Brian Presley
Jogo da Vingança, Am zin, 1999, Johnnie To
Hipotermia, Patrick Leung, 1996
O anjo embriagado, Akira Kurosawa,1948
Amar e morrer, Douglas Sirk, 1958
A morte não manda recado, The ballad of Cable Hogue, Sam Peckinpah, 1970
Desafio radical, 2002, Christian Duguay
Mistérios e paixões, 1991, David Cronenberg
Amor maldito, Adélia Sampaio, 1984
Justiça de um bravo, The Jack Bull, Filme p/ TV, 1999, John Badham
Justiça cega, Blind Justice, Filme p/ TV, Richard Spence, 1994
Django, Sergio Corbucci, 1966
Caçadores de recompensas, Dead for a dollar, 2022, Walter Hill
Copenhagen, Filme TV, 2002, Howard Davies
Apocalipse nos trópicos, Apocalypse in the tropics, 2024, Petra Costa
02/07/25
A volta do pistoleiro, Amore, piombo e furore, 1978, Monte Hellman&Tony Brandt
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Amore, Piombo e Furore por Vinícius Lemarc
Amore, Piombo e Furore é um western que claramente se inscreve na categoria daqueles que já demonstravam a seu tempo o curso de uma assimilação da contribuição europeia ao gênero. Portanto, trata-se da contribuição para a redefinição de alguns dos parâmetros fundamentais do western, em favor de torná-lo, visualmente, e em seu argumento, uma terceira via, acrescendo-a - o que parece não ter sido ainda precisamente atestado pelos estudiosos - e criando o modelo atual, que, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, apresenta as mesmas características básicas. Filmado na Europa e envolvendo artistas do continente, podemos chamá-lo europeu, mas, o próprio diretor afirmou ter buscado mantê-lo ligado às premissas básicas do modelo clássico do western de linha americana.
Dotado de grande talento e de uma sensibilidade artística refinada, Monte Hellman produziu material que, mesmo recoberto por alguma sutileza, acrescentou algo em termos de concepção ao gênero. Hellman é daquele seleto grupo de diretores que pôde se dar ao luxo de realizar filmes interessantíssimos com minguadas moedas no alforje, a confirmar que é possível fazer arte sem dinheiro, porém, jamais sem talento.
Pouco mais de uma década após realizar Ride in the Whirlwind (1965) e The Shooting (1965), dois faroestes mal recebidos pelo grande público, e que ainda hoje reluta em perceber que o argumento de ambos os filmes se sustenta no drama psicológico vivido pelas personagens e no significado de seu deslocamento no espaço da ação, Hellman rumou para a Europa e filmou, quando o eurowestern já estava em pleno declínio, esta película, que, por força de usar as locações espanholas, pela parceria com a Itália e a consequente influência do modelo correspondente, é considerada parte do gênero peninsular. O filme foi feito com cuidado e dedicação, segundo palavras do próprio diretor, procurando alcançar uma textura narrativa de western americano, mas enriquecida com o tipo de realismo estético caro ao western europeu, e conferindo-lhe uma atmosfera lúgubre e um tanto claustrofóbica, a denunciar a ambiguidade de suas personagens centrais.
Para alcançar seu intento, Hellman foi um artífice muito eficiente, ao fazer escolhas, a meu ver, muito acertadas. Destaquem-se, entre essas, a impressão de um ritmo lento, contrário à maioria dos filmes western, especialmente europeus, e a opção por um roteiro que privilegiou as falas curtas, precisas e devidamente motivadas. Hellman foi ainda cuidadoso e poético ao construir cenas como a do banho matinal, quando Catherine observa Drumm como a um deus grego, a ninfa extasiada diante de Apolo, quase que pintando um quadro renascentista. Outro exemplo que podemos citar é a bucólica cena do almoço ao ar livre; enfim, sequências aparentemente desinteressadas, mas que cumprem um objetivo consciente, além de serem cheias de beleza e realmente capazes de prender o espectador.
Um dos objetivos dessas sequências parece ser o de dar autenticidade e conferir a identidade necessária do caráter e do modo de vida em um ambiente rústico, desolador, instaurando assim um tom existencialista que recobre toda a ação das personagens. Outro recurso utilizado pelo diretor foi a cuidadosa inserção de uma trilha sonora totalmente compatível com o objetivo de dar ao filme essa atmosfera desoladora, quase sempre distante de ter como objetivo criar algum tipo de função de cunho romântico ou mesmo retórico, embora se situe no exterior da ação narrativa. Para a missão, ele escalou o compositor italiano Pino Donnagio, que nos brindou com uma trilha das melhores no western.
A história de Amore, Piombo e Furore se inicia quando Clayton Drumm, um condenado à forca, consegue safar-se do impiedoso destino, mediante contrato para assassinar um ex-pistoleiro da companhia de trem, Mathew Sebanek, cujas terras são desejadas pelos ex-patrões.
Chegando ao rancho deste, Drumm é recebido pela cautela e pela mira atenta do rifle do experiente pistoleiro. Após desarmar o visitante, Sebanek permite que ele passe alguns dias consigo, enquanto supostamente se recupera da fadiga da viagem. Sebanek mora praticamente sozinho na imensidão do lugar, tendo como companhia a bela esposa, que é vários anos mais jovem que ele. Sebanek desconfia das intenções de Drumm em matá-lo, mas, ainda assim, trata-o com alguma cortesia, o que, por fim, conduzirá o pistoleiro ao abandono dos planos quanto ao futuro de seu anfitrião. Forma-se, portanto, um trio insólito, e o visitante termina por quebrar o equilíbrio existente até sua chegada. Catherine é peça chave no desenrolar da história. Ela lembra a anti-heroína de Flaubert, encarcerada que está em uma relação desprovida de encantos condizentes com sua energia juvenil. Assim, logo ela vê no viajante uma possibilidade de fuga de sua prisão sentimental e de autorrealização. Há no trato da questão uma clara abordagem naturalista por parte de Hellman.
Essa visão difere da visão imediatista de Catherine, que é mais romantizada, e, por que não dizer, pragmática. Essa abordagem do diretor pode ser claramente observada pela conduta de Catherine. Em todos os momentos do filme, seja no início, mesmo no fim, a personagem de Jenny Agutter denota diante da figura vigorosa de Drumm quase que um encantamento. Mas esse se caracteriza por seu flagrante imediatismo; não se apoia em quaisquer outros fatores, além da premente necessidade de fuga da sua realidade presente. A interpretação de Jenny Agutter pode estar muito longe de ser uma das melhores do cinema, mas ela convence, criando uma personagem que surge apática e totalmente crível, fechada em seu mundo, mas agindo desesperadamente em seu interior psicológico. Isso talvez seja mesmo difícil de notarmos, porque contradiz sua forma contida de mover-se. Diria que ela atua parecendo não ter vida. Mas será que este não era seu objetivo? Penso que sim.
Uma interpretação que ressalta no interior da película é a de Warren Oates, sempre muito convincente. No trecho em que o grupo formado por Sebanek e seus irmãos retornam para casa com Cath, e pernoita ao relento, Oates apresenta ao espectador provavelmente o ponto alto de sua interpretação, no filme.
Os outros atores também têm excelentes interpretações, dando boa credibilidade ao conjunto de acontecimentos, e mantendo-se sabiamente dentro dos limites requeridos para seus personagens.
Como o leitor já percebeu, Catherine acaba por se envolver com Clayton Drum, e isso cria um novo viés dramático na história. Não irei contá-la obviamente por completo aqui, mas note-se que este se entrelaçará aos outros, dando certa complexidade ao roteiro. Entre Drum e Sebanek a relação vai do conflito para a amizade e retorna para aquele. Drum, que estava inicialmente ao lado da companhia de trens, muda de lado e passa a ser alvo, como Sebanek, que passa a ter Drum como seu novo alvo, numa espécie de quadrilha de Drummond. Em resumo, afora a companhia de trens, nenhum dos protagonistas deixa verdadeiramente claro, no interior de suas relações, de que lado está de fato, e, sem dubiedade, quais suas reais motivações.
A construção desse triângulo não é exatamente nova no western, e, talvez, o caso mais famoso seja o de Shane (1953), que também retrata um pistoleiro viajante que se instala na casa dos Starret e causa, digamos, alguns desconfortos. Mas, no caso de Shane, a condução da situação nunca é tão direta e clara. Há uma moral implícita, que perpassa a conduta dos protagonistas. Além disso, há no interior do núcleo familiar, um tipo de equilíbrio que jamais houve em Amore, Piombo e Furore.
Sem dúvida, em suas linhas gerais, as semelhanças entre o clássico de Stevens e o western moderno de Hellman parecem acabar por aí, inclusive no que tange à forma distinta com que as mulheres são vistas pelos maridos nos dois casos; no de Sebanek, porém, parece haver mobilidade, uma evolução em direção à mesma situação de Starret quanto a sua companheira. Chama atenção ainda neste cotejo a simbólica cena do incêndio, urdida por Hellman no final da película e que se opõe à visão presente em Shane. Realmente Amore, piombo e Furore é um filme que não pode gozar facilmente de apreço por parte de um público essencialmente machista, mas deixando de fora as pertinentes questões de cunho moral e voltando-se para o objeto artístico, por assim dizer, podemos sim constatar que se trata de um filme bem feito, com a reconhecida assinatura de Hellman.
Outro elemento que penso ter sido uma escolha realmente feliz do diretor é a trilha sonora. São músicas realmente muito bonitas e que deram ao filme um tom muito agradável. Não sei se posso dizer que é equivocado, mas me parece que Hellman exagerou um pouco no uso da mesma, resultando em alguma contradição, ao criar para o espectador certo tom inapropriado de romantismo. Sem dúvida, poderia ter sido mais econômico nesse quesito. Enfim, Amore, piobo e Furore tem sim algumas falhas que lhe diminuem um pouco o mérito. Particularmente não gosto muito do trecho que se passa no circo, razoavelmente executado e talvez pouco necessário. A fotografia é boa, mas pouco ajudada pelos cenário um tanto pobres. Os tiroteios também são medianos e pouco valorizam o filme, entre outras pequenas falhas apontáveis, como alguns deslizes nos efeitos, mas nada realmente grave e que prejudique seriamente o resultado.
Pode-se dizer ainda que, entre outras contribuições, Amore, Piombo e Furore reforça e ajuda a dar fôlego a uma prática, que, se não era de todo nova, porque usada anteriormente, por exemplo, por Raul Walsh em Pursued (1947), ou por vários outros diretores em filmes como Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo (1966), que é a de aproximar o western de outros gêneros, como o Cinema Noir, no caso de Walsh, ou do épico, como em The Plainsman (1936), de Cécil B. DeMille, ou mesmo do musical, como em Calamity Jane (1953), com Doris Day, afigura-se um dos caminhos mais prováveis e razoavelmente eficientes nos anos seguintes para gêneros fortemente delimitados como o western.
Em Amore piombo e Furore, Monte Hellman o faz de modo consciente, e patente para o espectador. Há no filme uma boa dose de erotismo, algo relativamente estranho ao gênero.
O tema da sexualidade e do erotismo já fazia parte da tradição clássica, surgindo em filmes como The Outlaw/1943, ou Duel in the Sun/1946, mas a abordagem difere da anterior por ter um caráter, digamos, mais dionisíaco, mostrando-o quase como celebração, e em que a motivação se apresenta, como dissemos, sob um tom bastante naturalístico. Hellman faz várias referências a isso, deixando claro ser esse um componente que está sempre presente, embora conscientemente sufocado, nas relações e trocas diretas ou indiretas que se instauram entre homens e mulheres no interior da sociedade, seja isso bem ou mal conduzido. Podemos notar essas referências já no início do filme, quando, prestes a ser enforcado, Claytom Drumm troca olhares com uma chinesinha, que parecem ir além da apiedação por parte desta, quanto à condição de condenado de Drumm. Outro momento em que se nota isso é quando o herói se prepara para sair à caça de Sebanek; a câmera inicia por um close-up detido à altura dos quadris de Drumm, bastante incômodo para os conservadores mais radicais. E segue fazendo referências assim, como quando filma a bela Jenny Aguter como se fosse uma ninfa a banhar-se sensualmente no pequeno riacho próximo à casa dos Sebanek.
O recurso se repete em vários momentos do filme e prenuncia de certo modo um western “mais cerebral”, considerando-se os novos padrões que passariam a viger nas décadas seguintes. Assim é que após o ocaso do western, este continuou buscando seu caminho, nem sempre muito feliz, claro, e uma das formas que se encontraram para isso foi misturá-lo a outros gêneros, normalmente de mais popularidade entre as novas gerações, como o cinema de horror, o que se pode constatar em filmes como Legend of the Phantom Rider (2002), a ficção, como em Wild Wild West (1999) ou Cowboys e Alliens (2011). Nesse sentido, Amore Piombo e Furore parece assentar-se na linha do eurowestern, mais que na do western americano, por todo o teor de experimentalismo que gozou aquele, renovando o gênero nas décadas de 60 e 70, mesclando-o ao filme de terror, à comédia pastelão, ou mesmo ao sentimento libertário e ao ideário que avançava à época.
No Brasil, não tenho conhecimento de uma edição do mesmo. A edição que a custo conseguimos é totalmente mutilada, tanto quanto à imagem quanto no que diz respeito ao tempo da película. Já passa da hora dos empresários da área voltarem-se para publicar os filmes em DVD e Blu-Ray, sejam de qualquer gênero ou época, e com qualidade, respeitando o consumidor brasileiro. Isso não impede que continuem lançando as abobrinhas que, com certeza, vendem muito mais, porque a grande massa não tem defesas contra as sutilezas culturais, sociais e econômicas que se lhe impõem. Se aqueles defendem um negócio legal e condenam a pirataria, não podem contradizer-se deixando de ter um mínimo de compromisso, pelo menos quanto à questão da relação de consumo.
Para finalizar, lembro que não esqueci as figuras dos roteiristas ou da importante menção a Tony Brandt, diretor assistente, que inclusive é creditado como codiretor, ou de outras figuras no mínimo interessantes no filme, como a ilustre presença do “poeta da violência” hollywoodiano, Sam Peckinpah. Isto é só uma breve resenha, cujo foco manteve-se nos restritos limites da apreciação de alguns aspectos qualitativos do filme, uma vez que, quanto aos aspectos externos, muita gente boa tem discutido mais detidamente na internet, e você, caro leitor não terá dificuldades em encontrar. Na guia conexões sugiro alguns blogs em que você pode ler mais sobre faroeste, como o Cinewestermania, que publicou há pouco tempo sua visão sobre o filme, além de vários outros espaços interessantíssimos para os amantes do cinema, especialmente western.
Um abraço e boa sessão!
Sobre Monte Hellman (1929–2021)
03/07/25
A fera do Forte Bravo, Escape from Fort Bravo 1953, John Sturges
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A FERA DO FORTE BRAVO (Escape from Fort Bravo) - WESTERN COM WILLIAM HOLDEN
Darci Fonseca, 5 de dezembro de 2011
Alguns filmes são difíceis de serem esquecidos, nem tanto pela qualidade dos mesmos mas sim por determinadas cenas que permanecem para sempre em nossas lembranças cinematográficas. Este é o caso de "A Fera do Forte Bravo" (Escape from Fort Bravo) com a admirável sequência do cerco dos índios mescaleros a um grupo liderado por um capitão da Cavalaria norte-americana. Dirigido por John Sturges em 1953, tempo em que nem Sturges e nem o astro principal William Holden gozavam ainda do prestígio que iriam adquirir no decorrer daquela formidável década em Hollywood, o diretor com uma belíssima série de faroestes clássicos e Holden com uma sequência impressionante de sucessos de crítica e de público que fez dele um dos campeões de bilheteria daquela década.
SUL VS. NORTE VS. MESCALEROS - A história de Phillip Rock e Michael Pate foi roteirizada por Frank Fenton situa-se em 1863 no Forte Bravo, comandado pelo Coronel Owens (Carl Benton Reid) que mantém prisioneiros um grupo de confederados. Quando um deles tenta fugir do Forte é caçado e arrastado pelo rude e intransigente Capitão Roper (William Holden). O Forte Bravo recebe a visita de uma elegante mulher chamada Carla Forester (Eleanor Parker) cujo secreto objetivo é possibilitar a fuga do Capitão Sulista John Marsh (John Forsythe) com quem Carla mantém antiga relação amorosa. Ao se conhecerem, Carla e o Capitão Roper se apaixonam, mas mesmo assim Carla cumpre sua missão e ajuda o Capitão Marsh e três soldados sulistas prisioneiros a escaparem do Forte Bravo, acompanhados por ela na fuga. O Capitão Roper reúne alguns homens e segue no encalço dos fugitivos conseguindo prendê-los mas no retorno ao Forte Bravo o grupo é atacado pelos índios apaches mescaleros, temidos por serem ferozes e impiedosos. Acuados pelos índios num espaço aberto rodeado de montanhas, os mescaleros dizimam parte do grupo e quando estão prestes a exterminá-los são surpreendidos pela chegada da Cavalaria. Carla Forester e o Capitão Roper sobrevivem e retornam juntos para o Forte Bravo após a morte do Capitão Marsh, vítimado pelas flechas apaches.
ESTRATÉGIA GUERREIRA - Em "Entre Dois Juramentos" (Two Flags West), de Robert Wise (1950), prisioneiros confederados e soldados nortistas já haviam lutado juntos, como ocorre em "A Fera do Forte Bravo". A necessidade de sobrevivência diante de um inimigo comum é o fato relevante do western de John Sturges. E esse inimigo comum existiu durante toda a Guerra Civil norte-americana, apenas não tendo sido tão forte quanto a odiosa e irracional motivação daquela guerra fratricida. E em pleno Forte Bravo nasce o amor entre o oficial yankee (William Holden) e a agente sulista (Eleanor Parker), superando as hostilidades mas não o idealismo da mulher. Os aspectos políticos são importantes em "A Fera do Forte Bravo" e de certa forma foram responsáveis por esse western ser um tanto irregular. Há excelentes diálogos nos quais os antagonistas procuram justificar suas posições sacrificando as cenas de ação que só acontecem no último quarto do filme. Mas quando a ação ocorre com o cerco dos mescaleros, é de forma admirável e marcante. Cercados pelos índios o grupo de oito pessoas encontra como abrigo uma espécie de cavidade, de onde rechaçam os ataques diretos. Porém não contavam os liderados pelo Capitão Roper com a estratégia dos pele-vermelhas que demarcam a cavidade com lanças e com conhecimento da técnica da gravidade disparam nuvens de flechas sobre os desesperados inimigos matando quase todos.
O ASSUSTADOR VALE DA MORTE - Entre os subtemas de "A Fera do Forte Bravo" está o da covardia que se revela na figura do soldado sulista Bailey. Desprezado por seu captor Capitão Roper e mais ainda por seus companheiros confederados, Bailey tem oportunidade de reverter seu trauma pessoal ao corajosamente cavalgar até o Forte Bravo em busca de reforços e ser o responsável pela salvação dos sobreviventes. Mais que um clichê do gênero, a dramática sequência final com a emocionante chegada da Cavalaria dá ao filme um saboroso toque de western "B" aqueles em que tudo era permitido. William Holden, por sua vez, relembra na sequência da batalha final a imagem épica de Errol Flynn em "O Intrépido General Custer" (They Died With Their Boots On). Lançado praticamente em seguida à portentosa Trilogia da Cavalaria de John Ford, o filme de Sturges não faz feio na bonita composição de imagens com uso perfeito dos amplos espaços e agressivas montanhas e chapadões por parte do cinegrafista Robert Surtees nas locações realizadas no Parque Nacional do Vale da Morte, na Califórnia. Realizado com pequeno orçamento, "A Fera do Forte Bravo" peca pelas cenas de estúdio com cenários inconvincentes bem como pelo uso de filtros para falsa ambientação noturna. Tudo isso, no entanto, é compensado com as muitas cenas em locações, culminando com o referido ataque final dos mescaleros. Filmado inicialmente em 3.ª Dimensão, "A Fera do Forte Bravo" foi lançado em processo widescreem, o primeiro filme da MGM nesse processo. Porém as muitas flechas disparadas em direção às câmaras denunciam a intenção inicial da Metro Goldwyn Mayer em aproveitar a novidade que pretendia revolucionar o cinema em 1953.
UMA FERA CHAMADA BILL HOLDEN - O australiano Michael Pate, escritor bissexto é bastante conhecido do público pelos incontáveis papéis de homem mau e os tantos tipos multirraciais que interpretou, entre eles índios como o 'Sierra Charriba' em "Juramento de Vingança" (Major Dundee), de Sam Peckinpah. O ótimo William Holden, a pretensa 'fera' lidera o elenco de "A Fera do Forte Bravo", exibindo seu dorso nu, que seria sua marca registrada em muitos de seus filmes seguintes. Em 1959, em "Marcha de Heróis" (The Horse Soldiers) de John Ford, William Holden como oficial da União também teve que enfrentar uma espiã durante a Cuerra Civil. Em "A Fera do Forte Bravo" Holden é secundado por atores que despontavam como Richard Anderson, John Forsythe e John Lupton. Porém os destaques ficam para os veteranos Carl Benton Reid e especialmente William Demarest cujas falas parecem ter sido escritas por Preston Sturges que tinha em Demarest seu ator preferido. A vítima do sarcasmo de Demarest neste western é o jovem William Campbell. Charles Stevens, veterano ator de faroestes "B" e seriados interpreta o índio batedor Eilota e ao seu lado estão outros veteranos como Fred Graham, Glenn Strange, William Newell e Alex Montoya. A bonita e pouco expressiva Eleanor Parker é a texana indecisa entre o amor de um nortista e a fidelidade à causa sulista. Aos 22 anos num papel incondizente com seu talento está Polly Bergen, excelente atriz e cantora que, à exceção de "Círculo do Medo" (1963) nunca foi devidamente aproveitada pelo cinema.
CENÁRIO BASTANTE CONHECIDO - O Death Valley, no Parque Nacional da Califórnia serviu de cenário a inúmeros filmes, não apenas do gênero western como "Os Profissionais" (The Professionals). Também "Spartacus", "A Maior História de Todos os Tempos", "Guerra nas Estrelas", "Ouro e Maldição" (de Erich von Stroheim) e até "The Doors" (vida de Jim Morrison), entre outros foram igualmente filmados no Vale da Morte. A televisão com a série "Death Valley Days", apresentada por Ronald Reagan e ainda alguns episódios de "Além da Imaginação" também tiveram aquele assombroso local como locação. Sem ser bonito e poético como o Monument Valley, o Vale da Morte é extraordinário cenário cinematográfico, valorizando filmes como "A Fera do Forte Bravo".
03/07/25
Oharu, a vida de uma cortesã, Saikaku ichidai onna, 1952, Kenji Mizoguchi
Kinuyo Tanaka (1910-1977) [créditos: 218]
Crítica | Oharu: A Vida de Uma Cortesã por Luiz Santiago 17 de abril de 2017 [excelente]
Oharu era o projeto dos sonhos do diretor Kenji Mizoguchi. Devido à aparente polêmica do enredo, sua produção foi dificultada, rejeitada e adiada, até que Hideo Koi (que em 1950 produzira As Irmãs Munekata, de Yasujiro Ozu, filme que lhe trouxera pouco retorno e, por isso mesmo, lhe deixava com o pé atrás com Oharu) e Isamu Yoshii, além do próprio Mizoguchi, resolveram encarar o projeto e adaptar uma famosa obra de Saikaku Ihara, romancista e poeta japonês do século XVII, responsável por um estilo que revolucionou a literatura japonesa naquele período de século. Escrito em 1686, o livro que deu origem a Oharu acompanha a protagonista (uma prostituta) e explora as desventuras de se ter nascido mulher na sociedade japonesa do Período Edo (1603 – 1868), governado pelos xoguns da família Tokugawa.
A adaptação, feita por Mizoguchi, ao lado de seu colaborador em muitos filmes, Yoshikata Yoda [pausa para admirar esse sobrenome!] torna Oharu não só um enredo sobre desventuras pessoais, mas sobre o tratamento dispensado à mulher em uma sociedade patriarcal, violenta e disfarçadamente misógina, onde a protagonista (espelho da mulher japonesa) vive diversos papéis, mas não se realiza ou lhe é permitido ficar em nenhum deles. Oharu é a filha rejeitada e também criada, esposa, mãe, concubina, monja, mendiga e prostituta. Nós a vemos começar e terminar o filme sozinha, após uma vida inteira de infortúnios.
O estilo pessoal de Mizoguchi torna a dor de viver da protagonista ainda maior. Notamos que desde o começo a câmera serve Oharu, movendo-se por causa dela, que, envergonhada (de sua situação? De sua velhice? De ambas as coisas?) enconde o rosto. Os primeiros minutos do filme são muito importantes para criar a atmosfera de prisão a céu aberto, mesmo que ainda não tenhamos uma explicação para isso, pois ela vai se construindo à medida que entendemos quem é Oharu e o que ela passou para estar ali. Os quadros deste início destacam mais a paisagem do que as pessoas nele, deixando claro o abandono e a impotência diante da vida.
A atriz Kinuyo Tanaka entrega uma interpretação delicada e meticulosa. Mizoguchi era extremamente exigente com a qualidade das atuações em seu elenco e, especialmente nesse caso, extraiu excelentes momentos, mesmo de personagens com pouco tempo de tela, como o de Toshiro Mifune, por exemplo. As expressões de Tanaka nos ajudam a ler os sentimentos de Ohau, já que o mínimo espaço de fala lhe é dado nessa sociedade e a maior presença dela na história está no curto tempo em que fica próxima ao filho e, depois, com seu casamento, até que mais uma notícia trágica chegue à loja de leques e mais este laço de sua vida se quebre. É como se o tempo inteiro o mundo ao redor de Oharu e das outras mulheres lhes impedissem de gozar a vida. Sua única função de existência era servir.
O espectador deve se acostumar aqui com o ritmo episódico da narrativa. Para um público mais impaciente, ver um filme longo como Oharu em formato episódico deve ser um incômodo, mas entendam que o cineasta propositalmente inseriu essas elipses e “blocos de tempo” na história a fim de abarcar a passagem dos anos para a protagonista e nos mostrar como a sequência de tragédias moldou sua vida e seu comportamento, sem depender de narração ou explicações no contexto cênico (os figurinos também ajudam a marcar essa passagem). Os planos e sequências de maior duração vão diminuindo à medida que o filme avança e isso liga com perfeição o início e o final da obra, terminando por tirar Oharu do quadro, para fora dessa desastrosa realidade e nos deixar apenas com a imagem de um tempo, talvez meditando, talvez imaginando o destino da personagem que, depois de uma vida de dissabores simplesmente desaparece.
O uso econômico da música aqui logo deve ser levado em consideração na composição dramática da história. O recurso aparece de maneira pontual e tem realmente grande presença na reta final do longa, quando Oharu volta para o Clã de onde seu filho agora é Senhor e tenta se conectar a ele, só que mais uma vez é julgada e condenada por atos passados. Primeiro, usada como cortesã. Depois, dispensada porque “não tinha mais nenhuma serventia” e esquecida pelos homens da casa, Oharu é vista em sua velhice como alguém que quase desonrou a imagem do Clã e deveria, segundo lhe dizem, passar o resto de sua vida rezando e pedindo perdão para seu antigo Senhor, o mesmo que a usou para ter um filho e não se preocupou em lhe dar ao menos dinheiro para comer.
Atento ao humilhante papel relegado à mulher na sociedade japonesa de todas as épocas (um reflexo que evidente se aplica a sociedades do mundo inteiro), Mizoguchi joga com as injustiças, não pregando vingança ou teorizando revoluções. Ele torna esses problemas mais infames justamente pela incapacidade de se lutar contra eles e nos enraivece porque suas personagens estão condenadas àquela situação por toda a vida, como um destino macabro que elas precisam cumprir, resignando-se a receber ordens, a ver leis criadas para piorarem suas vidas e nenhuma perspectiva de obter concessões. É como se Oharu fossa a encarnação de muitas gerações de mulheres que tiveram um único papel: fazer os outros (leia-se, homens) felizes. No momento em que sua felicidade se torna evidente ou possível, ou algo surge e toma dela a felicidade. É um pathos pessoal e social filmado de maneira esplendorosa, mas com a delicadeza clássica, que tira muito do mínimo, típica do cinema de Mizoguchi (característica também observada em outros diretores japoneses como Ozu e Naruse).
Aproveitando-se com precisão de ambientes naturais, exercendo um ritmo perfeito de manipulação da câmera, especialmente no plano geral – que aqui é o sinal do desespero, do indivíduo perdido e oprimido pelo mundo –, e assumindo com extrema graça o formato do melodrama, o diretor realiza um de seus maiores filmes, para muitos, o melhor. Existe apenas uma rusga na obra, que são os cortes abruptos entre alguns blocos e sequências do meio da fita, onde a música e a ação são interrompidas de maneira pouco cuidadosa, uma quebra de fluidez que embora não chegue a afetar a experiência do filme como um todo, não tem um bom resultado no momento em que acontece.
Interagindo com todas as classes sociais, Mizoguchi faz aqui um retrato da mulher japonesa no Período Edo e, ao mesmo tempo, realiza a épica jornada de uma personagem forte, acima de tudo, lutadora e solitária. Oharu é uma obra dolorosa que deve ser vista como um retrato do que o mundo, as leis e as pessoas no comando de certas instituições podem fazer de negativo com outros grupos e pessoas. E ainda julgá-las por não serem melhores do que são.
The Life of Oharu 1952 西鶴一代女 Directed by Kenji Mizoguchi, Review by Darren Carver-Balsiger (Tradução livre)
The Life of Oharu é rica em escopo, caráter, detalhes e temas. É uma obra quase mítica, que parece ao mesmo tempo cautelosa e profundamente evocativa de uma história desagradável. Também é épico para Mizoguchi, sendo um raro filme dele que ultrapassa a marca de duas horas. No entanto, ele também contém muito mais enredo do que o normal. O filme usa uma estrutura de flashback e uma narrativa episódica para tecer uma história de infortúnio que viaja de um infortúnio a outro. É um gigante do melodrama japonês clássico e uma realização artística significativa.
Oharu é uma mulher respeitável reduzida à prostituição de rua. No entanto, no início de sua história, ela inicialmente desprezava os homens considerados inferiores a ela. Então, um caso de amor em um mundo de folhas caídas mudou tudo. Ela se atreveu a dignificar um homem de origem humilde com seu amor. A partir daí, The Life of Oharu apresenta uma espiral descendente, através do sistema de classes do século XVII. A estrutura rígida do feudalismo permitiu o colapso do status de classe e a capacidade de descer rapidamente. O feudalismo, especialmente no Japão, era mais do que apenas nobres e camponeses. Havia papéis que as mulheres podiam assumir e que não pertenciam a nenhum deles, como concubinas ou prostitutas. Essencialmente, um sistema de classes separado para o trabalho sexual, uma hierarquia de prostituição. As mulheres eram reduzidas a objetos sexuais sem classe. De uma perspectiva marxista, esse não é o verdadeiro feudalismo.
Embora a economia feudal, especialmente nesse momento da história japonesa, estivesse aberta ao comércio e ao capital. A classe ainda determina tudo, mas existem muitos grupos diferentes, desde camponeses comuns até quase todas as mulheres, que formavam um coletivo sem poder. Eles eram a base da sociedade e, em alguns aspectos, ainda são.
Qual é a importância da classe social para o amor? Por mais que gostássemos de ter um mundo que mantivesse essas coisas separadas, isso nunca acontecerá. The Life of Oharu está repleto de males sociais que proíbem o amor ou prendem as pessoas em cenários sem amor. Os pais se preocupam com a posição social de seus filhos, não com o amor e a felicidade deles. As mulheres são obrigadas a criar herdeiros, não a viver suas próprias vidas. Em uma cena provocativa de The Life of Oharu, os homens discutem as mulheres como se fossem propriedades ou como se fossem gado para ser vendido. Oharu está sujeita a abusos e estupros. Até mesmo seu próprio filho é levado embora, enquanto ela grita desesperadamente para impedir isso. Ela é abandonada e fria, lutando até mesmo para se tornar uma freira. Os homens tomam decisões ruins, mas ela é punida. A maioria a vê apenas como uma prostituta. No entanto, Oharu é uma pessoa rara que não se importa com a classe. Ela não faz nenhuma tentativa de ganhar dinheiro, além das tentativas desesperadas de sobrevivência em seus momentos mais difíceis. Oharu quer amor, mas o mundo só quer ganância.
The Life of Oharu é lento e cuidadosamente pensado. É repleto de tomadas longas e uma câmera firme que se mantém distante dos personagens. Tudo isso é colocado de forma tão discreta como um trabalho de desespero. O que mais pesa é a perda de dignidade que Oharu precisa enfrentar. The Life of Oharu é um filme poderoso, mas é o ato final que o torna magnífico. Nessas cenas, entramos no estupor de ter perdido tudo. Os homens se perdem em uma coleção de estátuas, pois todas são indistintamente podres. Somos deixados como Oharu, sozinhos e incapazes de escapar. Letterboxd
Kenji Mizoguchi Ranked https://letterboxd.com/darrencb/list/kenji-mizoguchi-ranked/
My Top Films of the 1950s https://letterboxd.com/darrencb/list/top-films-of-the-1950s/
03/07/25
2001: Uma Odisséia no Espaço, 2001: A Space Odyssey, 1968, Stanley Kubrick
2001 uma odisseia no espaço neste blog aqui
04/07/25
Solaris, Solyaris, 1972, Andrei Tarkovsky
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Solaris neste blog aqui
Kris Kelvin: Acho que a Solarística está em um impasse. É o resultado de fantasias irresponsáveis. Interesso-me apenas pela verdade, mas você quer me convencer do seu ponto de vista. Não posso tirar conclusões baseado em "razões do coração". Não sou poeta. Meu problema é simples: ou terminar a pesquisa, retirando a estação de órbita e estabelecer de vez a crise na Solarística, ou tomar medidas extremas, como bombardear o Oceano com raios de alta intensidade.
Anri Berton: Não, isso não!
Kris Kelvin: Você não quer continuar esta pesquisa a qualquer preço?
Anri Berton: E você quer destruir aquilo que você não é capaz de compreender? Não, eu não defendo o conhecimento a qualquer preço. Conhecimento só vale se reside em fundamentos de moralidade.
Kris Kelvin: O homem é o único agente que faz da ciência algo imoral. Não se esqueça de Hiroshima.
Anri Berton: Então não torne a ciência imoral! É tão estranho...
Kris Kelvin: Não há nada estranho nisso. Mesmo você não pode estar certo de que tudo que você viu não passou de alucinações.
Anri Berton: Muito obrigado pelo seu tempo. Não temos mais nada a dizer um para o outro.
Filosofía, cultura y educación [tradução livre] Segunda feira,5 May 2025
Solarística
O mito da caverna nos fala de incomunicação, é claro, ou da impossibilidade de nos comunicarmos, quando a natureza nos leva a nos vermos transformados e diferentes. Aqueles que foram trazidos para a luz não podem ver as sombras como as veem aqueles que ainda não conhecem a luz. É por isso que, no final, surge o terror de ser arrancado da antiga companhia, da moradia onde tudo era uma imagem embaçada e confusa, mas acolhedora. A incomunicação, ou a impossibilidade de se comunicar, muitas vezes leva ao desespero e à violência. Poderíamos entrar em contato com o que chamamos aqui de “inteligência extraterrestre”? Ela poderia entrar em contato conosco se nos encontrasse? Esse é um dos grandes temas do romance Solaris, de Stanislaw Lem, que questiona de uma só vez toda a ciência e a literatura baseadas na suposição de contato entre humanos e alienígenas, como se qualquer existência, por ser extraterrestre, tivesse que funcionar como a terrestre para entender, sentir, querer, amar. Quando olhamos para o mundo, nós o fazemos e, ao fazê-lo, nós o habitamos. Sabemos como viver de outra forma?
"A Solarística, disse Muntius, é uma religião substituta da era cósmica, fé disfarçada de ciência; o Contato, o objetivo que ela visa, não é menos vago e obscuro do que as relações com os santos ou o sacrifício do Messias. Usando fórmulas metodológicas, a exploração equivale à liturgia, o trabalho humilde dos pesquisadores se traduz na espera de uma epifania, de uma Anunciação, pois não há, nem deveria haver, pontes entre Solaris e a Terra. Esse paralelo óbvio, assim como muitos outros (falta de experiências comuns, falta de ideias transmissíveis), é rejeitado pelos solaristas, assim como os crentes rejeitam argumentos que questionam seu dogma de fé. O que as pessoas esperam que aconteça, uma vez estabelecida a “conexão informacional” com os mares inteligentes? Um registro de experiências relacionadas a uma existência sem fim, tão remota que nem mesmo se lembra de seu início? A descrição de desejos, paixões, esperanças e sofrimentos liberados durante os nascimentos momentâneos de montanhas vivas? A transformação da matemática em existência corporificada, e da solidão e do abandono em plenitude absoluta? Tudo isso é um amálgama de conhecimento intransferível e, se tentarmos traduzi-lo para qualquer linguagem terrena, os valores e significados pretendidos se perderão, permanecendo para sempre do outro lado." (Solaris)
06/07/25
Marte ataca! Mars Attacks!, 1996, Tim Burton (Max)
Crítica | Marte Ataca! por Fernando Campos, 6 de outubro de 2018
Tim Burton realmente gosta dos filmes de ficção científica trash dos anos 50. Em 1994, o diretor realizou a ótima cinebiografia Ed Wood, sobre o criador do péssimo, mas considerado cult, Plano 9 do Espaço Sideral. Depois disso, em 1996, Burton inspirou-se nesse universo novamente, dirigindo a paródia Marte Ataca!. Porém, a pergunta que fica é: por que parodiar um gênero risível por si só?
A obra inicia, já nos créditos iniciais, mostrando naves marcianas aproximando-se da Terra e cercando as principais cidades do mundo. Com isso, a humanidade fica apreensiva sobre os objetivos dos extraterrestres no planeta. Tentando mediar um contato com esses seres, o Presidente dos Estados Unidos, James Dale (Jack Nicholson), consulta o professor Donald Kessler (Pierce Brosnan) e o General Decker (Rod Steiger). No entanto, nada sai como esperado e os alienígenas começam seu ataque à raça humana.
Respondendo diretamente a pergunta do primeiro parágrafo, Burton falha em parodiar o gênero. Marte Ataca! se sai mal em seu principal objetivo, ser engraçado. Inclusive, em vários momentos, parece que estamos diante de um legítimo filme trash e não de uma comédia. Isso porque o roteiro, escrito por Jonathan Gems, foca em criar graça com momentos absurdos, mas não atinge seu objetivo por apostar em cenas parecidas umas com as outras. No primeiro contato com os extraterrestres, por exemplo, é surpreendente e bem construído o ataque desses seres, explorando a ingenuidade dos terráqueos, iludidos pela frase “nós viemos em paz”. No entanto, minutos depois, na cena em que o marcianos visitam o Congresso dos Estados Unidos, a obra recorre ao mesmo recurso, uma falsa promessa de paz para tentar fazer rir. Obviamente, a estratégia não funciona na segunda vez.
Assim segue o roteiro de Marte Ataca! durante a maioria do tempo, criando situações repetidas com o objetivo de criar alguma graça. Outro exemplo disso é a divisão do Presidente Dale diante do pacifismo de Kessler e agressividade de Decker; em um primeiro momento funciona, depois não. Aliás, os protagonistas são tão estereotipados e sem graça que até mesmo suas jornadas não interessam.
A única habilidade de Burton com relação aos seus personagens é conseguir reunir um elenco tão estrelado. Ninguém se destaca, mas o simples fato de acompanhar tantos atores talentosos, como Jack Nicholson, Glenn Close, Rod Steiger, Pierce Brosnan, Annette Bening e Sylvia Sidne, já diverte. Porém, a única interpretação que vale nota é a de Nicholson, incorporando dois personagens aqui, o Presidente Dale e o picareta Art Land, dando personalidade a ambos.
Outro fator que vale elogiar são alguns subtextos propostos pelo roteiro de Gems. O discurso de Dale implorando para que os marcianos relevem as diferenças e tentem colaborar com os humanos expõe uma certa hipocrisia americana, país que já invadiu nações sem motivo válido e começou guerras com um falso discurso de paz, exatamente como os extraterrestres fizeram. Além disso, o texto expõe com eficiência a paixão ingênua que as pessoas têm por “salvadores”, impedindo algumas de verem força em si mesmas, algo exemplificado através da personagem Barbara Land, interpretada por Annette Bening.
No entanto, esse não é o foco de Marte Ataca!, uma vez que são momentos de exceção dentro da obra, sendo insuficiente para tornar o resultado bom. Ademais, nem mesmo a direção de Burton impressiona aqui. A fotografia apenas intercala entre planos abertos e fechados, sem nenhum plano emblemático. Já a direção de arte busca o vermelho para criar uma sensação de perigo que não funciona e até mesmo a nave dos marcianos, uma oportunidade de criar algo diferente, vai na linha do estereótipo alienígena, parecendo uma calota por fora. Enquanto isso, a trilha de Danny Elfman funciona, dando o tom preciso de cada cena, utilizando bateria em falas de militares e violinos em cenas “inspiradoras”, contudo, assim como a fotografia, não foge do básico.
Por fim, a resolução da obra é absurda e sem sentido, além de não ter graça nenhuma, eliminando os alienígenas através de uma música. Pior do que isso, no terço final, alguns personagens surgem sem propósito algum, parecendo existir apenas para acomodar amigos do diretor, como é o caso dos papéis de Danny DeVito e Tom Jones. Buscando parodiar os filmes de ficção científica trash dos anos 50, Tim Burton aproxima-se mais da homenagem do que humor. Mas não no sentido positivo, pelo contrário, Marte Ataca! homenageia o gênero por ser fraco e repetitivo como os filmes que se inspirou.
06/07/25
Pecadores, Sinners, 2025, Ryan Coogler (Max)
Pecadores, Eduardo Kaneco, 15/04/2025
Pecadores (Sinners) só poderia mesmo ser criação de um cineasta engajado como Ryan Coogler, que assina como diretor e roteirista. Desde seu filme-protesto de estreia, Fruitvale Station (2013), sobre um jovem negro brutalmente assassinado por um policial, Coogler nunca deixa a questão racial de lado. Foi menos incisivo em Creed (2015), por entender que era a sua grande chance para entrar nas grandes produções de Hollywood. Deu certo, e pôde então voltar a acenar a bandeira em Pantera Negra (2018), quando pesou demais a mão, encontrando um equilíbrio melhor em Pantera Negra: Wakanda para Sempre (2022).
The devil
O equilíbrio entre narrativa e questão racial fica no limite em Pecadores, extrapolando um pouco em algumas de suas cenas. A premissa, acima de tudo, é genial. Coogler revitaliza um subgênero clássico do terror ao acrescentar a poderosa lenda do pacto com o diabo do músico de blues Robert Johnson (1911-1938). O filme A Encruzilhada (Crossroads, 1986), de Walter Hill, se inspira nessa história, mas numa versão que não valoriza suficientemente as origens negras.
A ideia do blues como a música do diabo nasce dos próprios músicos de blues. Basta lembrar da canção “Me and the Devil Blues”, de Robert Johnson. Mas, como Pecadores evidencia, ganha uma conotação preconceituosa por parte dos brancos, oriunda do temor das crenças africanas e da inveja pelo teor sensual dessa música. Por isso, após uma batalha apoteótica contra os seres do mal (a configuração deles é uma surpresa, portanto não mencionaremos aqui por enquanto), o protagonista precisa dizimar aqueles que, de fato, são ruins. Ou seja, os racistas, sejam eles assumidamente da Ku Klux Klan ou não.
Apesar do prólogo (para variar, um flash forward), quem leva o mal para a cidadezinha do Mississipi não é o jovem negro, Sammie Moore (Miles Caton), que toca o blues contrariando o pai que é pastor. O responsável é o irlandês já possuído e que escapa da perseguição dos indígenas para se juntar a um casal da KKK e formar um trio de música folk. O objetivo deles é invadir a noite de inauguração da casa noturna dos gêmeos Fumaça e Fuligem (ambos interpretados por Michael B. Jordan) para transformar todos em criaturas iguais a eles.
The blues
Antes de entrar no cinema fantástico, Pecadores embarca num divertido road movie pela região, quando os gêmeos recrutam os músicos (entre eles, Delta Slim, vivido por Delroy Lindo), e os contratados para prepararem e trabalharem na noite de abertura do salão de música que eles inauguram, montado num galpão adquirido com dinheiro sujo que ganharam em Chicago. O grupo reúne personagens peculiares, coadjuvantes marcantes facilmente reconhecíveis durante o grande confronto final.
Ryan Coogler presta uma homenagem não só ao blues, mas à música produzida por não-brancos. Segundo uma narração em off, essa música servia para aliviar a dor de uma vida sofrida. Dessa necessidade, surgiram o blues dos escravos negros, assim como as cantorias e ritmos dos povos indígenas e africanos. O louvor a essas criações ganha uma dimensão mágica na cena em que Sammy, Delta e outros músicos da casa ganham a companhia de artistas de gêneros que surgiriam no futuro (rock, rap, música eletrônica etc.), indicando que todos receberam a influências dessas músicas originárias.
Spoilers adiante
Esta crítica ficaria incompleta sem entrar na metade final de Pecadores. Portanto, quem quer preservar a surpresa, deixa para continuar a ler depois de ver o filme.
A preparação para a grande inauguração do empreendimento de Fumaça e Fuligem, que toma quase metade do filme, mantém o foco no blues. O processo de preparação e abertura da casa de blues é suficientemente interessante para manter o público engajado na história. Porém, a partir de determinado momento, a trama dá uma guinada que muda até o gênero do filme. Lembra Um Drink no Inferno (From Dusk Till Dawn, 1996), de Robert Rodriguez.
Porém, no filme de Coogler as criaturas não apresentam aqueles típico dentes de vampiros. Na verdade, salvo alguns renascidos que sofreram deformações quando morreram, os vampiros parecem menos assustadores do que deveriam ser. Mas, talvez seja uma escolha do diretor, para enfatizar que os piores monstros são os brancos racistas.
Dessa forma inusitada, Coogler deixa sua mensagem antirracista com muita (até demais) evidência. Mas, a inspirada ideia de resgatar uma lenda do blues, gênero negro por excelência, e transformá-la num filme de vampiros coloca Pecadores num patamar superior dentro de sua filmografia. Em outras palavras, o diretor azeita sua receita de introduzir a questão racial dentro do cinema de gênero. E, assim como Buddy Guy (que faz uma participação especial na cena pós-créditos) continua com seu blues, música feita por negros para negros, Ryan Coogler segue com seu cinema feito por negros para negros.
07/07/25
Território hostil, Hostile Territory, 2022, Brian Presley
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Review by Toastshake (Tradução livre)
Hostile Territory é o projeto de paixão de Brian Presley, que dirige, escreve e estrela o papel principal de Jack Calgrove. Um soldado da União capturado pelas forças confederadas, onde sobreviveu como prisioneiro de guerra durante a Guerra Civil. Com o fim da guerra, ele é finalmente libertado e se depara com um horror perturbador: sua esposa faleceu de tuberculose e seus filhos foram colocados em um trem de órfãos. Ele é enviado para se reunir com um membro da família, que está prestes a se mudar para Montana. É uma corrida contra o tempo e as forças hostis enquanto Jack luta para recuperar seus filhos.
Novo conceito sobre o Movimento do Trem dos Órfãos. Um programa de bem-estar social que transportava crianças que viviam em cidades do Leste para ajudar a povoar as áreas rurais do Meio-Oeste, dando-lhes uma nova família e um novo lar. No entanto, nem todas as crianças eram órfãs, e muitas foram tiradas à força de famílias pobres e de imigrantes. Um fato que é abordado por uma de nossas personagens, Alice Beggs, interpretada por Natalie Whittle. Achei que sua atuação foi a mais forte do elenco. Senti-me muito crua e poderosa quando ela exemplificou a história deles.
A história foi subdesenvolvida e a segunda metade foi condescendente. Com tanta coisa acontecendo nos últimos trinta minutos, a primeira metade não conseguiu se mover em um ritmo adequado. Sem mencionar que alguns dos personagens pareciam bastante estranhos, como Desmond Richards, de Craig Tate. Ele realmente não serviu para nada e poderia ter sido facilmente melhorado se eles pegassem elementos de seu personagem e os adicionassem ao de Alice Beggs.
A direção deixou a desejar. Muitas tomadas aéreas com drones e frequentes sequências em câmera lenta. E não sei se foi intencional, mas o filme, às vezes, parecia uma produção da Hallmark. Seu tom tornou-se excessivamente sentimental, beirando a sacarina. E quando o clima muda, é absolutamente chocante, resultando em uma chicotada tonal.
Parte da razão pela qual eu acho que foi sentimental demais se deve à sua estrutura narrativa, pois um personagem, agora mais velho, reflete sobre os eventos. O diálogo no final não ajuda e parece que foi adicionado para abordar questões que resultaram no final climático. Em suma, um faroeste moderno um tanto pedestre. Valor de produção razoável para seu pequeno orçamento, conceito único, algumas atuações fortes e um elenco diversificado. Letterboxd
08/07/25
Jogo da Vingança, Am zin, 1999, Johnnie To
Review by , Rafael "Mister Movie" Jovine (Tradução livre)
Ação! - As ações de Johnnie/Ringo em Hong Kong: In The Mood For King To's Sweeping Realism
Johnnie To está de volta com outro filme divertido, este sobre uma batalha de inteligência entre dois indivíduos em lados opostos da lei. Um deles é um vilão com doença terminal, enquanto o outro é um negociador sensato que tem prazer em caçar os bandidos.
Tendo trabalhado com eles por um longo tempo, tanto o diretor quanto nossos protagonistas já se sentiram confortáveis nesse mundo e se sentem à vontade com esses homens. Andy interpreta um bandido convincentemente simpático que consegue fazer com que o público acredite em sua perspicácia, mesmo diante de uma adversidade esmagadora. Sean, por outro lado, tem experiência mais do que suficiente interpretando esses homens com uma mentalidade arrogante e sabe-tudo, e consegue fazer com que você, o espectador, também queira que ele vença. A escrita de seus personagens e as brincadeiras também proporcionam momentos divertidos.
A rigor, o trabalho de câmera é menos criativo e um pouco mais convencional, mas isso não diminui em nada a energia ou a emoção do filme, como a cena do carro com o fusível em funcionamento. Além disso, não falei sobre isso, mas, ocasionalmente, os filmes de To têm músicas que capturam a emoção e a psicologia do filme ao mesmo tempo em que definem a cena, e há muitas partes nesse filme em que isso é verdade, especialmente a música que toca quando o vilão e sua namorada estão no ônibus.
Em suma, um divertido thriller de gato e rato que os fãs do gênero e dos atores vão adorar. Letterboxd
TODAY SCHEDULE
Sky on Fire
Running Out of Time
Running Out of Time II
The Russians Are Coming! The Russians Are Coming!
O cinema de Johnnie To
Johnnie To é um diretor e produtor de cinema mais prestigiado de Hong Kong, sua terra natal. No entanto, o cineasta também possui grande reconhecimento no exterior.
Considerado como extremamente prolífico, To já realizou uma série de filmes com diferentes gêneros. Embora seja mais reconhecido por seus filmes de ação, que receberam críticas positivas e diversos seguidores, incluindo o próprio Quentin Tarantino, que já afirmou gostar dos filmes de To.
Não é a toa que os seus filmes foram exibidos em grandes festivais estrangeiros e foram bem recebidos, tanto pelo público quanto pela crítica. Ficou interessado para conhecer um pouco mais sobre esse cineasta e quais são as suas obras? Então continue lendo!
A Carreira De Johnnie To
Johnnie To Kei-fung nasceu no dia 22 de Abril de 1955, em Hong Kong, China. É possível dizer que To começou a seguir os seus passos no cinema ainda cedo, pois quando possuía cerca de 17 anos de idade, começou a trabalhar como mensageiro de um estúdio de televisão de Hong Kong.
A partir de então, To aos poucos foi subindo de cargo em sua carreira. De mensageiro, passou a ser produtor executivo e diretor de programas de televisão em meados de 1973. Sendo assim, decidiu arriscar-se como diretor.
Por volta de 1978, To dirigiu o seu primeiro longa-metragem, porém, continuou com o seu trabalho na televisão, até que em 1983 dirigiu uma série de televisão chamada The Legend of the Condor Heroes, que foi imediatamente um sucesso de crítica.
O reconhecimento internacional
Alguns anos depois, em 1989, arriscou-se novamente na direção, dessa vez com o filme All About Ah-Long, que foi considerado como um dos maiores sucesso de bilheteria naquele mesmo ano. No final da década de 80, To dirigiu outros filmes que foram também um sucesso comercial, sendo a maioria de comédia.
Já em 1996, To e Wai Ka-Fai uniram e fundaram a Milkyway Image, uma produtora de filmes independentes e de baixo orçamento. Contudo, foi em 2011 que To passou a ser popular internacionalmente.
Nesse ano, o diretor fez parte do júri da competição principal do Festival de Cannes. E, além disso, o seu filme Life Without Principle foi considerado para concorrer ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, porém, acabou não entrando para a lista final.
Sem dúvida, ficando cada vez mais prestigiado em sua terra natal, To também passou a ganhar reconhecimento em solos estrangeiros. Vários de seus filmes foram exibidos em festivais importantes, além de serem indicados para uma série de premiações.
Filmes marcantes de Johnnie To
Johnnie To é, sem dúvida, um cineasta prolifero, pois possui uma extensa filmografia com obras que retratam diferentes temas e assuntos. Na maioria das vezes, o diretor colabora com os mesmos atores, roteiristas e cineastas.
To gosta de explorar em suas obras temas relacionados com a amizade, destino e também as mudanças que a sociedade de Hong Kong tem passado. Embora seja um diretor camaleão, por sua capacidade inata em mudar os gêneros de seus filmes com extrema facilidade, To ainda permanece fiel ao seu estilo, que é uma espécie de mistura entre um realismo com observações sociais.
De acordo com o próprio Johnnie To, King Hu foi um dos diretores que mais exerceu influência sobre o seu trabalho.
Sendo assim, confira a seguir quais são as obras mais marcantes da carreira de Johnnie To como cineasta!
Exilados (2006)
Macau é uma cidade onde todos buscam uma forma de ganhar dinheiro. No entanto, um membro renegado que está em busca de começar uma nova vida ao lado de sua família, começa a ser procurado por uma dupla de mafiosos. Porém, eles enfrentam um dilema com dois membros antigos da máfia, que possuem o objetivo de proteger o alvo deles. Desse modo, uma foto de infância mostra que esses homens estão ligados e que devem permanecer leais uns aos outros.
Eleição (2005)
Os líderes de gangues rivais estão em uma luta para ver quem será o novo presidente da sociedade Tríade de Hong Kong.
Guerra às Drogas(2012)
Quando o chefe de um dos maiores cartéis de drogas chinês é preso, ele concorda em colaborar com a polícia para entregar os seus parceiros de crimes e escapar da pena de morte.
Eleição 2: A Tríade (2006)
Como acontece a cada dois anos, os membros da mais antiga tríade de Hong Kong, a Sociedade Wo Shing, chegou a hora de eleger um novo presidente. Desse modo, começa uma rivalidade entre aqueles que estão disputando esse cargo. O favorito para vencer é Lok, porém, o seu rival Big D fará de tudo para que isso não aconteça, até mesmo influenciar o voto com dinheiro e violência.
Jogo da Vingança (1999)
Bun é um ex-detetive que deverá usar de sua intuição para desvendar os crimes, ao ser chamado por um policial, que está investigando o desaparecimento de um de seus colegas. Johnnie To é, de fato, um camaleão. O diretor consegue mover-se e adaptar-se dentro da indústria cinematográfica.
To consegue retratar qualquer tipo de gênero em suas obras, desde filmes de ação no estilo gangster, até mesmo as comédias românticas. O diretor possui a habilidade única de incorporar tais temas ao seu próprio estilo único e inconfundível. Porém, sem alterar a essência de suas obras. De fato, é um camaleão que se adapta muito bem em qualquer cenário ou tema.
Em Hong Kong, sua terra natal, o cineasta é amplamente prestigiado e considerado como um dos melhores diretores. Já no exterior, pouco a pouco o cineasta vem conquistando o seu espaço.
Por fim, o que você achou desse conteúdo? Já assistiu algum filme do diretor? Qual a sua opinião a respeito? Não esqueça de deixar um comentário!
09/07/25
Hipotermia, Patrick Leung, 1996
Review by Lou (rhymes with wow!) [Tradução livre]
Outro drama policial produzido por Johnnie To, mas dessa vez dirigido por Leung Pak-Kin (também conhecido como Patrick Leung), que eu não conheço. É um filme interessante. Uma coprodução de Hong Kong e Coreia do Sul sobre uma assassina que é contratada para matar chefes da máfia.
Wu Chien-Lien, que eu adorei em J̶o̶h̶n̶n̶i̶e̶ ̶T̶o̶'̶s̶ A Moment of Romance, de Benny Chan, interpreta a assassina. O ator sul-coreano Han Jae-Suk interpreta o guarda-costas de um dos alvos de Wu. E o sempre ótimo Lau Ching-Wan (já são dois filmes seguidos) tem um papel coadjuvante como o interesse amoroso de Wu.
É um filme de ação, mas fica um pouco aquém quando comparado ao excelente Expect the Unexpected de ontem. No entanto, ainda há muitas sequências de ação incríveis, e há um forte núcleo emocional em todos os personagens. Wu mostra uma grande variedade e basicamente é a responsável por esse filme. Han não fez muitos filmes, mas também é sólido, e Lau está mais relegado ao segundo plano desta vez, mas ainda consegue se tornar o coração do filme. Molho incrível. Letterboxd
11/07/25
O anjo embriagado, Akira Kurosawa,1948
Resenha de Filme: O Anjo Embriagado, de Akira Kurosawa (1948)
Emerson L. S. Iaskio, jun 13, 2017
Título: O Anjo Embriagado, Lançamento: 1948, Diretor: Akira Kurosawa
O que faz um ser humano sentir empatia pelo outro? É possível enxergar alguma virtude em uma pessoa cheia de vícios? Essas e outras perguntas são levantadas no primeiro filme de relevância mundial produzido por Akira Kurosawa. É uma obra que promove uma grande reflexão ao retratar o relacionamento do Médico alcoólatra Doutor Sanada e o boêmio e mafioso Matsunaga, membro da Yakuza, que sofre de tuberculose. A insistência do médico em encontrar um lado bom no bandido, de um lado, e a recusa ao tratamento por parte do mafioso, do outro, dão o tom principal do filme. Ao mesmo tempo, a obra também retrata um Japão decadente após a Segunda Guerra Mundial, já completamente fortemente influenciado pela cultura ocidental, o que pode ser visto em anúncios em neon escritos em inglês na frente de alguns estabelecimentos.
A metáfora da doença descreve não apenas a relação entre médico e paciente, mas também o próprio país doente, todo em ruínas e com uma máfia instalada. Um mangue poluído é destacado, com uma música triste ao fundo, sempre que algo de ruim está para acontecer. As pessoas, além de não fazerem nada para despoluir o mangue, ainda jogam lixo, ajudando a poluir ainda mais. Cenas de ruínas também merecem vários destaques no filme. Um país doente, com pessoas doentes, que, ao invés de se tratarem ou tratarem o país, continuam a fazer mal a si mesmas e a poluir ainda mais o mangue, cujo mal cheiro é frequentemente mencionado. O principal médico do local também é decadente: usa sempre a mesma roupa, quase não toma banho e é alcoólatra. A sua clínica é muito precária e simples, mas retrata a consequência da opção de Sanada em tratar das pessoas mais pobres. Um dos melhores amigos de Sanada, seu colega de faculdade, no entanto, ao optar por tratar de pessoas ricas em uma clínica destinada a pessoas de posses, possui um bom carro, veste roupas caras e fuma charuto.
Assim como as pessoas insistem em continuar poluindo o mangue, também o mafioso Matsunada continua poluindo o próprio corpo, bebendo e fumando, destruindo-o ainda mais, acelerando a doença. Matsunaga é merecedor do respeito dos comerciantes do local, que sempre o reverenciam, curvando-se quando ele passa, e oferecendo produtos de graça. O filme modifica completamente quando um bandido mais antigo, porém mais saudável que Matsunaga, aparece, enquanto este se definha cada vez mais. Matsunaga perde o seu espaço e o prestígio que tinha, enquanto morre aos poucos. Ao mesmo tempo, o Doutor Sanada trata de uma menina de 17 anos que, seguindo fielmente as instruções do médico bêbado, se cura completamente da doença. É aqui que a relação mestre-discípulo mostra a sua principal faceta: quem segue as instruções do mestre, é curado. Quem não segue, perece e morre.
O final do filme possui o forte tom de se seguir os conselhos de quem é mais sábio: quem cede aos vícios perece. Quem os vence, continua a sua batalha. A metáfora de duas pessoas viciadas ajudando-se mutuamente, buscando cada uma o que há de melhor na outra, mostra que todos possuem vícios e virtudes, e que cabe a cada um vencer os vícios para curar-se ou fugir para outra cidade, menos doente. A opção de Sanada em continuar na cidade mostra que ele consegue enxergar no meio da doença e da poluição alguma esperança.
As duas metáforas, a da relação mestre-discípulo, e da sociedade doente, mostram ao expectador que há esperança de cura para a sociedade, e que, apesar de difícil, é possível enxergar qualidades, mesmo em um bandido. Embora seja uma filmagem em preto-e-branco, datada da primeira metade do século passado (1948), a mensagem transmitida é atemporal. Merece destaque a preocupação ambiental, já naquela época, com o mangue poluído, e o anti-tabagismo do Doutor Sanada numa época em que fumar era algo comum.
12/07/25
Amar e morrer, Douglas Sirk, 1958
Crítica | Amar e Morrer (1958) por Ritter Fan, 25 de junho de 2018
Apreciar Amar e Morrer pode ser fácil se esquecermos o uniforme do protagonista, um soldado alemão passando três semanas de licença depois de lutar por dois anos na Segunda Guerra Mundial. Vivido pelo então desconhecido ator americano John Gavin, o personagem é bonito, amável e cheio de dúvidas sobre o que é certo e o que é errado, algo que fica evidente logo no introito quando quase (e a palavra chave é “quase”) se recusa a fuzilar civis no front russo. Chegando em sua cidade natal em desesperada procura por seus pais, ele se apaixona por uma jovem e o filme foca nesse improvável relacionamento em um tempo de destruição máxima, com a Alemanha nazista na esquina de ser definitivamente derrotada.
No entanto, ao lembrarmos que Ernst Graeber (o personagem de Gavin) é alemão, que matou inocentes e que fica claro que ele sabe mais dos horrores da guerra que deixa entrever, o espectador é jogando na dúvida. Afinal, como simpatizar com ele? Ele é o inimigo! Pode não ser um membro da SS ou da Gestapo, mas, mesmo assim, Douglas Sirk nos pede que simpatizemos por ele, que vivamos essa sua vida e não a de outra pessoa do lado de lá do conflito.
E aí é que, de repente, percebemos o feito que o diretor alcançou em Amar e Morrer, seu penúltimo longa. Em poucas palavras, pode-se dizer que essa fita é uma das mais importantes obras de Sirk e um grande libelo anti-belicista de talvez o maior romancista alemão com essa pegada: Erich Maria Remarque, que faz ele próprio uma ponta no filme como o Professor Pohlmann, perseguido pelos nazistas por ajudar judeus.
Sirk, alemão radicado nos EUA, volta à sua terra natal – o filme foi fotografado em locação em estúdio na Alemanha Ocidental – e, sem qualquer traço de vergonha, manobra o espectador como ninguém, fazendo-nos simpatizar imediatamente com Graeber, mesmo antes de ele chegar em sua cidade natal. E essa identificação com o personagem aumenta graças à atuação estilo “homem comum” de Gavin, sob a certeira batuta de Sirk, que não permite muito facilmente que atitude galã do ator enevoe o objetivo de seu trabalho, que é primordialmente discutir sobre quem é o responsável por atos terríveis, o mandante ou o mandado, quem dá as ordens ou quem as recebe ou se é uma mistura dos dois.
Mais até do que nos fazer gostar de Graeber, Sirk, ao nos impedir uma perspectiva externa – nunca vemos os soldados Aliados – deixa evidente que o povo alemão, aqueles de pequenos vilarejos e cidades, sofreu tanto quanto qualquer outro povo passando por uma guerra, com bombardeios constantes, fome, doenças e a perspectiva de morte a qualquer momento. Tendemos a esquecer isso, não é mesmo? Esquecemos que a história é contada pelos vitoriosos e é fácil simpatizar com franceses, ingleses e americanos, mas não com a dureza da vida dos alemães comuns, aqueles que não fazem ideia do que se passa ao redor.
Para impulsionar essa trama sombria para frente, o roteiro de Orin Jannings, que sofreu intervenções do próprio Remarque carrega um pouco no melodrama, algo já esperado de uma obra de Sirk, na verdade, floreando talvez exageradamente o romance de Graeber com Elizabeth Kruse (Liselotte “Lilo” Pulver) e fazendo paralelos visuais com a primavera antecipada não naturalmente, mas pelo calor das bombas agindo na vegetação local. A metáfora funciona, mas o que realmente nos amarra na simples, mas grave história é a química entre Gavin e Pulver. É simplesmente impossível não ficar aflito com o amor quase inocente entre os dois, com o sorriso absolutamente inebriante de Pulver (é de se apaixonar à primeira vista, literalmente) e pelo tom fatídico da trilha sonora e, claro, pelo título da obra, que é um spoiler em si mesmo, mas um spoiler que já esperamos, que aprendemos que é inevitável, mas que desejamos, lá no fundo e com muita força que não se realize. É Sirk, mais uma vez, nos fazendo sair em defesa do soldado alemão, do inimigo, do mandatário de ordens moralmente inaceitáveis.
Agora imaginem vocês isso em 1958, meros 13 anos após o final da guerra. Imaginem um diretor pedindo – exigindo e conseguindo! – que você torça pelo “nazista”, pelo representante do Holocausto. Imaginem a coragem desse filme em sua época, coragem essa ainda perfeitamente palpável nos dias de hoje (o filme chegou a ser banido em Israel pela visão “simpática” dos alemães). O que Sirk conseguiu em Amar e Morrer, considerando quando e onde conseguiu, é quase inacreditável.
Ajuda muito o realismo da obra o fato de ela ter sido filmada grande parte em locação. O ar de urgência se mantém com uma fotografia severa e paleta de cores entristecidas, mas com momentos de cores alegres, mas não tanto, que lembram, mas não nos deixam ver tempos de paz, como a cor rosa do vestido de Kruse que ecoa o rosa da “flor da guerra” nascendo de uma árvore semi-destruída.
Apreciar Amar e Morrer é dolorosamente fácil. O tom finalista e moralista já imposto no título e a armadilha armada por Sirk nos arremessa para algo que não queremos gostar, mas que não podemos evitar. É a magia do Cinema nos pregando peças e nos fazendo pensar.
13/07/25
A morte não manda recado, The ballad of Cable Hogue, Sam Peckinpah, 1970
Crítica | A Morte Não Manda Recado por Luiz Santiago, 16 de junho de 2019
A produção de A Morte Não Manda Recado (1970) começou quase que imediatamente após o encerramento de Meu Ódio Será Sua Herança e, de cara, impressiona pela diferença de tom entre os dois filmes, de um lancinante, genial e violento Zapata western para um “death of the west film“, ou seja, uma obra daquelas temáticas de decadência que mostravam a transição entre o mundo do Oeste selvagem e o mundo moderno — e sobre esse tipo de abordagem, vale pegar como exemplo a bandeira americana hasteada no filme, que conta com apenas 46 estrelas, o que coloca historicamente os eventos da obra entre o final de 1908 e o início de 1912. De Meu Ódio… vieram para cá os atores L.Q. Jones e Strother Martin, assim como parte da equipe de produção, mas boa parte dessa equipe não ficaria muito tempo no cargo.
O sucesso de The Wild Bunch deu a Sam Peckinpah um temporário momento de confiança frente aos produtores, que já tinham os dois pés atrás com o diretor, que era amplamente conhecido por ser bastante difícil nos sets e também por beber muito. Embora isso nunca o tenha impedido de trabalhar de verdade, suas filmagens sempre atrasavam porque as exigências colocavam atores, técnicos, agentes e produtores em discussão, processo que muitas vezes tinha o azar de combinar com dificuldades climáticas nas locações, problemas de saúde de alguém do elenco e outros pequenos problemas mais ou menos esperados durante a produção de um filme, e em The Ballad of Cable Hogue não foi diferente. Ao longo da produção, o diretor demitiu 36 pessoas da equipe técnica e a única relação harmoniosa e feliz foi junto aos atores, tanto que o diretor nunca escondeu que este era o seu filme favorito e que teve “alguns dos melhores momentos de sua carreira” durante as filmagens.
Em dado momento, o mau tempo impediu que a rodagem continuasse, então o diretor fez questão de convidar a todos para beber e se divertir com ele num bar próximo ao set, gerando uma “pequena contra” de 70 mil dólares. No final, A Morte Não Manda Recado atrasou 19 dias de produção e ultrapassou muito o valor do orçamento inicial, algo que mancharia para sempre a reputação de Sam Peckinpah frente aos estúdios. Com tudo considerado, é até impressionante que o filme, escrito por John Crawford e Edmund Penney, tenha terminado acima da média.
A história tem o caráter sujo e cruel que conhecemos bem dos faroestes de Peckinpah e conta a história de Cable Hogue (Jason Robards), que é abandonado no deserto, sem água, pelos seus parceiros de mineração. A trama de sobrevivência protagonizada por ele, seu plano de vingança e um tipo bem cínico de humor são os ingredientes centrais da obra, que também conta com algumas cenas musicais, das quais gosto apenas da inicial e da final.
Também fazem parte dessa jornada o reverendo Joshua Douglas Sloan (David Warner) e Hildy (Stella Stevens), duas figuras que, com dificuldade, firmam laços com o protagonista, sendo esta uma das coisas mais interessantes do roteiro. A história de amor aqui está marcada por um ponto trágico que cresce à medida que o filme se aproxima do final, mas nunca deixa de lado a aparência cômica, tanto em relação à libido de Hogue quanto a do reverendo Joshua. Também se acerta de forma bastante inteligente o plano de vingança de Hogue contra a dupla que o deixou para morrer de sede no deserto. A direção de Peckinpah na parte final recusa o embate épico mas não tira de cena o “suspense” ligado ao duelo nos faroestes, sendo toda a sequência de retorno dos capangas ao próspero posto chefiado por Hogue o incomum clímax do longa.
SPOILERS!
Pelo título — A Balada de Cable Hogue –, o espectador já deve esperar que uma morte ou algo profundamente solene faça parte do enredo e é nesta camada que o texto assenta o final, talvez com um discurso longo demais e meio chateante de Joshua, mas que na verdade consegue fazer o seu papel de memória para o interessante homem que acabara de morrer. A fita mistura alguns gêneros cinematográficos e desenvolve personagens de uma maneira relativamente incomum para o cineasta, no que concerne à violência, mas todos os outros elementos muito caros ao diretor se fazem presentes. Os momentos em que a montagem não sabe como fazer a passagem do tempo ou os pouco interessantes números musicais no meio da fita não roubam totalmente a nossa diversão e, ao cabo, compreendemos estar diante de mais um marcante filme de Sam Peckinpah, um western de amargo desfecho, claramente acenando o fim de uma Era.
14/07/25
Desafio radical, 2002, Christian Duguay
Sinopse
O publicitário Jeffrey (Rupert Graves), o diretor Ian (Rufus Sewell) e o operador de câmera Will (Devon Sawa) formam uma equipe unida, que são famosos por sempre conseguirem rodar as cenas necessárias para um comercial de TV. Até que um de seus clientes pede uma cena considerada impossível de ser feita: a de esquiadores descendo uma montanha com uma avalanche atrás deles. Decididos a cumprir a tarefa o trio parte para os Alpes austríacos, juntamente com três esquiadores profissionais. Porém, o que eles não sabem é que no local para onde estão indo está escondido Slobodan Pavle (Klaus Löwitsch), um perigoso criminoso sérvio, que está junto a uma gangue de terroristas. Adorocinema
marcus christian 1 ano atrás
e a vulgo inexistência do temor a riscos, mas muito pelo contrário, ou seja a disposição em prol de outrora no mínimo experimentar sensações em especial fisico emocionais, bastante aquém das que em geral a maioria dos homo sapiens no maximo tendem a restringir se a ações tradicionais, nisto quando e se preciso o for por razões de fortuitas, passando pelas obrigatórias, até logico as compulsórias irrecusáveis a contento, de forma que para os aqui yankes movidos pela mistura de adrenalina esportiva polar bastante comum aos desportos de inverno, até aquela que por obstante todos sem exceções em algum momento estariam dispostos, alem de DANEM SE opiniões divergentes, ou seja os objetivos MERCANTILISTAS, nao importando que junto ao caso expecifico supracitado a este BOM longa metragem há exatos 22 anos, questões artisticas publicitarias assim idem misturaram se ao risco " na veia " por parte de devon sawa, ruffus sewell, e cia ltda, que no entanto a quem interessar ou nao possa, pasmem por mais que nao pareça, o "radicalismo" periculoso dos alpes austriacos nao seria a maior preocupação, + sim a periculosidade humana local estrangeira, misturada a todo resto obvio, como se ja não houvesse o antropologico suficiente, se é que porventura ou nao me entendem, resumindo senhoras e senhores, " desafios pela manutenção da vida " e nao de escalada trariam as emoções devidas, agora se todos respirariam acima de sete palmos de neve, ao inves de muito abaixo bem ? aproveitem a " temporada " aforística para que interesse e oportunidade respectivamente surjam, e fim de papo. Desafio Radicalisticamente " NOTA 9.0. Filmow
15/07/25
Mistérios e paixões, 1991, David Cronenberg
William S. Burroughs nas palavras de uma personagem
Eles podem pintar, ou desenhar, ou escrever e então entregar para alguém.
Eles lá tem o que você escreve e então re-experimentam.
Esta não é a única conexão que você tem com isso, cara.
Então você não pode reescrever...porque reescrever é iludir e mentir...e você acaba traindo seus pensamentos.
Repensar o fluxo, o ritmo e a forma das palavras...É uma traição.E um pecado, Martin.
É um pecado.
Mistérios e paixões | Crítica, Rafael Assis, 29 de julho de 2021
“Mistérios e Paixões” (Naked Lunch no original), de David Cronenberg é um filme de muitas camadas, que perpassa cinema, literatura e o fazer artisítico em uma viagem lisérgica e bizarra. Quem conhece a obra literária de William S. Burroughs costuma tratá-lo como é uma das figuras mais patéticas da literatura moderna, sua tristeza tornou-se mais comovente por ter se arrastado por tanto tempo. E em um documentário recente sobre sua vida, Burroughs apareceu como um homem que anda por aí com algo ferido por dentro, algo que dói tanto que seu espírito simplesmente se fecha.
O diretor de “A Mosca”, “Gêmeos – Mórbida Semelhança” e “Scanners” certamente não decepciona os fãs da sua engenhosidade diabólica. Mas, mesmo Cronenberg, diante da tarefa impossível de adaptar literalmente “Naked Lunch”, precisa de uma saída inteligente para enfrentar o texto desconexo e alucinatório de Burroughs. E essa saída é tratar o livro original como uma espécie de fonte secundária.
Em vez da adaptação literal ou a completa releitura, o diretor concentra-se no próprio Sr. Burroughs, em sua experiência com drogas que influenciaram sua escrita e nas agonias do processo criativo de se escrever.
Além disso, Cronenberg também elabora cenas que são versões puramente metafóricas dos cenários sexuais selvagens e violentos do autor. O resultado consegue o impensável: sendo brilhante e vil, surge na tela um estilo de filme tão audacioso quanto aquilo que Burroughs construiu nas páginas.
A trama acompanha as aventuras de Bill Lee, interpretado por Peter Weller como uma evocação divertida e impassível do autor (Lee era o nome de solteira da mãe do Sr. Burroughs e William Lee seu pseudônimo), e o filme começa com pequenos insetos. Em seguida, conhecemos outros insetos cada vez mais enormes, mais horríveis e inteligentes.
Contar mais aqui sobre a sinopse de pouco ajudaria, afinal, como eu os convenceria a ver um filme com maquinas de escrever que se tornam besouros que se comunicam através de um enorme ânus ou cloaca (queria eu usar aqui a palavra chula de duas letras, mas é um blog de familia). Antes disso, embora completamente diferente do livro que lhe deu origem, a minha recomendação é que se conheça a obrqa original e a tragetória de Burroughs e o seus contemporâneos (há no filme as contrapartes metafóricas para Jack Kerouac e Allen Ginsberg).
No fim, temos aqui uma representação aterrorizante e melancólica do fazer artístico. E se o terror representado de forma tão astuta e doentia em “Naked Lunch” é representativo, é um milagre que os artistas sobrevivam a todo esse processo criativo.
17/07/25
Amor maldito, Adélia Sampaio, 1984
No iutubi aqui
Adélia Sampaio imdb
CINEMAMM: "Coragem e luta: o cinema de Adelia Sampaio" vídeo
A trajetória de Adélia Sampaio no cinema brasileiro (1984-2017): críticas à sociedade conservadora - texto
O MUNDO DE DENTRO - Adélia Sampaio
Pagina no iutubi de Adelia Sampaio
17/07/25
Justiça de um bravo, The Jack Bull, Filme p/ TV, 1999, John Badham
No iutubi aqui
Review by , Andy Summers (tradução livre)
Esse faroeste televisivo foi ao ar originalmente na HBO em abril de 1999, mas, de alguma forma, tem a mesma sensação da série Deadwood, que apareceu cinco anos depois. Passa-se no Território de Wyoming, em um período semelhante àquele em que a Dakota do Sul se tornou Estado, que apareceu em Deadwood :The Movie, de Daniel Minahan, em 2019, com os habitantes do território em busca de lei e ordem e do fim da opressão implacável que os proprietários de terras e barões do gado podiam exercer sobre os fazendeiros comuns e os habitantes da cidade. Um filme sobre a luta de um homem por um acordo justo e justiça em uma terra corrupta e implacável, estrelado por John Cusack como Myrl Redding no papel principal e um L. Q. Jones como antagonista. Q. Jones como o antagonista, Henry Ballard.
O filme gira em torno de Ballard, interpretado por Jones, e sua aversão ao desejo de Wyoming de se tornar um estado, o que reduziria seus interesses comerciais e traria lei e ordem ao pequeno vale. A decisão de Ballard de instalar um pedágio na estrada principal para Casper será a primeira de uma série de eventos que o colocarão em conflito direto com o criador de cavalos Redding, que não pode pagar o pedágio de US$ 10, mas precisa levar seus cavalos ao mercado. Ele deixará seus dois garanhões premiados como garantia até que retorne, juntamente com seu ajudante nativo americano Billy, para proteger os cavalos.
Quando Myrl retorna, encontra Billy desaparecido e seus garanhões desnutridos e maltratados, o que dá início a uma guerra de palavras com Ballard e seus capangas. Ele insiste que quer que seus cavalos lhe sejam devolvidos no estado em que os deixou e, quando descobre que Billy foi muito espancado, procura um advogado com a intenção de processar Ballard por danos aos cavalos e ao seu capataz. É aí que começa a corrupção e, após um longo período de inação, seu caso é arquivado por um juiz local que está no bolso de Ballard. Quando a esposa de Myrl decide ir a Casper para falar com o Procurador Geral, os homens de Ballard estão esperando por ela e por Woody, o ajudante do rancho de Myrl. Woody é gravemente espancado e a esposa de Myrl, Cora, é morta na frente de uma charrete desgovernada, pondo fim a qualquer chance de uma solução pacífica para a questão. A busca de Myrl por justiça o levará a fazer justiça com as próprias mãos, pois seus pedidos de ajuda são ignorados.
Quando Myrl retorna, encontra Billy desaparecido e seus garanhões desnutridos e maltratados, o que dá início a uma guerra de palavras com Ballard e seus capangas. Ele insiste que quer que seus cavalos lhe sejam devolvidos no estado em que os deixou e, quando descobre que Billy foi muito espancado, procura um advogado com a intenção de processar Ballard por danos aos cavalos e ao seu capataz. É aí que começa a corrupção e, após um longo período de inação, seu caso é arquivado por um juiz local que está no bolso de Ballard. Quando a esposa de Myrl decide ir a Casper para falar com o Procurador Geral, os homens de Ballard estão esperando por ela e por Woody, o ajudante do rancho de Myrl. Woody é gravemente espancado e a esposa de Myrl, Cora, é morta na frente de uma charrete desgovernada, pondo fim a qualquer chance de uma solução pacífica para a questão. A busca de Myrl por justiça o levará a fazer justiça com as próprias mãos, pois seus pedidos de ajuda são ignorados. Letterboxd
18/07/25
Justiça cega, Blind Justice, Filme p/ TV, Richard Spence, 1994
No iutubi aqui
Canaan (Armand Assante) tem um peso enorme a carregar. Dois, aliás: no passado, vacilara na hora de salvar uma menina, na aldeia fustigada pela Guerra Civil. Perdera a garota e também boa parte da visão. Ainda que vendo vultos, conseguira exterminar muitos homens nas terras sem lei do Oeste americano, mas acaba tendo que ficar com o bebê de um deles! Canaan logo se transforma em uma espécie de vingador justiceiro da cidade de San Pedro, assediada por um bando de sanguinários. Ele aniquila o filho do chefão e incita uma raiva ainda maior nos sem-caráter. Apaixonado pela mulher que lhe acolhera, ferido e ao bebê ele quase não transparece o sentimento. Filmow
19/07/25
Django, Sergio Corbucci, 1966
No iutubi aqui
DJANGO (1966) – OBRA-PRIMA DO GÊNERO SPAGHETTI WESTERN
Cícero Tavares, Publicado em 9 de janeiro de 2024
A cena de abertura do epopeico faroeste do gênero spaghetti western, Django, é antológica: um lamaceiro escorregadio como cenário natural. A câmara focando um homem solitário, arrastando um caixão fantasmagórico pelo lamaçal caótico, acompanhado da antológica trilha sonora Django, composta pelo maestro argentino-italiano Luis Enríquez Bacalov, apropriada para o clima sinistro da história do filme.
O filme Django conta a história de um andarilho misterioso, arrastando sua poderosa metralhadora, disposto a vingar a morte de sua esposa, assassinada por uma gangue rival que agia na região fronteiriça do México. Para conseguir seu feito ele fez “acordo” com o chefe da gangue comandada pelo general Hugo Rodriguez, bandido histriônico, calculista, ambicioso, contra seu oponente, louco, o Major Jackson, da gangue rival e seus mais de quarenta facínoras, sanguinários, que aterrorizavam a fronteira do México.
É um dos melhores exemplos de filmes do gênero spaghetti western, com uma trilha sonora apropriada ao clima da história, duelos de armas e um anti-herói de poucas palavras, que arrasta um caixão mortífero. O visual magnífico do filme é devido ao trabalho do diretor de arte Carlo Simi, que já havia criado personagens e cenários para filmes anteriores do diretor Sergio Corbucci, como o “Minnesota Clay.”
Antes e depois da primeira cena antológica do confronto entre Django com a metralhadora e o mais de quarenta bandidos da gangue dos Camisas Vermelhas comandada pelo Major Jackson em frente ao Saloon do Nathaniel, ficou a impressão de que estávamos diante de mais um western lugar-comum, mas ante a competência do diretor Sergio Corbucci o que vemos é um filme com cenário de batalha expertise, épica, que até hoje fascina crítico e cinéfilo que o elogiam como uma obra-prima do spaghetti western.
Django é o primeiro, o único faroeste do western sphaghetti a conquistar público e críticas favoráveis. Projetou o ótimo ator Franco Nero ao panteão dos deuses do faroeste numa época em que o romantismo reinava no faroeste americano. Todos logo identificamos o primeiro e o melhor da franquia. Sim, o nome Django tornou-se uma franquia, pois existem muitas dezenas de filmes relacionados ao personagem famoso, talvez chegue perto de meia centena de filmes, todos com adjetivos diversos, títulos chamativos, mas nenhum chegou perto do original que permanece eterno, com a matriz intocada, sem nada que possa abalar a sua merecida fama.
No ponto de vista cinematográfico, o único filme que chegou quase a merecer comparação com a qualidade do original, foi o filme “Django Livre” do diretor Quentin Tarantino. A comparação que se faz é apenas pela qualidade do filme, seus valores cinematográficos, seu ótimo elenco, que contou acertadamente com a participação do “Django” original, Franco Nero, numa pequena atuação, mas uma grande e merecida homenagem prestada pelo cineasta Tarantino ao grande ator, criador do personagem cujo nome, até hoje impressiona os aficionados do gênero. O filme cria um clima místico e quase sobrenatural, quando o personagem aparece do nada arrastando um caixão, com uma aparição fantasmagórica deixando todos os telespectadores surpresos. O diretor Sergio Corbucci soube segurar com muita competência e profissionalismo essa atmosfera sombria.
Nada de parecido tinha sido visto antes nos filmes do gênero western, e a expectativa vai num crescendo para todos os personagens do vilarejo e muito importante, também para nós os expectadores do filme, pois o que vai ou poderá acontecer é uma incógnita.
Mas o diretor Sergio Corbucci mostrou que é um mestre, pois os fatos vão se sucedendo até que afinal o inesperado é revelado e com a sucessão dos acontecimentos, os vilões são enfrentados e como em todo bom filme de faroeste, o mocinho vence no final para satisfação de todos.
Ressalte-se ter sido lançado uma grande quantidade de filmes que levam o nome Django, com dezenas de atores que tentaram imitar o personagem-título do primeiro, mas nenhum deles possui a competência do filme e ator original. Não que não sejam bons atores, porque o personagem do primeiro é muito místico, sombrio, e o ator deu ao personagem principal uma áurea, um desempenho extraordinário que nenhum outro filme de faroeste conseguiu alcançá-lo.
29/07/25
Caçadores de recompensas, Dead for a dollar, 2022, Walter Hill
Review by Filipe Furtado (tradução livre)
Dead for a Dollar é dedicado a Budd Boetticher, mas parece mais próximo, em espírito, dos filmes de Randolph Scott Andre de Toth, que geralmente eram mais movimentados e o tornam mais um homem da lei em posição difícil. Tem uma qualidade muito enxuta de filme B dos anos 50. Há mais de cinco décadas não se via um faroeste de um cineasta conhecido com pretensões tão pouco artísticas (incluindo as primeiras tentativas do próprio Hill no gênero). Dead for a Dollar é muito feliz por ser a história de um homem moral forçado a lidar com o fato de que fazer o que é certo para os outros é mais do que a letra da lei, um tema muito clássico do faroeste. O filme é muito bom em explorar o material atual de uma forma honesta com seu cenário de época, sem nunca se entregar ao sadismo. O filme é um pouco movimentado, e o personagem de Dafoe, em particular, parece um resquício do tema caçador/caçado favorito de Hill que existe fora do filme, embora ele seja muito divertido. Um filme raro em que todos os personagens significativos quase sempre fazem a escolha certa. É um filme muito barato, muito econômico, sem detalhes de época e a cinematografia digital pode parecer superficial (mas não me importo com o visual marrom que parece incomodar alguns). Salvo no final, essas virtudes são vistas como virtudes, pois acrescentam a qualidade essencial que sempre serve ao gênero. Os tiroteios são rápidos, mas mais pesados e quase todos no elenco estão muito bem, em particular Waltz. Como um ato de recuperação de certas formas de ficção de uma maneira que faz seu passado valer sem cair no fetiche, esse é um filme notável. Letterboxd
30/07/25
Copenhagen, Filme TV, 2002, Howard Davies
Copenhagen (2002) por fjresende - dezembro 30, 2015
Filme produzido para a televisão britânica BBC, dirigido por Howard Davies com base em uma peça de teatro de enorme sucesso escrita por Michael Frayn.
Durante a segunda guerra mundial o físico alemão Werner Heisenberg (Daniel Craig) visita o físico dinamarquês de origem judaica Niels Bohr (Stephen Rea) em Copenhagem.
Quem são Bohr e Heisenberg?
Em 1913 Niels Bohr, trabalhando com Ernest Rutherford, propõe o modelo atômico que inclui a quantização da energia e do momento. Em 1922 Bohr recebe o Prêmio Nobel de Física por seus estudos da estrutura do átomo e da radiação que o átomo emite.
Heisenberg trabalha com Bohr em Copenhagen entre 1924 e 1927 e, juntamente com outros físicos, estabelece as bases da Mecânica Quântica com explicações para diversos fenômenos físicos em um arcabouço teórico conhecido como interpretação de Copenhagen. Em 1927 Heisenberg elabora o Princípio da Incerteza e suas contribuições à Física levaram-no a receber o Prêmio Nobel em 1932.
Bohr e Heisenberg eram grandes amigos até a guerra começar e eles ficarem em lados opostos.
Em 1941 a Dinamarca estava ocupada pelos nazistas, Heisenberg trabalhava no programa nuclear alemão e Bohr e sua esposa Margrethe Bohr (Francesca Annis) o recebem com a tristeza natural da situação e muita desconfiança.
Porque Heisenberg vai à Copenhagen em 1941?
No filme o evento é mostrado de forma fragmentada e em dois momentos, como uma recordação no diálogo entre os espíritos dos envolvidos nos dias de hoje e o encontro de 1941 em si. A fotografia é que diferencia os dois momentos e a estrategia usada introduz uma incerteza temporal muito pertinente.
Os três protagonistas falam sobre Física, politica e a guerra e o diálogo muitas vezes é tenso e dramático.
O filme é excelente! A fotografia é muito bem elaborada com imagens lindas da cidade de Copenhagen (que é praticamente um personagem do filme) e uma música delicada que dá ao filme um tom nostálgico e triste, muito relacionado com a guerra e o consequente fim da amizade entre o casal Bohr e Heisenberg. Em vários momentos o filme é de difícil compreensão, principalmente para quem não conhece a Física relacionada.
Referências:
https://en.m.wikipedia.org/wiki/Copenhagen_(2002_film)
https://en.m.wikipedia.org/wiki/Werner_Heisenberg
https://en.m.wikipedia.org/wiki/Niels_Bohr
https://vimeo.com/128088968
E mais...
A peça de teatro "Copenhagen": Bohr, Heisenberg e Margrethe
30/07/25
Apocalipse nos trópicos, Apocalypse in the tropics, 2024, Petra Costa
'Apocalipse nos Trópicos' mostra impacto desolador da religião no poder
Documentário de Petra Costa relaciona ascensão evangélica às turbulências políticas do Brasil
Bruno Paes Manso, fsp, 16/07/2025
Jornalista e pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, é autor de "A República das Milícias - dos Esquadrões da Morte à Era Bolsonaro" (ed. Todavia)
[RESUMO] Autor do livro "A Fé e o Fuzil", sobre a relação entre religião e crime no Brasil, pesquisador comenta o novo documentário de Petra Costa, que repassa os recentes terremotos políticos do país, das manifestações de junho de 2013 aos ataques de 8 de janeiro de 2023, à luz do crescimento evangélico
O pastor Silas Malafaia dirige seu carro enquanto conversa com uma equipe que o filma para o documentário "Apocalipse nos Trópicos", de Petra Costa. De repente, um motoqueiro passa pela esquerda e corta o carro de Malafaia, que mete a mão na buzina sem piedade. "Para deixar de ser abusado. Quem ele pensa que é?", vocifera o pastor. "Vai aprender a pilotar essa porcaria. Eu fui motoqueiro."
Poderia ser apenas um entrevero entre motoristas estressados. Mas o pastor tem uma lição para dar. Com pitadas de teologia, passa a justificar sua raiva se valendo do sagrado. "O pessoal pensa que pastor é pra vim (sic) e pisar no pescoço", reclama. "Jesus girou mesa no templo, irmão. Pessoal não conhece a Bíblia. Jesus pegou o chicote e saiu arrebentando a turma que estava de safadeza no templo. Virou mesa, deu chicotada, não teve moleza, o Jesus de amor, de bondade, de paz...".
Sempre pronto a partir para cima e a defender seus interesses pessoais e políticos, Malafaia se ampara na figura de um Jesus irascível e intolerante.
Depois de xingar o motoqueiro, o pastor compra outras brigas ao longo do documentário: confronta o presidente Lula (que chama de cachaceiro) e Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal; ataca os militantes das causas LGBTQIA+; respalda a truculência dos discursos de Jair Bolsonaro. Cristo é seu porrete e seu escudo. "Grande parte dos pastores ficaram no monte da religião. Os sete montes (são) cultura, entretenimento, economia, educação, política... Eles ficaram no monte da religião. Se alienaram. Eu não", explica Malafaia.
Seis anos depois de lançar "Democracia em Vertigem", que concorreu ao Oscar de melhor documentário de 2020, Petra Costa conseguiu fazer uma sequência à altura em "Apocalipse nos Trópicos".
Ambos investigam um Brasil rachado, flertando com o extremismo de direita, desiludido com a política. "Democracia" se concentra no período que vai das marchas de junho de 2013, passando pelos protestos contra Dilma Rousseff e seu impeachment em 2016, chegando até a prisão do presidente Lula. "Apocalipse" acompanha o governo Bolsonaro, o drama da Covid, a eleição de Lula em 2022 e o quebra-quebra de 8 de janeiro no ano seguinte.
Os dois filmes contrapõem fatos históricos com a narrativa em primeira pessoa e as memórias da diretora. O recurso permitiu a Petra, em seu filme anterior, olhar o período da ditadura militar e da Lava Jato a partir da saga de sua família, proprietária de uma das grandes empreiteiras brasileiras, a Andrade Gutierrez. Nos anos 1970, os pais de Petra, Manuel e Marília, romperam com a família para participar da luta armada. A diretora traz essa bagagem emocional para descrever o ocaso da democracia.
Veja imagens de 'Apocalipse nos Trópicos', de Petra Costa
Em "Apocalipse", Petra é a narradora cética, formada em bons colégios, que sabia o que era "a Revolução Russa e a fórmula do oxigênio", mas não tinha lido a Bíblia e nada sabia sobre "o Apóstolo Paulo, João de Patmos ou dos Quatro Cavaleiros do Apocalipse".
Ela conta no documentário que só iniciou uma leitura mais atenta dos livros sagrados depois de uma visita ao Congresso, quando ganhou uma Bíblia de presente do ex-deputado evangélico Cabo Daciolo. A partir de então, finalmente começou a aprender o idioma de uma parte da população que parecia falar outra língua e que, de forma surpreendente, estava conquistando o poder no país.
O crescimento dos evangélicos foi um dos fenômenos sociais mais importantes do último século no Brasil. Em 1872, os que se diziam católicos representavam nada menos que 99,7% da população. Essa hegemonia permaneceu inabalável durante quase toda a história brasileira. Começou a se flexibilizar de forma relevante principalmente depois dos anos 1980, ao longo do processo de urbanização do país.
A quebra do monopólio do catolicismo abriu espaço para uma disputa acirrada no mercado das crenças. Com o tempo, os brasileiros que foram morar nas cidades abandonaram sua visão de mundo rural, forjada em torno das fazendas, do trabalho na roça, com memórias da casa grande e da senzala, para inventar e interiorizar novas ideias que os permitiam encarar os desafios da vida moderna.
O pentecostalismo, aos poucos, se tornou uma das crenças mais demandadas nesse novo cenário porque oferecia suporte mental e emocional para vencer os desafios urbanos.
As conversões religiosas crescentes, durante muito tempo, conviveram bem com as ideias políticas da Nova República. Na redemocratização, os eleitores deram suporte aos partidos e políticos que fizeram a Constituição de 1988, que domaram a inflação, que criaram o Sistema Único de Saúde, que promoveram o crescimento das matrículas nas escolas e nas universidades e que criaram as políticas de cotas e programas de renda inovadores. Mesmo com todos os problemas do país, esses eleitores seguiram apostando no Estado e na racionalidade para definir seus rumos, enquanto a religião atendia o indivíduo e sua família na esfera privada.
Essa fronteira parece ter se rompido em algum momento da década passada, principalmente depois de 2013, quando a paciência com os governos e os políticos se esgotou.
Veja marcas do 8 de janeiro em Brasília fotos
As ruas mostraram uma urgência desesperada por algo que nem Petra, nem a maioria dos crentes da Nova República eram capazes de compreender.
Havia ressentimento, clamor por reconhecimento e respeito. Esse sentimento ganhou direção e sentido com a ajuda do sagrado, promovendo um novo embate com a esfera pública. Símbolos e mensagens da religião deram vazão a essa revolta difusa e reordenaram o espírito dos que se sentiam perdidos.
As pregações pentecostais, que já alcançavam as massas via concessões de rádios, televisões e se propagavam nas igrejinhas de bairro, ganharam nova dimensão e novos espaços de debates com a popularização das redes sociais.
Ao longo do documentário, Petra busca decifrar essa nova linguagem que direciona comportamentos e invade a política, sendo usada para legitimar autoridades, produzir obediência e promover causas.
Alguns personagens do filme mostram como a fé reavivada dos pentecostais estimula amor-próprio, autoconfiança e favorece a crença na própria capacidade de se salvar pelo mercado e pela disposição de empreender e ganhar dinheiro, sem depender do Estado.
A força política do pentecostalismo, na leitura da diretora, pode ser compreendida pelo livro do Apocalipse, que fala a respeito do fim dos tempos que se aproxima. Conforme interpretações populares da atualidade, Jesus retornará com seus exércitos para combater o mal, numa guerra capaz de promover liberdade e paz. A crise da Covid e as guerras incessantes no mundo oferecem o contexto perfeito para que esse discurso tenha ressonância.
A religião ganha espaço nesse cenário ao criar a linguagem da guerra santa, em que se trava a luta pela tomada do poder em nome de Jesus, exercendo o domínio dos sete montes citados por Malafaia. Os opositores que tentam conter essa ambição sagrada passam a ser identificados como aliados do Diabo.
Malafaia é uma das vozes mais estridentes ao apontar o sentido desta luta e demonizar os adversários. Bolsonaro é seu comandante perfeito, um militar com Messias no sobrenome, que carrega um ressentimento profundo da elite pensante da Nova República e que sobreviveu a um atentado às vésperas da eleição, numa espécie de livramento miraculoso.
É preciso ter fé e dispensar o senso crítico para se comprometer com uma ação como a de 8 de janeiro, que finaliza o documentário, cujas imagens se misturam às de correntes de oração. O final do filme tem esse tom desolador.
Brasil vive uma transição religiosa, mostra Censo 2022 fotos
O Censo de 2025, contudo, publicado depois de o filme estar pronto, trouxe uma boa notícia. Os evangélicos cresceram em ritmo mais lento do que na década anterior. Pode ser uma reação ao abuso das lideranças que encheram de veneno e de ódio a mensagem de Jesus, em um país que ainda vive o desafio político de criar um projeto coletivo comum a todos os brasileiros.
Essas lideranças enfrentam resistências entre os próprios evangélicos, alguns deles presentes no documentário. Há margem para otimismo. Afinal, o brasileiro nunca teve vocação para o fundamentalismo. Muda de lado conforme o contexto e o pêndulo da história.
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'Apocalipse nos Trópicos' acerta ao se aproximar de Silas Malafaia
Petra Costa, indicada ao Oscar por 'Democracia em Vertigem', examina influência de líderes evangélicos na política brasileira
Inácio Araujo, fsp, 08/07/2025
Em "Apocalipse nos Trópicos", Petra Costa realiza um feito que precisa ser reconhecido — ela consegue não apenas chegar até Silas Malafaia, pastor e líder neopentecostal e convicto, além de "direitopata", para usar sua terminologia.
Mais, Petra Costa permite que ele mesmo se revele, com suas palavras, e se assuma como uma espécie de iluminado que traz a nós a palavra do Evangelho, quer dizer, a sua interpretação do Evangelho. Para resumir, Malafaia mais parece um candidato a Khomeini dos trópicos que outra coisa.
Com efeito, a primeira parte do filme é um tanto assustadora: trata-se de notar o quanto Malafaia ensaia tornar o Brasil, oficialmente, um Estado teocrático.
Digo oficialmente porque a primeira coisa que os portugueses fizeram, chegando ao Brasil, foi rezar uma missa. De lá para cá, o Estado tornou-se laico, mas a catolicidade imperou soberana até mais ou menos o final dos anos 1980, quando foi desafiada pelos neopentecostais.
Se a Igreja Universal espalhou o credo com sábio aproveitamento da televisão, Malafaia fez um angu em que fé e política tornam-se em definitivo uma coisa só.
Depois de Malafaia expor seu pensamento, Petra Costa nos leva à vaca fria, ou seja, àquilo que já conhecemos —a ligação dele com Bolsonaro, que ao menos no filme parece reduzido a uma espécie de boneco de ventríloquo. Malafaia é quem fala grosso, a palavra absolutista, ou antes, "a Palavra", aquela que supostamente vem de Deus.
É ele quem bota a faca na garganta do então presidente para escolher fulano e não beltrano para o STF. É ele que, no fim, quando Bolsonaro vai para Miami, espinafra o pupilo e diz que ele não é um líder de verdade.
No filme, é verdade, podemos ver que nem todos os pastores são "direitopatas" etc. Mas ninguém explica exatamente o que é esse credo.
O ponto de vista de Malafaia fica claro durante uma de suas pregações. Ele quer uma geração "que faça a diferença" —fazer a diferença é um postulado neoliberal bem individualista que ele transforma em dinâmica geracional— e transforme a história do país.
Ao longo das muitas cenas do teatro eleitoral, algumas bem manjadas, outras menos, o discurso se desloca lentamente para as belezas da democracia, para os pecados, para Jesus Cristo segundo Pasolini e outras variações, antes de chegar ao que realmente importa: o 8 de janeiro e o que o precedeu, ou seja, a vasta instigação golpista.
Nessa altura, sai de cena Malafaia. Quem passa a dominar é a voz lacrimosa da autora, que explica e defende as maravilhas da democracia e promove umas interpretações do livro do Apocalipse, de São João. No final, o filme parece envolver o combate entre duas vozes —a enérgica, autoritária, de Silas Malafaia, e a suave, indefesa e, sobretudo, choramingas de Petra Costa.
Saímos do cinema mais ou menos como chegamos: convencidos de que desta vez Petra Costa realizou um feito, ao se aproximar de Malafaia a ponto de ele desnudar seu pensamento — e ele tem um pensamento.
Apocalipse nos Trópicos, Quando: Nos cinemas e a partir de 14 de julho na Netflix, Classificação 14 anos, Produção Brasil, 2024, Direção Petra Costa
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'Apocalipse nos Trópicos' é aliado na cruzada contra a captura da fé pela política
O que vemos no documentário não é uma abordagem ingênua nem um olhar preconceituoso sobre os evangélicos
Juliano Medeiros & Blanche Marie Evin, fsp, 26/07/2025
Juliano Medeiros: Historiador, cientista político e professor na Fundação Escola de Sociologia e Política (Fesp-SP); Blanche Marie Evin: Historiadora e cientista política, pós-doutoranda no Núcleo Direito e Democracia do Cebrap
"Apocalipse nos Trópicos" superou um milhão de espectadores na Netflix e entrou para a lista dos dez filmes em língua não inglesa mais vistos em todo o mundo na semana de estreia.
Essa performance confirma a emergência global dos temas abordados no documentário, como a escalada da extrema direita, a pandemia de desinformação e o fenômeno que o filme apresenta com pioneirismo e acurácia: a captura da fé pela política. Ou, mais precisamente, a substituição dos princípios cristãos por interesses políticos na conduta e na pregação de importantes lideranças evangélicas.
Indicada ao Oscar por "Democracia em Vertigem", de 2019, Petra Costa volta suas lentes para um contexto ainda mais preocupante.
Em "Apocalipse nos Trópicos", o que vemos não é uma abordagem ingênua dos tentáculos do pentecostalismo nem um olhar preconceituoso sobre os evangélicos, como apontam algumas críticas apressadas, inclusive nesta Folha. Ao contrário, trata-se de um filme contundente, que se alia à população evangélica numa cruzada oportuna e urgente contra a atuação de lideranças religiosas cada vez mais comprometidas com o poder e menos com a religião —lobos em pele de cordeiro, para pegar emprestada a alegoria bíblica proposta por Mateus (7:15).
Uma frase, destacada por um internauta numa rede social, sintetiza com precisão o que está em jogo: "Tira a sua política da minha fé", escreveu, reagindo ao filme.
Foi com essa preocupação que Petra entrevistou pastores como Silas Malafaia, percorreu cultos em comunidades periféricas e revelou o papel das igrejas como espaços de sociabilidade.
O crescimento do número de evangélicos — de 15,4% da população em 2000 para 26,9% em 2022, segundo o IBGE — vem acompanhado de uma profunda transformação cultural.
Diante do desmonte neoliberal que deteriorou as formas de vida comunitária e estimulou a cultura do individualismo e da competição, o filme mostra que as formas de convívio partilhadas pela população evangélica moldam discursos e escolhas políticas. Numa das cenas mais reveladoras do filme, uma antiga eleitora de Lula, ainda simpática às suas ações e propostas, explica por que prefere votar em Bolsonaro. "Ele é homem de Deus", diz.
Hoje, um em cada quatro brasileiros é evangélico, proporção que tem aumentado ainda mais depressa em contextos de vulnerabilidade social. Essa escalada não pode ser dissociada da ascensão de novas forças políticas.
Com uma dimensão organizacional que combina poder eclesiástico e gestão empresarial, parte das igrejas vêm pautando seu plano de expansão na lógica do lucro, reinvestimento e arrecadação agressiva. Adotando estratégias de marketing, o fenômeno impacta fortemente o comportamento eleitoral à medida que pastores não medem esforços para orientar seu rebanho a eleger bancadas conservadoras.
Silas Malafaia é uma espécie de síntese desse método. Apoiador de Lula em 2002, o pastor se tornou um pilar da coalizão bolsonarista em 2018. À frente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, no Rio de Janeiro, Malafaia comanda um sistema de influência também presente em denominações ainda maiores e com mais acesso à mídia, como a Igreja Universal do Reino de Deus, de Edir Macedo.
Conhecido dos brasileiros há décadas, o evangelismo midiático das rádios e televisões foi potencializado nas redes sociais. É emblemática a cena em que Malafaia estende o celular à câmera e diz: "Aqui a gente destrói os caras". Não se trata de mera inovação tecnológica. O cientista político Leonardo Barbosa, do Cebrap, usa o termo "partido digital bolsonarista" para se referir a esse grupo, uma espécie de legenda informal que arregimenta seguidores, decide eleições e orienta a mobilização social.
Registrada no documentário, a nomeação de André Mendonça, o ministro "terrivelmente evangélico", para o Supremo Tribunal Federal, ilustra a influência de lideranças evangélicas sobre os poderes da República. Todos eles. "Apocalipse nos Trópicos" tem a sensibilidade de distinguir acolhimento espiritual e interesses políticos — e exibi-los como coisas distintas.
Fiéis são mostrados com muita dignidade, em especial as mulheres negras, as mães solo e os trabalhadores que recorrem à fé em busca de conforto emocional e apoio comunitário. A crítica, justa e necessária, se volta para os pastores que circulam em jatinhos e carros de luxo enquanto moldam estratégias para expandir seu poder.
Ao mesmo tempo, Petra convoca as esquerdas a enxergar os valores centrais desse segmento religioso – fé, trabalho, justiça social — a fim de acolher essa população e elaborar uma narrativa atraente para milhões de brasileiros. Sem isso, continuará incapaz de disputar esse campo com os setores conservadores.
CALMA URGENTE! - Especial com Raimundo Barreto - Entre Teologias, Teorias e Domínio vídeo
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